(Publicado originalmente no Diário do Poder)
O aguardado afastamento da presidente Dilma chegou. A votação, realizada na quinta (12) após quase um dia inteiro de sessão no Senado, foi o último suspiro do governo. O clima no Congresso era tão ruim que antes mesmo do início da sessão, governistas já admitiam derrota. Não havia o que fazer a não ser denunciar o “golpe” e tentar desqualificar acusação e acusadores de um governo que, na prática, parou em 2013.
O fim do governo Dilma estava tão claro, há tanto tempo, que a internet já clamava em março por gasolina e dólar a R$2, se houvesse um governo Temer. E outras “simples” reivindicações imediatas como o pleno emprego, saúde universal preventiva e de qualidade, liberdade de imprensa e expressão, distribuição de renda, igualdade social, de raça e gênero.
Mas isso é nas redes sociais, nos memes do Whatsapp.
Para aqueles que vivem o dia a dia da política, sem discutir o mérito das acusações contra Dilma, o clima se tornou mais ameno, mais realista. E ao menos um consenso se encontrou nos mais diversos discursos dos satélites do poder em Brasília: a necessidade pelo fim do marasmo.
De um lado, há semanas não há clima de comemoração, mas sim de alívio. Como a recuperação após uma complicada e cansativa cirurgia: tudo correu bem, mas ainda há muito o que fazer; meses, anos de tratamento e terapia.
Do outro lado há uma decepção sóbria, quase ensaiada. Como se a derrota estivesse sendo digerida há algum tempo. Há também uma torcida para o fracasso do “outro lado”, já que tudo que sobrou é pessimismo. Mas sem desespero. A luta continua, como sempre continuou. Líderes petistas como o senador Lindbergh Farias prometem oposição intransigente – e, no caso, esbaforida – a Michel Temer.
O clima de euforia e as megamanifestações evaporaram. Em Brasília, às 23h da 'quarta-feira do afastamento' mal havia presença popular na Esplanada. A indignação deu lugar a uma sensação de necessidade, mais madura e objetiva. Aqueles que picham muros por Dilma já não o faziam pela presidente, mas sim por “eleições diretas” e aqueles favoráveis ao impeachment já nem pichavam “Fora Dilma”, só contavam os dias até a votação do processo. No máximo intensificaram a forte patrulha na internet.
A história falou mais alto. Moribundo, o governo já não tinha forças para garantir ou realizar. Promessas e dívidas da presidente não foram cumpridas nem mesmo com os aliados mais próximos. Dilma conseguiu perder apoio desde o primeiro dia de governo, em 2011. Lá pras tantas perdeu Eduardo Cunha, um dos principais articuladores do governo no Congresso. Tudo mudou; traições, delações, articulações.
O frágil apoio de Dilma no Congresso foi colocado à prova contra a sagacidade política de velhas raposas do centro. O governo foi forçado à esquerda, numa manobra desesperada para apelar à sua base ideológica de apoio. Mas com a Lava Jato como ingrediente essencial no cenário político inédito, ficou claro que corruptos não têm cor nem gênero, muito menos fidelidade ideológica. A tática governista não colou: 11 milhões de desempregados, inflação e os efeitos práticos de uma política econômica inexistente falaram mais alto.
Nos últimos meses só sobrou ao governo o discurso. Foi colocada em prática uma intensa estratégia de comunicação para tentar convencer as pessoas de que o impeachment é “golpe”, apesar de dizerem o contrário uma maioria esmagadora nas ruas, na Câmara, no Ministério Público, na Polícia Federal e repetidamente no Supremo Tribunal Federal. Mesmo que a gritaria tenha virado notícia aqui e lá fora, não colou.
Dilma caiu. Seu governo virou só um conto preventivo sobre o derretimento de capital político. Agora o vice Michel Temer vai dar início a um projeto que, por sincera falta de opção, tem a responsabilidade de fazer tudo e mais um pouco.
Enfim começa um governo.
* Tiago de Vasconcelos é Diretor de Redação do Diário do Poder e professor de Relações Institucionais do Ibmec Brasília.