• Cardeal Emmanuel Wamala, em entrevista a 30 Dias.
  • 28/02/2009
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POR INTERM?IO DAS SEITAS QUEREM DESTRUIR A TRADI?O

Entrevista com o arcebispo em?to de Campala: “Pessoalmente, acredito num ataque sistem?co de for? estrangeiras contra a Igreja. Querem destruir a Igreja tradicional, ou melhor, eu diria, as Igrejas tradicionais. As Igrejas protestantes hist?as e a Igreja Anglicana t?o mesmo problema. As novas seitas agridem tamb?a elas. H?ns trinta anos. Antes, elas n?existiam; ouv?os falar delas no Qu?a, mas n?aqui” “Ex Africa lux”, dizia o papa Wojtyla, num de seus motes brilhantes e apaixonantes. O cardeal Emmanuel Wamala, primaz em?to de Uganda, ?omo um velho le?que j?iu de tudo. Conhece os problemas que sempre atormentam seu pa?e o continente como um todo. Sua sabedoria e seu realismo o tornam imune ?et?a dos profissionais do entusiasmo, mas tamb?ao v?s da resigna? e da autocomisera?. 30Dias o encontrou em Campala, na colina de Nsabya, na resid?ia que hospedou o papa Paulo VI em sua viagem hist?a a Uganda, em 1969. Quarenta anos depois, outro sucessor de Pedro est?ara fazer sua primeira visita pastoral ?terras africanas. Enquanto isso, no Vaticano, vem sendo preparada uma assembleia extraordin?a do S?do dos Bispos inteiramente dedicada ?expectativas, urg?ias e esperan? das Igrejas e das sociedades africanas. Emin?ia, como o senhor avalia o atual momento vivido por seu pa? EMMANUEL WAMALA: A situa? aqui, em Uganda, ainda n??st?l. No norte do pa? n?chegamos ainda a um acordo definitivo entre o governo e os rebeldes do Lord’s Resistance Army, o Ex?ito da Resist?ia do Senhor. Existe uma tr?a, mas as negocia?s n?andam, e os ultimatos do governo aos rebeldes, para que depusessem as armas e assinassem um acordo de paz, ecoaram no vazio. Enquanto isso, os desabrigados do norte continuam a viver em campos para refugiados, sendo assistidos por organismos internacionais. Eles gostariam de voltar para suas terras devastadas pela guerra, para viver em paz, reconstruir suas casas, voltar a cultivar os campos. Mas, por ora, assistimos apenas a uma lenta marcha de aproxima? dos desabrigados dos lugares de onde fugiram, e onde tudo continua em estado de abandono. Rezamos e esperamos que as coisas possam mudar. Al?de tudo, no resto do pa? nossos problemas cr?os, como a pobreza e as doen?, ainda persistem. Mesmo assim, o povo est?timista. O governo procura fazer o poss?l, na situa? concreta que temos. Foi no Congo que aconteceu o ?mo massacre do Lord’s Resistance Army, com quarenta pessoas trucidadas numa igreja cat?a. Uganda tem fronteira com esse pa? onde estourou a ?ma terr?l crise africana. Por que essa regi?nunca obt?a paz? WAMALA: S?diversas as causas. No nosso modo de entender, h?nger?ia de poderes externos. Interesses. Como podem esses guerrilheiros terem sempre tanto armamento? De quem eles o recebem? Os africanos n?o t? Essas armas chegam de fora. O Congo tem imensas riquezas naturais; basta pensarmos nos minerais. Podemos dizer o mesmo do Sud? S?riquezas imensas, presentes em pa?s pobres, que continuam sempre pobres. Existe um interesse externo que faz tudo isso perdurar. O senhor quer dizer que ??o manter todas as chagas da frica abertas... WAMALA: No fundo, a abordagem ?frica continua a ser colonialista: essa ? l?a que sempre volta, quando a quest?somos n?Enquanto continuarmos a ser pobres, essa abordagem se perpetuar?As classes dirigentes ocidentais, no m?mo, procuram amparar os dirigentes locais, para que eles possam cuidar dos interesses delas mesmas. Museveni mudou a Constitui? para poder ser reeleito. Quando isso aconteceu, o senhor fez severas cr?cas a essa quest? WAMALA: Ele segue as ideias de muitos outros. O primeiro ?idel Castro, por quem Museveni tem grande admira?. O segundo ?adafi, que nos visitou muitas vezes. Foi Kadafi que deu a Museveni este conselho: aqueles que tomaram o poder pelas armas n?devem deix?o democraticamente. Em suas rela?s com a Igreja, existe uma certa indiferen? mas n?uma hostilidade. Digamos assim: ?m “ditador brando”. No entanto, foi o senhor quem alertou muitas vezes para a ret?a da frica como continente abandonado, e convidou a deixar para tr?os mecanismos de autocomisera?. WAMALA: A frica deve tomar os problemas africanos em suas