Érika Figueiredo
É preciso tempo, calma, dedicação e autoconhecimento
A palavra vocação é derivada do latim vocare, que significa chamar. Vocação é uma tendência, uma inclinação, uma habilidade que o indivíduo tem. Toda pessoa é talentosa em alguma coisa, tem um talento especial, que é só seu, e poderá se manifestar , em algum momento da vida.
Essa vocação, no mundo atual, no qual não mais estamos acostumados a prestar atenção aos sinais, à natureza ou a voz de Deus, é mais difícil de ser identificada, e seja ela profissional, social, religiosa ou familiar, muitas vezes é desperdiçada, por seu portador, que não conseguiu percebê-la.
O vazio existencial que se observa nas pessoas, hoje, advém, em grande parte, do não desenvolvimento de suas habilidades individuais. Muito embora um dom seja algo tão único e importante, que transforma toda a nossa existência, quando extravasado, o ser humano não é mais direcionado para identifica-lo, o que gera dor, frustração, e a falta de sentido para a vida.
Acredito que a essência da palavra vocação, que seria um chamado irrefutável, algo do que não se conseguia fugir, na realização de um dom, perdeu-se nos dias atuais. Não há, nos indivíduos, uma percepção acerca de suas vocações, e o respeito a esse chamado que vem da alma. Todos estão tão preocupados com a realização de propósitos absolutamente afastados da essência do ser, como enriquecer, ter um corpo sarado, parecer mais jovem, etc, que não param para escutar esse apelo...
Acontece que Deus nos deu a vida para a realização de missões individualizadas, pessoais e intransferíveis. Apenas de posse desse entendimento, o ser humano é capaz de desenvolver-se plenamente, e sentir-se gratificado, realizado e especial, ao longo de sua existência, por meio do desenvolvimento dos talentos que recebeu.
Percebo esse como um dos maiores problemas da modernidade, e algo sobre o que, infelizmente, as pessoas sequer param para refletir. Mas como descobrir seu dom, sua vocação? Primeiramente, é preciso saber que os dons nem sempre vêm como um chamamento claro.
Os gregos sabiam disso. E tratavam de treinar seus jovens, a partir dos onze anos de idade, no desenvolvimento de suas habilidades, para que daí aflorassem os talentos de cada um. Eles tinham, como base da formação do ser, a filosofia, para o aprimoramento individual moral e a identificação do propósito de vida.
Essa educação inicial, a qual formava o caráter e desenvolvia a personalidade dos jovens, era fundamental para permitir que o indivíduo expandisse seus horizontes e para que se conduzisse no mundo. Uns seriam artistas, outros, guerreiros, outros tantos, negociantes, alguns, líderes, sacerdotes. Mas a vocação estava ali, a nortear as escolhas, fazendo um chamado, que eles estavam para ouvir.
Entretanto, as facilidades da vida moderna, o afastamento do ser humano da natureza e da religião, da família e da educação integral, tal qual aplicada pelos gregos, fez com que a busca do propósito de vida fosse negligenciada, geração após geração, e a ordem interna do homem fosse inexoravelmente corrompida, por meio dos pequenos prazeres, da satisfação imediata das necessidades, o que leva a um distanciamento cada vez maior de sua essência.
Mas afinal, como alguém pode descobrir os próprios talentos, desenvolver seus dons e habilidades, buscar o sentido de sua existência, nos dias de hoje? Já que somente para algumas poucas pessoas, o chamamento vem em alto e bom som, como o homem médio pode identifica-lo?
Acredito que a única forma é por meio da educação e da auto-contenção. Somente por meio do conhecimento ( de si mesmo e do mundo ao seu redor), e do refreamento dos instintos (tão exacerbados hoje em dia), de prazer imediato e satisfação garantida, poderá o indivíduo identificar talentos e inclinações, e com paciência e dedicação, desenvolvê-los.
O imediatismo e a urgência dos dias atuais, a fuga da frustração e a vida voltada para o mundo exterior, não permitem que se busque, com calma e cuidado, o que nos fala mais alto ao coração. É preciso tempo, calma, dedicação e autoconhecimento. Menos ansiedade. Mais silêncio.
Então, nesse ano de 2021, o que desejo aos meus leitores, é isso. Que descubram e desenvolvam seus dons, e assim concretizem a missão que Deus lhes destinou, aqui na Terra. Somente assim, é possível encontrar prazer, satisfação e realização na vida. Somente desse modo, pode-se servir a si, a Deus e aos outros, sem a sensação de inadequação, que hoje povoa as mentes e os corações aflitos das pessoas.
A paz advém da sensação de missão cumprida. Viver é melhor que sonhar. Decidir é melhor que se omitir. Realizar sua essência, sua vocação e seu propósito nessa vida é o que você deve almejar. E nada, absolutamente nada que seja feito, neste sentido, é desperdício de tempo.
Esteja certo de que muitos irão tentar te dissuadir! Mas a maior parte das pessoas que te critica, te boicota, te desencoraja e te aponta o dedo, não realizou, efetivamente, nada de que se orgulhe nessa vida. Siga seu dom, obedeça seus instintos, trabalhe duro e com afinco, para realizar seus talentos. Ouça a voz que grita para você, mas que o barulho do mundo silencia.
“Eu prefiro na chuva caminhar, do que nos dias tristes, de frio, em casa me esconder. Prefiro ser feliz, embora louco, do que em conformidade viver”. Martin Luther King
FELIZ ANO NOVO!
Publicado originalmente em Tribuna Diária (04/01/2021)