(Publicado originalmente em português por tradutoresdedireita.org)
Bernie Sanders acredita que os Estados Unidos deveriam se espelhar no modelo sueco e no dos países escandinavos para ”descobrir o que eles fizeram pela sua classe trabalhadora”. O senador de Vermont falou tanto sobre a Suécia em sua campanha que o também senador e candidato do Partido Republicano, Marco Rubio, disse que ”Bernie Sanders é um bom candidato para a presidência — da Suécia”.
Como sueco, devo admitir que isso me fez Sentir o Bern [Fell the Bern em inglês, slogan da campanha do candidato democrata] um pouco. Sanders tem razão: os EUA beneficiaria-se imensamente copiando o modelo escandinavo. Mas Bernie deveria prestar atenção no que deseja. Quando ele pede por ”políticas de comércio que funcionam para as famílias trabalhadoras e não só para os executivos de grandes corporações multinacionais”, os Sociais Democratas da Suécia chamariam isso de ”liberalização”— que teria o benefício de expor os monopolistas à competição — não o protecionismo que o Sanders defende.
Na verdade, quando o presidente Barack Obama visitou a Suécia em 2013, três grandes uniões de comércio suecas mandaram-lhe uma carta solicitando uma reunião, sendo o tema as ”maneiras de promover o livre comércio”. O representante da maior união de comércio social democrata repreendeu o presidente americano pela sua insuficiente preocupação em relação ao livre fluxo de mercadorias.
Essa realidade do meu país não vai agradar os socialistas americanos, mas, como diz o ditado, é melhor ser odiado pelas razões certas do que amado pelas erradas. Ser parecido com a Suécia moderna significa livre comércio, desregulamentação, um sistema nacional de vouchers escolares, pensões parcialmente privadas, inexistência de imposto sobre propriedade e herança, e impostos muito menores sobre empresas privadas. Desculpe pelo banho de água fria, Bernie.
Socialismo Moderninho
É claro que o Sanders não está completamente errado. A Suécia e os demais países escandinavos já experimentaram governos imensos e ideias semi-socialistas. Só tem um problema: essa experiência coincidiu quase que perfeitamente com o único período de prolongada crise econômica na região escandinava nos últimos 100 anos.
A imagem que o Bernie tem da Escandinávia é semelhante ao resto de suas opiniões políticas: paradas no tempo, mais precisamente na década de 1970. Até essa década, Suécia e Dinamarca cresceram muito mais que os outros países europeus e tornaram-se mais ricas que a maioria das nações do planeta, isso ocorreu, em grande parte, pela limitação do governo e um intenso livre mercado. (Noruega é um caso especial, pois seu petróleo e gás formam 22% do PIB nacional, apenas alguns porcentos abaixo da Venezuela. Então, ao menos que a proposta de Sanders seja tirar petróleo do nada, o exemplo norueguês não é relevante).
Durante o seu período de livre mercado, de 1850 a 1950, a receita sueca per capita aumentou oito vezes enquanto a população dobrou. A mortalidade infantil caiu de 15% para 2%, e a expectativa de vida teve um impressionante aumento de 28 anos. E tudo isso aconteceu antes do Estado de bem-estar social começar a ser implantado no país.
Já na década de 1950, a carga tributária da Dinamarca e Suécia, apesar de não serem menores que a de outros países europeus, estava abaixo da americana: 20% e 19% respectivamente, contra 24% nos Estados Unidos.
Foi justamente nessa época, quando nós, escandinavos, estávamos satisfeitos, que começamos a pensar que poderíamos dar as costas ao que nos fez ricos e desenvolvidos. Começamos a regulamentar a economia. Aumentamos os impostos e os gastos do setor público. Os estrangeiros, ao observar a implementação dessas políticas intervencionistas, costumam confundir causa e efeito. Esses que pensam que o pseudosocialismo nos fez ricos devem observar o Bill Gates e acreditar que ele se tornou o homem mais rico do mundo fazendo doações.
