• Míriam Leitão
  • 18/03/2016
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O FIM DO CAMINHO


(Publicado originalmente em O Globo)

O governo tinha expectativa de que a nomeação do ex-presidente Lula fosse reduzir a crise e ela atingiu o seu ponto máximo com o conhecimento dado à opinião pública do teor das conversas do agora ministro Lula. No diálogo com a presidente Dilma ela diz o oposto do que havia dito à tarde para os jornalistas e ficou claro que o cargo era um salvo-conduto para Lula.

O termo de posse era tão urgente que precisou deste telefonema de Dilma, mostrando a presidente dentro do esforço de proteger Lula de qualquer ação da Justiça e do Ministério Público do Paraná, o que Lula chama de a “República de Curitiba”.

As manifestações que cercaram o Palácio e atingiram outras capitais mostraram a intensidade do sentimento do país de repúdio às manobras e tentativas de acobertamento que estão sendo reveladas. O governo calculou que tinha feito a manobra perfeita e a divulgação dos áudios mostrou que os reis estão nus.

Durante a tarde, na entrevista, a presidente Dilma chamou o ministro Lula de “presidente” na primeira entrevista depois que ele virou chefe da Casa Civil. Não era um ato falho. Foi talvez o momento em que ela acertou no que disse. O governo estava criando naquele momento algo novo: um sistema em que um ministro é mais forte do que a chefe do governo. Uma presidente enfraquecida, chama um ex-presidente encurralado para que ambos se protejam. O que Lula mostra nas suas conversas era que a proteção era contra as instituições brasileiras. Dilma perguntou aos jornalistas “a troco de que eu vou achar que a investigação do juiz Moro é melhor do que a investigação do Supremo?”. A propósito: quem investiga é o Ministério Público e a Polícia Federal. A Justiça julga. Mas a presidente disse isso e horas antes havia tido aquele diálogo com Lula sobre mandar o termo de posse para ele usar “em caso de necessidade”.

Depois de tudo o que foi divulgado, o ex-presidente não tem mais condições de permanecer no cargo para o qual acaba de ser nomeado. Mas se ele for chefe da Casa Civil dificilmente dará certo o arriscado plano dos dois. Lula pela sua personalidade, história e liderança é maior que Dilma. Até porque eles são criador e criatura. Ele, porém, não é tão forte quanto pensa. Os diálogos mostram uma pessoa inteiramente desnorteada e capaz de definir com impropérios os líderes com os quais ele se propõe a negociar. Ele, de fora do governo, já achava que poderia dar ordens ao novo ministro da Justiça que acaba de ser nomeado, para que ele fosse “homem”. E o Supremo, seu foro privilegiado, é uma corte “acovardada”, segundo ele.

O plano para fugir do juiz Sérgio Moro esbarra agora mais do que nunca na crueza das revelações de ontem. A Procuradoria Geral da República e o Supremo Tribunal Federal não poderão fechar os olhos e os ouvidos para o que está exposto, do contrário ficará claro que lá funciona um forno de pizza.

Dentro do governo, se essa situação durar, o relacionamento não será fácil. Lula é acostumado a mandar e não ser contestado. Dilma é turrona e irritadiça. Os dois têm maus modos no trato com subordinados. A relação de subordinação não está clara. Lula é boquirroto, costuma dizer o que pensa e a tentação será compartilhar com seus interlocutores as críticas que costuma fazer ao modo de Dilma governar. O campo é fértil para as intrigas palacianas. Ele, contudo, não será demissível. O PT interpretou a ida de Lula como uma forma de salvar o governo que está de fato em apuros, e Dilma está entendendo que concedeu um salvo-conduto contra o que ela chamou ontem, na entrevista, de “critérios de investigação estranhos”.

Lula pretende mudar a economia e queria levar Antonio Palocci de volta, derrubando Nelson Barbosa, que ele mesmo havia nomeado. E uma de suas ideias é usar as reservas para abater a dívida que subiu de forma espantosa. O problema é que quem está endividado é o Tesouro e quem administra as reservas é o Banco Central. Pela Constituição o Banco Central não pode financiar o Tesouro. Eles podem dar um jeito nessa proibição. Será uma nova pedalada.

O governo está moribundo e ontem sua situação piorou mais. As respostas que alguns dos seus integrantes ensaiaram não conseguem convencer ninguém. Não há saída boa para a presidente Dilma.
(com Marcelo Loureiro, interino)