• Percival Puggina
  • 16/11/2020
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O FUTURO DA DIREITA

 

 É errado subestimar o estrago produzido no inconsciente coletivo dos brasileiros pelos longos anos em que lhes foram servidas doses diárias de veneração ao Estado como provedor de bem estar material mesmo que ele apenas disponibilize gotas diárias de esperança e placebo. Uma e outra não perdem validade ainda que nossas grandes cidades engrossem seus cinturões de miséria escalando morros e afundando em baixios insalubres.

 Ao longo das últimas décadas, a direita foi cooptada pelas duas esquerdas que repartiam entre si, e com ela mesma, o butim chamado Brasil. O trabalho em busca da hegemonia, no entanto, era consignado de modo quase exclusivo à esquerda. Eventos como os Fóruns da Liberdade promovidos pelo IEE circunscreviam-se a Porto Alegre e não se multiplicaram, como deveriam, em centenas de outros, Brasil afora. A formação de opinião é inconstante e dependente de iniciativas desconexas. Eventos conservadores são de inspiração e motivação recente, surgindo como tiros de pistola sinalizadora de afundamento da embarcação. Nacionalmente, partidos identificados com a direita pagavam caro pelos estigmas que incidiam sobre ela, mas se saciavam no centrão.

A vitória de Bolsonaro colocou na cabeça de muita gente que o terreno estava arado e semeado para que conservadores e liberais completassem, nas bases municipais, a transição do poder para outras mãos. Mas não é assim que a política funciona. Mesmo num arremedo de democracia como o nosso, o sucesso eleitoral, o voto na urna, multiplicado e transformado em fonte de poder político, demanda um conjunto indispensável de condições. Entre elas incluem-se lideranças reconhecidas, trabalho consolidado, arregimentação, captação de recursos, marketing político, mensagens sedutoras insistentemente repetidas, formação de dirigentes e de militância, candidatos preparados, conhecimento dos adversários e dos parceiros com suas forças e debilidades. E por aí vai.

Porque as coisas são assim, a decadência do PT não retirou substância da mensagem que logo foi apropriada pelo PSOL, principal beneficiário do petismo desiludido. Esteve visível, durante os últimos anos esse processo crescente de transferência. O Rio Grande do Sul e sua capital, onde vivo e escrevo, é um palco onde esse show tem sido objeto de sucessivas reapresentações.

Eleger alguém pelo voto majoritário pode ter uma infinidade de causas, inclusive muitas meramente circunstanciais. No entanto, a formação de uma consistente representação parlamentar, verdadeira expressão de poder político, jamais será fruto da árvore do acaso. Quando o terreno do plantio está tomado pelo inço da mistificação e da demagogia, pelos chavões e narrativas semeados pelos adversários, o trabalho precisa ser ainda mais intenso.

 

* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.



 


DONIZETE DUARTE DA SILVA -   19/11/2020 10:58:43

Eu costumo dizer que ser de esquerda é pregar que os seres humanos são incompetentes e precisam ser tutelados por um estado magnânimo. Já a direita prega que as pessoas (aqueles que emergiram dos seres humanos através da educação) são autosuficientes e precisam ser recompensadas por sua competência. Como vivemos num mundo pós século XIX, assistimos o emergir do cidadão com todos os problemas inerentes, daí a luta da esquerda para voltar ao mundo pré civilizatório e a da direita pelo progresso da civilização. Como a esquerda prega a miserabilidade feliz, ela vende esperança, não resultados, afinal resultados contribuem para com a civilização que se deseja combatida. A direita, que promove a competência recompensadora, oferece resultados. No Brasil através de um projeto muito bem elaborado formamos nos bancos escolares há cerca de 50 anos cidadãos dependentes, de sorte que a direita, que se formaria no mesmo banco escolar não existe. Nossos empresários, via de regra, adoram dinheiro público, e são acessos ao risco de suas atividades. Como então esperar que políticos sem nenhuma conexão com o pensamento crítico possam representar o pensamento de direita?

Washington Pedro dos Santos -   18/11/2020 19:59:53

O seu texto foi, totalmente, esclarecedor.

AbrahãoFinkelstein -   17/11/2020 12:37:45

Cada dia melhor, mestre. Artigo de ler e reler infinitas vezes, até entrar na caichola travada por décadas de desperdício de tempo.

Menelau Santos -   17/11/2020 11:46:49

Professor, como já dizia o ditado antigo "o buraco é mais embaixo". A lucidez do seu texto nos revela que a podridão das ações de um determinado partido não respinga nos seus candidatos. Um exemplo claro foi o mensalão. Depois daquele escândalo era de se esperar que jamais a população rejeitasse todos os candidatos do PT em todas as esferas, mas em seguida o Haddad virou prefeito de São Paulo.

Osvaldo Peuckert neto -   16/11/2020 19:01:40

Obrigado por seu trabalho.

Sonia Maria Yodes Mendonça -   16/11/2020 17:08:15

Perfeito. É utópico imaginar que a direita se organizará em um ou quatro anos , quando tem que desmontar as narrativas esquerdistas paternalistas enfiada goela abaixo dos brasileiros.por mais de 30 anos. Temos uma luta dura pela frente . Presidente Bolsonaro nos abriu a porta da verdade .É nossa tarefa entrar por ela é sedimentar os.caminhoa para firma-la.