• Percival Puggina
  • 24/11/2023
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Mudança de clima na Praça dos Três Poderes

 

Percival Puggina

         A súbita mudança de conduta do senador Rodrigo Pacheco dava razões para ser vista como jogada ensaiada tipo “Faz de conta aí que eu faço de conta aqui”. Nessa perspectiva tudo fica mais compreensível, embora censuráveis as posições morais. O senador perdeu a esperança de uma cadeira no STF; Davi Alcolumbre quer tomar-lhe a cadeira de presidente do Senado em 2025; o governo de Minas Gerais é uma possibilidade remota se ele continuar surdo aos anseios da cidadania e inerte ante os excessos de um Supremo que perdeu a noção de limites. As opiniões sobre ele nas redes sociais certamente não o envaidecem.

Já para o Supremo, o que importa é que tudo fique como está e nenhum membro da confraria seja incomodado na estabilidade de seu poder e de seu cotidiano. Então, fica mais claro: 1) o Congresso aprova a PEC que restringe as decisões monocráticas, exigindo voto majoritário para sustar decisões e atos dos outros poderes; 2) o STF, em decisão que será amplamente majoritária (se não unânime), declara inconstitucional a emenda à Constituição aprovada pelo Congresso e pronto. Volta a reinar a paz nos cemitérios da soberania popular, embora seja muito estranho tomar do Congresso seu poder constituinte derivado da própria Constituição.

Se essa previsão estiver certa, o errado no processo é o ministro Gilmar Mendes, que, a pedido de Roberto Barroso, fez um discurso na abertura da sessão do Pleno para o qual o decano calçou chuteira e saiu dando canelada: “PEC proposta por pigmeus morais”, “O STF não é composto por covardes”. “O STF não aceita intimidações”, “O STF está pronto para enfrentar investidas desmedidas e inconstitucionais”. Até a pandemia, a cloroquina e a República de Curitiba entraram no seu arsenal retórico...

Pessoalmente, não me parece que o quadro seja de jogada ensaiada. Penso que estamos diante de uma crise real e inédita na história da República, tão habituada a impasses institucionais entre governo e parlamento. Desta feita, a crise se desenha entre o parlamento e o STF. É queda de braço. Rodrigo Pacheco já anunciou que vai indicar relator para outra PEC, a que limita em 15 anos o tempo do mandato dos ministros e fixa idade mínima de 50 anos para posse no cargo. Muito razoável, aliás.

Os constituintes criaram um sistema de freios e contrapesos em que os primeiros sempre estão emperrados e os segundos desbalanceados. A tais dificuldades acrescentou-se, no curso deste século, a composição politicamente alinhada e indisfarçável animosidade do STF em relação à opção política de dezenas de milhões de brasileiros. Às evidências e aos atos falhos precedentes, somam-se, agora, as afirmações ouvidas por jornalistas sobre os últimos incidentes e que não foram desmentidas. A frase “Acabou a lua de mel com o governo”, a palavra “traição” e a cabeça do senador Jaques Wagner estão na história destes dias. 

Por maior que seja minha decepção com o atual Congresso, ela ainda é menor do que minha rejeição aos excessos, injustiças, discursos de ódio e exuberante protagonismo político assumido pelo STF nos últimos seis anos.

A estrutura institucional brasileira é uma geringonça que só nos leva a impasses e instabilidades políticas. Há quem faça delas muito bom proveito e, por isso, não se pensa em mudar. Mas saibam: são um urubu no nosso telhado.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 


Viviane -   26/11/2023 18:09:02

Realmente pareceu jogada ensaiada mas, aqui na torcida para que não seja. CHEGA de abusos e arbitrariedades, para dizer o mínimo, que o STF vem cometendo. Ditadura da toga é o que estamos vivendo na "democracia relativa" do atual desgoverno

Manoel Luiz Candemil -   26/11/2023 11:36:23

Bagunça clara nos três poderes! E aí? O que a história nos conta sobre situações semelhantes no passado?

Arleti. Motta -   26/11/2023 08:42:39

Esse é o começo do fim do abuso. Nem no país mais pobre da África ainda existe cargo vitalício. Evidente q esses privilégios absurdos escondem pecados. Tais Ministros precisam ser afastados.

