Há uma lógica perversa e contínua na prática da persuasão comunista, desde o seu surgimento no século XIX, até hoje. O Manifesto Comunista de, 1848, a Mensagem da Direção Central à Liga dos Comunistas (1850), o panfleto leninista Que fazer? (1902), as atas dos atuais Foro de São Paulo e Forum Social Mundial, assim como os decretos da Venezuela, Bolívia e do Brasil na era petista, reproduzem o desejo de interferência e captura das relações humanas, em todos os níveis, do estado controlado pelo partido. Na esfera do controle estatal pela esquerda brasileira, sabemos o que isso representou: o Mensalão e o Petrolão, este um sistema de corrupção colossal, quase inédito na história humana, comandado por petistas com a finalidade de jamais deixarem o poder.
No Manifesto e na Mensagem, Marx e Engels partiam da noção logicamente insustentável de luta de classes. Hoje, nenhum marxista abertamente defende este espectro conceitual. Eles se transformaram em keinesianos, defensores do estado intervencionista na economia. A análise do marxismo, calcada na lucidez e no bom senso, muitas vezes instiga mugidos de altercação em hordas de ruminantes intelectuais da esquerda, mas não se deixa abater pela algaravia. Estamos vivendo um tempo de reafirmação do pensamento liberal e conservador. Assim, distantes do discernimento, imunizados contra o debate de ideias por uma crosta ideológica, aqueles que clamam pela salvação atual de certas clientelas eleitas – não mais os proletários, mas os pobres em geral, os drogados, os negros que eles dizem representar, os gays e as prostitutas – os marxistas que apregoam o fim da família tradicional e surgimento de novos tipos de uniões extravagantes e que elevam a degradação estética lumpemproletária, para usar um termo caro a eles, à condição de cultura, não são capazes, sequer, de encarar o fato de que o que se predica de um membro de uma classe não pode ser predicado da classe. Por exemplo, a classe dos proletários oprimidos não é oprimida, assim como a classe das mulheres vesgas não é vesga.
Qualquer tipo de realismo metafísico aplicados às classes produz paradoxos, para os quais Marx, Engels, Lênin e seus seguidores não atentaram porque não entediam nada de lógica formal e viviam, como vivem seus seguidores, de uma sentimentalidade pseudocientífica agarrada a abstrações desconectadas dos homens reais. Marx, que jamais entrou numa fábrica e que se deteve tanto na alegada crítica da economia de seu tempo, faz parte da pré-história em termos de lógica de primeira ordem e teoria econômica. Apenas um troglodita intelectual insiste em defender a existência de uma ideia de valor-trabalho, desprezando, por exemplo, a impositiva teoria da utilidade marginal.
Fossem os marxistas capazes de pequena dose de reflexão, dedicar-se-iam mais à análise de seu próprio cânone, daquele mesmo conjunto de textos da escola marxiana, cujo objetivo era analisar os fundamentos socioeconômicos da sociedade industrial do século XIX e projetar, ao modo historicista, as inevitáveis quedas do capitalismo e ascensão da sociedade sem classes dos produtores livres. Esta base milenarista ruiu, porque seus alicerces eram uma falsa economia e uma falsa sociologia.
É fato que a análise exigível da teoria marxiana revela que a ciência revolucionária dos comunistas é não apenas falível, como seria de se esperar de uma hipótese de economia política, mas insustentável. O conceito marxista de luta de classes é falso. E seu fundamento, a dialética, pode ser rastreado nas formulações de Maniqueu e dos primeiros gnósticos. A elevação hegeliana da dialética à dinâmica do ser-em-si-para-si e a sua entificação como movimento inerente à história, como logos encarnado nela, provoca a desestruturação da possibilidade de pensar, porque rompe com os compromissos com a lei da não-contradição e do terceiro excluído, como já demonstrei em artigo anterior. Além disso, ignora a realidade da mobilidade social, que nada mais é do que a possibilidade de que um membro de uma classe venha a transitar para outra, justamente por força da dinâmica das trocas do capitalismo.
Marx fazia o elogio do obscurantismo, na falsa crença de desvendar o mistério social da realidade. A ideia hegeliana das qual ele se utilizou, colocada no campo da "economia politica", era sentimentalista. Marx apegava-se a abstrações e desprezava os fatos ao ponto de alterá-los para que funcionassem como confirmações de suas previsões. A mais evidente demonstração de desonestidade intelectual dessas previsões é a afirmativa de que os operários ingleses estavam progressivamente empobrecendo, com base nos dados econômicos divulgados pelo primeiro-ministro Gladstone (O Capital). A realidade mostrava justamente o contrário. Mas o fetiche da luta de classes, ao qual ele recorreu para elaborar sua filosofia da história com base no materialismo que chamou de dialético não permitia que a realidade desmentisse suas predições. Por isso, que se inventassem os fatos apropriados. Em ciência, há um nome para este procedimento: fraude.
A implantação da utopia socialista, ainda tão esperada por comunistas de todos os matizes, no Brasil, inclusive, foi intentada mais do que uma vez no século XX e só resultou em desgraça. O Manifesto Comunista de Marx e Engels é um panfleto que convoca à realização da guerra total. O lema era estimular, junto aos trabalhadores, a união política em torno de luta de classes. Com olhar calmo, nos damos conta de que os espertos esbirros petistas da plataforma marxiana conduziram ao Mensalão e ao Petrolão, ao desastre econômico pela via do dirigismo centralista de partido e da corrupção sistêmica. Eles estavam comprometidos com uma modalidade de subtração de direitos democrático-constitucionais, que tem no respeito à propriedade privada, no princípio da representação, na transparência no trato com a coisa pública, na separação entre partido e estado, na preservação da liberdade individual e na proteção da autonomia dos indivíduos, os seus princípios fundantes. Ora, nenhum marxista pode conformar-se com uma declaração como essa, cujo conteúdo é incompatível com uma visão totalitária das relações humanas.
Para marxistas, o crime, tal como definido na lei das democracias constitucionais, não é, de fato, crime, mas, muitas vezes. forma de ação política revolucionária, um meio dos quais se utilizam quando lhes é conveniente e que se legitima na ideia de varrer da história a injustiça, para eles, inerente ao capitalismo. Uma perversão até hoje defendida por progressistas chiques.
* Possui graduação em Comunicação Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1982), mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1989) e doutorado em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1998).