• Jayme Eduardo Machado
  • 07/05/2016
  • Compartilhe:

DO RUY AO CUNHA

 

Em tempos de mentiras, me sinto saudoso dos grandes mestres. Daqueles em quem só percebíamos verdades, ainda que eles, na sua sabedoria, por vezes delas duvidassem. E que num passado não tão distante povoaram as nossas cátedras acadêmicas.

Falo daqueles de quem transbordava muito de honestidade intelectual pelo compromisso de suas consciências com a busca da verdade, e aos quais retribuíamos em respeito, com a certeza de ganhar segurança, no mínimo para o exercício do bem pensar. E, mesmo que algo permanecesse não entendido, tal era a intensidade daquela empatia que lá adiante – neurônios mais amadurecidos-, por certo que as dúvidas se dissipariam.

Pois dentre muitas que tive, uma delas recentemente se esclareceu. Lembro de ter ouvido do mestre de Direito Administrativo Ruy Cirne Lima, há 50 anos, mais ou menos isso: “ ... o interesse público, e não a vontade do administrador, domina todas as formas de administração”. Não havendo isso ocorre o “desvio de finalidade” que a lei coíbe. Na época tal distinção me pareceu pura teoria, distante da prática possível. Ele separava, numa mesma pessoa, o “querer do homem comum” e o “querer do agente público”, coisas distintas. E uma luz acendeu quando ouvi um representante do estado a que chegamos bradar: “... o processo de impeachment é nulo por vício de origem, pois foi aberto por Eduardo Cunha, agora afastado por corrupção”. O que diria o velho Ruy? Que não foi o “querer do Cunha”, mas sim o interesse público contido na “vontade do presidente da Câmara dos Deputados” que abriu o processo de impedimento. O “homem” corrupto até pode ter agido com o sentimento pessoal de vingança, mas o “agente público” procedeu conforme o interesse público expresso na lei que o autorizava a abrir o processo. Ao contrário da nomeação de Lula para ministro, em que o “desvio de finalidade” ficou escancarado, pois o sentimento de proteção foi a determinante exclusiva do “interesse pessoal de Dilma”, inexistente o mínimo vestígio de “interesse público da presidente da República”. Na época em que ouvi a lição, senti dificuldade em entender ,mas na prática ficou mais fácil. Enfim, aprendi com o Cunha o que na teoria o professor Ruy tentava me ensinar.