• Olavo de Carvalho
  • 19/04/2009
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A PROIBI?O DE COMPARAR - Enviado ao site

Este ? terceiro de uma s?e de cinco artigos com o tema Brasil-Mentira A democracia reside na busca permanente da compensa? m? entre fatores que, em si, n?s?democr?cos. Exemplos recentes da radical aboli? do senso das propor?s nas discuss?p?cas neste Pa? e da sua substitui? por proclama?s absolutistas rancorosas e pueris at? dem?ia, aparecem em dois artigos do Observat? da Imprensa, publica? que, sublinhando o grotesco da situa?, se autodefine n?como um agente entre outros no jornalismo brasileiro, mas como um tribunal para o julgamento da idoneidade dos demais agentes. Discutindo a celeuma causada pelo uso do termo ditabranda, na Folha de S. Paulo, para qualificar o regime militar brasileiro, o Sr. Alberto Dines, fundador, diretor e guru m?mo do Observat?, proclama: O debate sobre a ‘ditabranda’ estava errado desde o in?o porque fixou-se numa classifica? de ditaduras, quando o certo seria discutir a inflexibilidade do processo democr?co. Em um certo momento pareceu que as partes estavam querendo inventar um medidor de ditaduras, ou ditadur?ro, por meio do qual as diferentes relativiza?s, devidamente equacionadas, estabeleceriam um kafkiano ranking de autoritarismo, do suport?l ao insuport?l... A ‘Guerra Suja’ argentina matou 30 mil, a nossa matou 300 ou 3 mil. A quantifica? ?esumana, armadilha brutalizante... Vamos por partes. O Sr. Dines afirma que toda compara? de autoritarismos ?ndecente. S?le a democracia absoluta. O pacifismo ?ncondicional ou ?ip?ta. A democracia ?ntegral ou ?ma farsa. N?vou apelar ao expediente, at?ovarde nas presentes circunst?ias, de mostrar que nenhuma democracia no mundo jamais foi integral. Os meros fatos n?alcan? as alturas do rigorismo plat?o exigido pelo Sr. Dines. Em compensa?, conceitos puros s?o dom?o da l?a e n?podem furtar-se ao dever de definir-se a si mesmos. Ora, a democracia integral ?ndefin?l, porque ?utocontradit?. Todo principiante no estudo da teoria pol?ca tem de saber, desde logo, que a democracia n??ma subst?ia, uma coisa, mas uma qualidade que se tenta impor a uma subst?ia preexistente, isto ??ociedade tal como estava antes do advento da democracia. Tem de saber tamb? em consequ?ia, que a democracia n??ma quantidade fixa, mas uma propor? – e que, por isso mesmo, n?pode ser integral. A democracia constitui-se essencialmente de uma limita? m? entre os poderes, o que subentende que esses poderes existam e que cada um deles n?seja integralmente capaz de limitar-se a si mesmo. Todos os te?os da democracia, mesmo os mais entusiastas, sempre ressaltaram que ela ?m estado de equil?io inst?l, incapaz de fixar-se na perfei? do equil?io puro subentendido na palavra integral. A democracia n??m princ?o universal, mas um arranjo pragm?co. Princ?os universais podem ser aplicados ad infinitum sem levar jamais a contradi?s. Por exemplo, o pr?o suum cuique tribuere, ou a no? de que a responsabilidade de um ato incumbe a quem o cometeu e n?a outra pessoa. Voc?ode aplicar indefinidamente esses princ?os a todos os casos poss?is e imagin?is, nunca levar?a situa?s paradoxais e sem sa?. Bem diferentes s?os arranjos pragm?cos, cuja aplica? ?imitada por defini? e que, estendidos para al?do seu campo pr?o de aplica?, se autodestroem ou se convertem nos seus contr?os. A democracia ?m dos exemplos mais ?os dessa distin? e isso ?esmo uma das primeiras coisas que o estudante de teoria pol?ca tem de aprender. Em toda democracia h?por defini?, uma infinidade de abusos antidemocr?cos. Suprim?os por completo, como subentendido na no? de democracia integral, exigiria a instala? do controle social perfeito, portanto a elimina? da pr?a democracia. A democracia reside precisamente na busca permanente da compensa? m? entre fatores que, em si, n?s?democr?cos. Isso quer dizer que enormes coeficientes de autoritarismo subsistem necessariamente dentro de qualquer democracia e que sem eles o pr?o conceito de democracia n?faria sentido. A democracia integral coincidiria em g?ro, n?o e grau com a ditadura. Em segundo lugar, democracias n?existem no ar, mas em unidades pol?cas soberanas que coexistem com outras unidades pol?cas soberanas. Um regime de um pa?s?de ser democr?co para dentro. N?pode conceder aos cidad? e governos de outros pa?s os mesmos direitos e garantias que d?os nacionais. Isso implicaria sua dissolu? imediata. Uma democracia integral pressuporia a inexist?ia de fronteiras, mas parece dif?l explicar isso a uma mente como a do Sr. Dines. Tratados internacionais podem, por sua vez, retroagir sobre as leis internas, diminuindo o coeficiente de direitos desfrutados pelo cidad?da democracia. Por outro lado, o governo mundial, necess?o ?mplanta? da democracia integral, seria tamb?contradit? com a no? de democracia, por ser inating?l ?iscaliza? direta de todos os eleitorados locais – a n?ser na hip?e de uma humanidade ilimitadamente poligl?a. Uma express?como democracia integral s?de ser usada por um leviano opinador que n?examinou o problema por um s?nuto e que se limita a manifestar desejos arbitr?os como uma criancinha que esbraveja e chora quando contrariada. A exist?ia mesma de um poder legislativo, que ?m componente essencial da democracia, prova que ela n?pode ser integral. Se voc?em de estar continuamente produzindo novas leis, ?orque as anteriores n?produziram a democracia integral. Se a produzirem, a subsequente supress?do legislativo a transformaria ipso facto em ditadura. Basta isso para mostrar como as id?s de pureza e democracia s?radicalmente incompat?is, n?apenas no baixo mundo dos fatos, mas na pr?a esfera dos conceitos absolutos. Como ?oss?l que um sujeito que ignora uma coisa t?elementar da teoria pol?ca tenha os meios de sair por a?ando li?s de democracia? * Ensa?a, jornalista e professor de Filosofia