Luiz Guedes, adv.
No dia 11/11/2024 havia 134 assinaturas de deputados para a proposição da PEC que visa o fim da escala de 6×1 na jornada de trabalho do brasileiro. Necessário ter pelo menos 171 assinaturas dos 513 deputados federais.
Como funciona hoje?
Hoje, a cada seis dias trabalhados, o trabalhador tem direito a um dia de repouso remunerado, de preferência aos domingos, conforme previsão contida no art. 7º, inciso XV, da Constituição Federal.
Como ficará se a PEC for aprovada?
Se a PEC tramitar e for aprovada, a cada quatro dias de trabalho, o trabalhador terá direito a três dias de repouso remunerado, com carga máxima de 36 horas semanais sem perda salarial.
Como se mede a produtividade?
A produtividade de um país é calculada realizando-se a divisão do PIB pelas horas trabalhadas no ano. O Brasil tem uma das piores produtividades do mundo, ficando atrás dos Estados Unidos, Espanha, Alemanha, Japão, entre outros.
No ranking de competitividade de 2023, o Brasil encontra-se na 62ª colocação, em um rol com 67 países. O país ficou na última colocação no indicador de “eficiência governamental” em 61º lugar no indicador “eficiência empresarial”.
Manifestações sobre a proposta
Importante analisar os diversos pontos de vista sobre a proposta mencionada. Inicialmente, saudável ter sempre em mente que uma coisa é aquilo colocado no papel, outra é a real repercussão que uma medida legislativa pode ter no mundo real.
O que se quer dizer com isso? Na proposta há menção de que não haverá perda salarial com a redução da jornada semanal de 44 para 36 horas. Aqui há diversos desafios, para não se falar em problemas.
Primeiro, existem diversos setores da economia com difrentes dinâminas de funcionamento, podendo essa futura PEC, se aprovada, causar problemas, em especial para o trabalhador, pois se os empregadores constatarem que a produtividade do trabalhador não compensa o valor da hora-trabalho, inevitavelmente o demitirá.
Segundo, a produtividade do brasileiro é muito baixa, se comparada com países que adotaram a jornada de trabalho mencionada de 4×3. A título de exemplificação, para ficar mais fácil a compreensão sobre o tema: o trabalhador americano[*] é 4 vezes mais produtivo que o brasileiro, isso é, enquanto o trabalhador brasileiro faz uma atividade em 60 minutos, o americano faz em 15 minutos, de acordo com a consultoria Conference Board. Então, no mundo fático, como pagar o mesmo salário por menos horas trabalhadas sem aumento da produtividade? A conta não fechará.
Terceiro, aumento de custo na produção de produtos e serviços resultará no aumento do preço a ser pago pelo consumidor. A renda disponível da população brasileira, de forma real e efetiva, vem diminuindo e, com a reforma tributária, diminuirá ainda mais. Assim, deixo a seguinte pergunta: o brasileiro irá comprar mais ou menos produtos e serviços que ficarão mais caros com o aumento de custo decorrente da eventual aprovação da PEC mencionada? É evidente que menos, o que resultará em um ciclo vicioso, com diminuição de empregos e da renda disponível para o consumo.
Somente quem não analisou esses aspectos, para não falar de muitos outros possíveis, é quem defende a aprovação dessa PEC. A inserção de um texto na Constituição Federal não tem o condão de modificar a realidade, mormente a dinâmica do mercado, no qual os produtores e prestadores de serviços buscam ofertar seus produros e serviços ao mercado consumidor com o menor custo possível e os consumidores buscam adquirir produtos e serviços a um menor preço. Fica difícil alcançar um preço interessante para esses dois atores quando um terceiro, chamado de Estado, impõe custos à produção, o que resulta em externalidades negativas para todos.
Os defensores da PEC aduzem que isso melhorará a qualidade de vida dos trabalhadores, que disporão de mais tempo com a família e para atividades de lazer, no que denominam de “Vida Além do Trabalho”.
Na verdade, quem está a favor dessa PEC na forma como está redigida é quem se preocupa apenas com os dividendos eleitorais, vendendo uma proposta com potencialidade negativa como se fosse algo positivo para a sociedade [**]. Isto é, no mercado eleitoral, vende-se mais as propostas demagógicas do que as realistas.
Uma ideia para tornar a PEC menos problemática
Uma opção seria deixar essa modalidade de jornada de trabalho como opcional, possibilitando que empresas a adotassem caso considerassem interessante para seus negócios, podendo até mesmo ser apresentado como um diferencial para a atração de talentos. Tornar isso obrigatório ignora as diversas realidades socioeconomicas existentes em diversas partes do Brasil, o que resultará em resultados negativos
O que poderia ser feito para diminuir as chances de aprovação de propostas com potencial negativo?
Uma PEC interessante que poderia ser apresentada e aprovada pelo Congresso Nacional seria uma que previsse a obrigatóriedade de se apresentar estudo de impacto socioeconômico das propostas legislativas (proposta de emenda constitucional ou proposta de lei), condicionando a tramitação e aprovação apenas daquelas que apresentassem potencial de produzir mais efeitos positivos (externalidades positivas) do que negativas.
Na proposta deveria estar inclusa uma revisão periódica (pelo menos a cada 5 anos) dos efeitos concretos do diploma legal, com previsão de aprimoramento ou de retirada do ordenamento jurídico caso se comprovasse causar efeitos negativos.
Deixe abaixo a sua opinião sobre o tema.
Íntegra da proposta, clique aqui.
[*] Os EUA não adotam esse regime.
[**] Só é possível reduzir a jornada quando a produtividade brasileira aumentar proporcionalmente.
P.S.: alguns países adotaram ou testaram a semana de 4×3, entre eles: Bélgica, Islândia, Nova Zelândia, Japão, Espanha e Reino Unido. Porém, a produtividade desses países é superior à brasileira, bem como a realidade socioeconômica bastante distinta, o que torna difícil trazer essas novidades, sem adaptações, ao Brasil.