m?, assumir a responsabilidade por eles. Espero que as pr?as reuni?do Secam [Simp? das Confer?ias Episcopais da frica e do Madag?ar, ndr] e do S?do dos Bispos dedicado ?frica sirvam para estudar nossos problemas e encontrar um caminho. N?podemos acreditar sempre que ser?os outros que v?resolver nossos problemas: ingleses, alem?, italianos, chineses, americanos... Agindo assim, n?nstigamos um novo colonialismo. Na rela? com as ONGs e com as organiza?s de assist?ia internacional tamb?existe o perigo de formas de neocolonialismo? WAMALA: Algumas dessas organiza?s nos tratam sempre como menores de idade. N?nos apoiam para que cedo ou tarde possamos come? a fazer as coisas por n?esmos. Talvez at?orque esse mecanismo garante a elas a oportunidade de terem trabalho aqui, conosco. Elas d?o dinheiro, mas depois o levam de volta. Temos e continuaremos a ter situa?s cr?cas por aqui; precisamos de ajuda, por isso ?til e louv?l o trabalho das organiza?s n?governamentais, mas, depois, com o tempo, ?reciso que essas organiza?s enveredem pelo caminho de naturalizar suas estruturas, de modo que os agentes locais continuem o trabalho sem depender da Europa ou dos pa?s sede dessas organiza?s. Algumas das organiza?s cat?as engajadas na luta contra a Aids, tamb?em Uganda, correm hoje o risco de passar por dificuldades, pois os organismos internacionais s?nanciam projetos que canalizem toda a sua estrat?a de preven? para o uso e a distribui? maci?de preservativos. O que o senhor pensa sobre isso? WAMALA: A primeira vez em que ouvi falar dos preservativos foi na d?da de 1950, quando ainda estudava em Roma. Na ?ca, a Aids n?existia. Portanto, os preservativos n?foram inventados para combater a Aids. Hoje, querem vend?os e difundi-los tomando a Aids como uma justificativa... No entanto, at?esmo cardeais bem conceituados disseram que n?devemos ser r?dos demais quanto a isso. Se o uso dos preservativos pode contribuir para salvar vidas humanas, vale a? princ?o do mal menor... WAMALA: A discuss?sobre esse ponto ainda n?est?ncerrada, mesmo na Igreja. As personalidades a quem o senhor se refere s?de peso. Creio que um dia chegaremos a uma conclus? mais ou menos aceit?l. Mas, no momento, n?aqui, temos dito: como Igreja, n?podemos encorajar o uso de preservativos, ficando com aqueles que dizem que a Aids s?de ser combatida dessa forma, pois apostar tudo na distribui? maci?de preservativos tem como efeito pr?co encorajar e aumentar a promiscuidade sexual. Distribuir preservativos aos montes, nas escolas, por exemplo, n?resolve o problema, e pode aument?o. Isso me parece um fato, n??ma quest?de posi?s tomadas a priori, de quest?de princ?os morais. S?e temos visto que essa estrat?a de resposta ?nadequada ao problema. Temos constatado que em muitos pa?s, nos quais s? apostou na distribui? maci?de preservativos, a Aids aumentou. Al?disso, os m?cos nos dizem que usar preservativos n??ma medida cem por cento segura para prevenir o cont?o. Continua sempre a haver um certo percentual de risco. O senhor continua a ter uma intensa atividade pastoral. Como v? condi? da Igreja ugandense? WAMALA: A Igreja Cat?a, aqui, ?uito viva; ela cresce numericamente e tamb?no sensus fidei compartilhado. Os leigos s?cheios de energia e de entusiasmo, as voca?s aumentam a cada ano. Estamos contentes da forma como estamos. Por outro lado, temos as seitas, que importunam muito o povo. Muitas pessoas entram nelas, especialmente os jovens, que n?s?muito fortes na f?que n?t?ra?s profundas. Qual ? for?das seitas? Muita gente diz que grande parte dela ?m poder econ?o... WAMALA: Quanto a isso, n?podemos ter d?as. ?poss?l que uma nova Igreja nas?por iniciativa isolada de algum indiv?o, mas, aqui, as novas Igrejas despontam em cada esquina, sobretudo nas cidades grandes. Eles n?poderiam fazer isso sem uma ajuda de fora. Enfim, h?lgu?que investe muito nisso. WAMALA: Pessoalmente, acredito num ataque sistem?co de for? estrangeiras contra a Igreja. Querem destruir a Igreja tradicional, ou melhor, eu diria, as Igrejas tradicionais. As Igrejas protestantes hist?as e a Igreja Anglicana t?o mesmo problema. As novas seitas agridem tamb?a elas. Quando foi que come? esse fen?o? WAMALA: Eu diria que h?ns trinta anos. Antes, elas n?existiam; ouv?os falar delas no Qu?a, mas n?aqui. Amin havia abolido