• Percival Puggina
  • 15/05/2017
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SUPREMA VAIDADE

 

 Há pessoas que invertem a expressão popular. Nem sete palmos de terra lhes cobrirá a vaidade e ingressarão no além com a mesma fatuidade do aquém. Há poucos dias, votando a favor da libertação de José Dirceu, Gilmar Mendes se referiu aos procuradores federais da Lava Jato como jovens que não teriam "vivência institucional". E complementou, dirigindo-se a um colega: "Se nós cedêssemos a esse tipo de pressão, nós deixaríamos, ministro Lewandowsky, de ser supremos".

Chega a assustar! Pode um ministro de presumível sabedoria, encarapitado no cume do poder onde atua, justamente quando fala sobre o valor da vivência institucional, adjetivar-se e a seus pares dessa maneira? Não. E não concebo que Gilmar Mendes faça isso em estado de exaltação. Vejo a frase como ato tão falho quanto simbólico do patrimonialismo incrustado em nossa cultura política, a contaminar as instituições e suas práticas. Num dos desvios por onde esse mal nos conduz, o ato de posse vira uma espécie de escritura de propriedade lavrada em favor do titular. No entanto, tomar posse não equivale a ser dono do cargo; antes, significa ser formalmente possuído pelos encargos que lhe são inerentes.

Foi tudo muito paradigmático, nas concessões daqueles polêmicos habeas corpus pela 2ª Turma do STF. É impossível não perceber, nos votos vencedores, os olhos fixos nos calhamaços de papel, tendo a nação, de quem se diz ser "soberana", como estática paisagem, em cujo agravo os habeas corpus foram sendo concedidos. Jayme Eduardo Machado, com a autoridade de quem já foi Subprocurador-geral da República, em ZH do dia 5 deste mês, qualificou essa desatenção à sociedade como "autofágico desvio", capaz de minar de descrédito o poder.

Posteriormente, ao indignar-se com a atividade do colega Fachin, que deslocou para o Pleno a decisão sobre o habeas corpus de Antônio Palocci, Gilmar Mendes revelou a intenção de impor sua vontade com base na maioria de 3 x 2 que se formou na 2ª Turma do STF. Serão razões e fundamentos tão retos e jurídicos quanto os que fizeram seu colega Lewandowsky, brandindo a Constituição, fatiar a pena imposta pelo Senado à ex-presidente Dilma? É uma surpreendente indignação essa dos ministros que resolveram soltar meliantes prudentemente encarcerados pela Lava Jato. Talvez tenham pensado: "Quem esse juiz e esses garotos do MPF pensam ser para andarem por aí criminalizando criminosos tão incomuns?

Por fim, vale lembrar que o STF não é o poder supremo da República. Ele ocupa a cobertura no edifício do Direito, justaposto ao qual, mas não subordinado a ele, está o edifício da Política. Cuide o STF de ser um bom Supremo em seu condomínio e não se meta a Poder Moderador, supremo sobre os demais, como reiteradamente vem tratando de ser. Tal figura não existe em nossa Constituição. Investir-se nela é usurpação. Contudo, não era a vaidade o pecado favorito do personagem John Milton em O Advogado do Diabo?

Do jeito que as coisas vão, a vaidade acabará senhora suprema do Supremo. Sob seus influxos se dilatam as demasias, se ampliam os votos, perde-se tempo, a justiça se arrasta, se rebusca a linguagem e as frases, não raro, parecem uma bandeja de petit fours glacés. A vaidade se nutre da lisonja. A admiração se alimenta do serviço à nação. No campo da justiça, a nação se submete ao STF. Mas admiração, reverência, presta a Sérgio Moro e à Lava Jato. (A íntegra do artigo pode ser lida em http://zh.clicrbs.com.br/rs/opiniao/noticia/2017/05/suprema-vaidade-9791801.html)
 


Genaro Faria -   15/05/2017 20:56:07

Houve um tempo em que os filhos diziam com orgulho que o pai era deputado federal ou senador, ministro, governador ou prefeito de um município do interior. E esse orgulho em nada diminuiu no tempo em que os generais se revezavam como supremos mandatários do país pelo voto indireto do Congresso Nacional. Não faz, pois, muito tempo, não, em que também nos orgulhávamos de ser brasileiros. Bons tempos! A "democracia" bolivariana acabou apagou esse orgulho do peito dos cidadãos como um regime mais primitivo, grotesco até, que as oligarquias dos coronéis da Velha República. Que retrocesso!

Renato -   15/05/2017 14:20:28

A Vaidade e a Inveja são irmãs gêmeas; as outras irmãs são a Arrogância e a Soberba.

Jonah Hex -   15/05/2017 13:36:53

Brilhante!