Danubio Edon Franco -   25/11/2023 19:42:43

Espero que estejas certo. Porém, no ar paira a notícia de que o presidente Lula procurou os ministros do STF para aplainar as arestas porque seu líder no Senado Federal votou favorável à PEC. O que se diz, sem qualquer constrangimento, entre os governistas, é que na Câmara dos Deputados, ela será engavetada. Acredito que este será o teste do nível moral dos seus integrantes. Espero, com o coração nas mãos, que honrem, pelo menos desta vez, o mandato que receberam. Milagres acontecem!

MARCO ANTONIO GEIB -   25/11/2023 18:47:18

Mestre suas colocações são claras e objetivas. De uma jogada inicial ensaiada, tornou-se uma queda de braço entre Senado (leia-se Pacheco) e os Ministros do STF por razões não conhecidas pelos mortais. Por isto partiu da caterva da Alta Corte um amontoado de ofensas e agressões típicas de quem tem seus "calos pisados". Terá uma solução para o embate...se o Congresso Nacional DERRUBAR o VETO do Lula a manutenção da "desobrigação das folhas de pagamento" !!! Infelizmente não se tem visão dos "bastidores" dos acontecimentos, esta viagem, no mesmo avião do Senador Pacheco e Ministros do STF pode, de repente, voltar a ser "Tudo como dantes no quartel de Abrantes" !!! É parecido como ter uma "crise de ciúmes em um lupanar qualquer". Bem pelo menos começou uma tênue reação a volta do normal !!! Embora estejam se esgotando os prazos temos que ter "calma e paciência, paciência e calma". Bom domingo.

Leonco de Carvalho Bones -   25/11/2023 13:58:04

Pena, que sendo jogada ensaiada ou queda de braço sempre será em benefício próprio! Até acertando as decisões são pessoais, nunca voltada para nenhum benefício do povo! Se coincidir, tudo bem!!

André -   25/11/2023 12:59:46

concordo plenamente.

Cristina Hilgert -   25/11/2023 11:11:34

Essas criaturas estão apenas reagindo às cobranças, com um teatrinho infantil, ridículo, tipo jogral, para calar a direita, já que não podem fazê-la desaparecer. Só pensam em se manter no poder, rindo às nossas custas. Deixe estar, amanhã vou vestir minha bandeira e andar pela cidade, porque desistir, não é opção.

DAGOBERTO -   25/11/2023 11:10:51

Se foi pensada como jogada ensaiada, fugiu do controle e se transformou, sim, em queda de braço. Temo que o braço do STF seja mais firme, por compacto e mais homogêneo do que o de um Congresso com muitos rabos presos, dependendo de julgamentos do virtual opositor.

Frederico Hagel -   25/11/2023 10:48:15

Puggina, acabei de ler tua análise sobre o imbróglio STF e Congresso. Parabéns pela clareza e visão do que pode ou não estar acontecendo.

Waldir -   25/11/2023 10:11:57

Artigo mais que perfeito.

Gerson Carvalho Novaes -   25/11/2023 09:31:48

Aqui em São Paulo, sigo assistindo esse quadro ‘maravilhoso’. O Brasil é um país corrupto. Além dos tradicionais políticos, todos foram comprados - juízes, funcionários públicos, grandes empresários, jornalistas e canalhas em geral… É… a coisa tá cada vez mais emocionante.

JOÃO EICHBAUM -   25/11/2023 08:10:25

Aplaudo de pé teu artigo, Puggina. Uma verdadeira lição de estilo e de moral, para quem precisa das duas coisas!

Odilon Rocha -   25/11/2023 07:46:46

Caro Professor Não sabia que o senhor era, além de preciso articulista, um acurado cirurgião. Sem retoques e suturas.

Menelau Santos -   24/11/2023 20:52:12

Prezado Professor, ótima sua análise. Através dela concluo que CONGRESSO, STF, CÂMARA, SENADO, RODRIGO PACHECO, GILMAR, BARROSO, CONSTIUIÇÃO, nada vale, o que conta mesmo são os interesses pessoais. Aquela grandeza de pensamentos, a nobreza de propósitos, tudo passa longe disso tudo. Só que resta é a mesquinharia e a torpeza dos interesses humanos mais baixos.