qualquer outra Igreja ou confiss?religiosa diferente do catolicismo, do anglicanismo e do islamismo. Museveni proclamou a liberdade de religi? Isso ?ma coisa boa, que n?pode ser discutida. Desde ent?as novas seitas apareceram tamb? E hoje elas come? a ter uma grande influ?ia sobre os dirigentes das na?s no mundo inteiro, e vice-versa. Aqui, na frica, o fen?o preocupa, tamb? porque ?omo se a f?inda fosse jovem. Temos um grande n?o de jovens que n?conhecem bem o catecismo. Quando v?amos para c?vimos uma igreja com a inscri? “New Apostolic Church”, nova Igreja apost?a... WAMALA: Eles usam t?los que parecem com os da Igreja Cat?a. T?los mais ou menos b?icos. Mas quais s?os motivos de seu sucesso? WAMALA: Uma pesquisa sobre isso seria muito ?. Como j?issemos, um fator sem d?a deve ser o econ?o. Elas prestam ajuda, d?bolsas de estudos, oportunidades de viajar. Al?disso, apresentam uma doutrina com pouqu?imas obriga?s morais e lit?cas. Mas ??so? N?podemos aprender nada nos comparando com elas? WAMALA: Elas n?t?estruturas burocr?cas engessadas, como as que existem na Igreja Anglicana, por exemplo. E as pessoas n?s?atra?s por uma Igreja burocr?ca. O Evangelho deve ser anunciado de modo simples e direto, para testemunhar o amor de Jesus por cada pessoa. Em 2009, como o senhor lembrou antes, muitos representantes das Igrejas cat?as africanas locais v?se encontrar em Roma para o S?do Extraordin?o dos Bispos sobre a frica. Depois, haver?amb?uma importante reuni?do Secam. N?existe o risco de multiplicar encontros que desperdi? o tempo? WAMALA: Por que o senhor diz isso? Em primeiro lugar, precisamos nos perguntar para que serve um S?do. Eu creio que o S?do seja antes de mais nada uma assembleia de comunh? O simples fato de nos encontrarmos tamb??ma coisa boa e ?, para fortalecer a comunh?entre os bispos. Al?isso, algum ponto importante sempre ?studado. Na sua opini? em que os bispos deveriam concentrar sua aten?? WAMALA: Na justi?e na paz, dada a situa? da frica nos dias de hoje. Essas s?as condi?s preliminares. Quando n?existem paz e justi? h?m obst?lo para o an?o. H?uem diga que a Igreja Cat?a hoje parece euroc?rica demais. WAMALA: At?or isso, ?til que as Igrejas dos diversos continentes tenham seus s?dos, para discutir seus problemas. O pr?o S?do “africano” ser?ealizado em Roma. Por que n?na frica? WAMALA: Na verdade, n?bispos, gostar?os de ter realizado na frica o primeiro S?do africano, realizado em 1995. Mas, depois, vimos que todos os outros s?dos continentais foram realizados em Roma, onde est?as estruturas mais adequadas. Realizar o S?do na frica seria, no fundo, mais um sinal de marginaliza? do continente. Seria como se nos dissessem: discutam entre voc?as suas quest? isso n?nos interessa. Assim, pelo menos durante algum tempo, os problemas da frica ser?levados a Roma, e n?ser?liquidados como problemas locais, mas reconhecidos como problemas que interessam ao cora? da Igreja. Hoje, na Igreja, a aten? muitas vezes parece concentrada em temas como a moral sexual, a ?ca familiar, a bio?ca. Como essas tend?ias s?vistas da frica? WAMALA: Existem pa?s que legalizaram os casamentos homossexuais. Esse n??m problema africano. Mas n?otamos cada vez mais uma influ?ia externa que vem enfraquecendo, na frica tamb? os la? familiares. Gra? aos meios de comunica?, as coisas que acontecem na Europa acontecem na mesma hora aqui entre n?Esse poderia, quem sabe, ser um tema a ser tratado no S?do. Nesta casa em que estamos conversando, Paulo VI esteve hospedado durante sua visita a Uganda. WAMALA: Uganda ?ndependente desde 1962. Paulo VI nos visitou em 1969. Eu me lembro bem: naquela ?ca, eu era capel?na Universidade. O que deveria ser retomado daquele tempo? WAMALA: Devemos seguir os documentos do Conc?o. N?apenas estud?os teoricamente, mas retom?os e aplic?os. Em muitos aspectos, eles ainda n?foram postos em pr?ca. Dentro de poucas semanas, o Papa vir? frica. O que o senhor espera e o que se espera? WAMALA: N?sei se o Papa vai falar ?frica inteira. E tamb?n?estou certo de estar em condi?s de dar conselhos ao Santo Padre. Ele deve encorajar seus bispos e todos os irm?. Como Jesus pediu que Pedro fizesse. Ele pode comentar as quest?mundiais, ou fazer outras coisas. Mas sua tarefa ?onfirmar os irm? na f?Deve fazer apenas isso, e vem para isso.