Enquanto isso, os países escandinavos personificaram a velha piada de como você faz uma pequena fortuna: começando com uma grande. A Suécia adotou medidas sociais-democratas mais profundamente que seus vizinhos escandinavos, e como resultado a economia regrediu mais que as deles. De maneira lenta mas contínua, as políticas adotadas pelos Primeiros Ministros Tage Erlander e Olof Palme corroeram a produtividade e a antiga e renomada ética de trabalho escandinava. Em 1970, a Suécia era 25% mais rica que a média da OCDE. Vinte anos depois, essa média quase nos alcançou. Uma vez a quarta nação mais rica do mundo, a Suécia se tornou a décima quarta.
Foram tempos terríveis para o empreendedorismo e a iniciativa privada, com sérios problemas nos índices de emprego. Durante essa época, nem um mísero emprego foi criado pela iniciativa privada, apesar da população estar crescendo. Em 2000, só uma das 50 maiores empresas suecas foi fundada depois de 1970.
Como o ministro das finanças, o Social-Democrata Bosse Ringholm, admitiu em 2002: ”Se a Suécia tivesse a mesma taxa de crescimento da média da OCDE desde 1970, nossos recursos seriam muito maiores, a ponto de serem equivalentes a 20,000 SEK ($2,400) a mais, mensalmente, por família.”
Durante esse breve período bolivariano, muitos intelectuais suecos acharam que sua pátria poderia se tornar um pesadelo orwelliano. Os Sociais-Democratas criaram um plano, incrivelmente impopular, de estatização dos negócios privados, e o Parlamento decretou que qualquer transação econômica com intenções de reduzir a taxação seria ilegal, mesmo se a transação em si fosse legal. O fundador de uma das maiores empresas suecas, IKEA, Ingvar Kamprad, saiu do país, junto de muitos outros empresários e a maioria dos nossos atletas famosos.
O autor sueco mais famoso, Vilhelm Moberg, escreveu que o governo estava fora de controle, e que estava entrando num meio termo entre a democracia e a ditadura ”em que todos estão infelizes e desapontados.” Nosso mais famoso diretor de filmes, Ingmar Bergman, foi pego pela polícia no Royal Theatre sob acusação de crimes fiscais, sendo solto pouco tempo depois. Ficou profundamente irritado com o ocorrido e também saiu do país.
Nosso autor de livros infantis mais famoso, Astrid Lindgren, teve que pagar mais que 100% em imposto de renda marginal, o que fez ele escrever um ácido ensaio satírico sobre Pomperipossa, uma bruxa gentil e idosa, e coletores de impostos mal-intencionados: ”Ela achava que os direitos de todos seriam respeitados numa nação democrática. Ninguém deveria ser punido e perseguido porque eles decidiram—voluntariamente ou não—ganhar dinheiro de maneira honesta.” Mas, no final da história, ela encontra uma solução para seus problemas: ”Mas, de repente, ocorreu-lhe um pensamento — mulher, você deveria receber benefícios assistencialistas do governo! Que grande ideia! E desde então Pomperipossa viveu contente as custas do assistencialismo. E ela nunca escreveu outro livro.”
O Social Democrata Kjell-Olof Feldt, ministro das finanças de 1983 até 1990, admitiu, num livro publicado em 1992, que alguns dos planos do governo eram ”insustentáveis”, algumas medidas ”absurdas”, e que a política de impostos era ”perversa.” Essas medidas logo entraram em colapso após um boom na dívida e inflação no final da década de 1980.
Seja o que for que essas medidas insustentáveis e perversas fizeram, elas não beneficiaram a classe trabalhadora que o Bernie Sanders tanto diz representar. O salário real na Suécia caiu aproximadamente 5% entre 1975 e 1995. Os salários nominais cresceram, mas a inflação galopante os devorou.
Época do Boom
Mas no começo da década de 1990 a Suécia começou a abandonar seu Bernieconomics. Entrou num processo de desregulamentações, privatizações, redução de impostos, e abriu o setor público para prestadores privados. Nas duas décadas que se seguiram, o salário real sueco aumentou em cerca de 70%.
[*] Johan Norberg. “Bernie’s Right—America Should Be More Like Sweden”. Reason, Maio de 2016.
Tradução: Nicolas Oliveira
Revisão: Cássia H.