• Prof. Julio Pereira Lima
  • 23/07/2020
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PASMEM , É A CIÊNCIA !

 

O planeta em geral e o RS , em particular, experimentam desde março um pânico imposto a população por muitos políticos , pela mídia em peso e por uma parte de médicos possivelmente bem intencionados em relação a pandemia do novo coronavírus. Nós médicos, quando prescrevemos uma conduta, sempre devemos avaliar riscos e benefícios do tratamento indicado. Não podemos prescrever um tratamento que reduza a mortalidade de uma dada doença ( um câncer , por exemplo) em talvez 30% ,se os tratados possam ter efeitos colaterais insuportáveis ou mesmo mortais em quantidade similar a essa.

Chegou-se ao ponto de leigos discutirem contra e a favor de tratamentos para a covid-19 e a conduta médica perante a pandemia passou a ser ideológica , assistindo-se médicos falsificarem pesquisas ( Lancet), administrar doses mastodônticas ( cavalares foi pouco) no intuito de “prejudicar” trabalhos com o uso de uma droga: a hidroxi-cloroquina (HCQ), As outras drogas que são prescritas pela ralé da Medicina (ivermectina e corticóide) são de “centro-direita” e admissíveis em alguns pacientes , menos , é claro, nos pacientes do SUS. No outro lado, há um grupo de médicos especialistas em cardiologia, bioestatística, AIDS, oncologia , professores de educação física etc.. que defendem a quarentena como a salvação de vidas. É a ciência, bradam! E os jornalistas os entrevistam e acreditam. Cheguei a “ver” um jornalista pedir desculpas aos ouvintes/leitores por entrevistar um médico e político que pensa diferente , pois tomar conhecimento de suas opiniões poderia colocar a população em risco. Afinal , “fique em casa” é cool e pela vida. Os que divergem dessa opinião devem ser calados e espezinhados a todo custo.

Nenhuma sociedade médica em suas diretrizes de tratamento para uma dada doença deve defender o uso de drogas com nível de evidência C. Traduzindo : “a melhor nota é A e a pior é D”) , apenas A. Como justamente é o caso da HCQ e da ivermectina no tratamento da COVID-19. O médico do paciente deve pesar os benefícios nos estudos que leu versus os baixíssimos riscos dessas drogas nas doses adequadas ( não mastodônticas ), uma vez que elas têm décadas de emprego clínico seguro. Sem dúvida , prescrevê-las não é cientificamente comprovado. Porém , Isso está longe de ser fake-news como querem muitos jornalistas e alguns médicos cool.

O RS em 15/3/2020 com NENHUMA morte por covid-19 optou pela quarentena/ distanciamento social horizontal seguindo conselhos cools., modernos , “científicos”, “em prol da vida” . Infelizmente , a conduta empregada de científica não tem nada e de medieval tem muito. Embora possa parecer lógico que se não entrarmos em contato com ninguém, a doença desaparecerá com os primeiros mortos, isso é impraticável pois profissionais de saúde, frentistas, vendedores e produtores de alimento entre outros não podem parar e de cada 10 infectados apenas um tem sintomas, o que mantem o ciclo da epidemia. Qualquer estudante de segundo ano de Medicina , mesmo EAD como os atuais, sabe que uma epidemia só acaba quando 20-60% da população tiver tido contato com o agente ou vacine-se a população contra o mesmo. No caso do coronavírus , essa chamada imunidade coletiva parece ser, a cada novo estudo publicado, inferior mesmo a esses 20%. A prestigiadíssima “Revisão Cochrane” sob encargo da OMS avaliou o valor da quarentena/distanciamento social horizontal/lockdown na pandemia de covid-19 e outras epidemias virais e concluiu que esta conduta é evidência D (“nota pior que a cloroquina”), com muito baixa evidência que funciona e que todos os estudos realizados até então eram de muito baixa qualidade não devendo jamais servir para diretrizes societárias. E agora, e a ciência ?

Segundo a Cochrane, o distanciamento social adotado no RS poderia reduzir a mortalidade da doença em 30% caso o vírus “precisasse “ contaminar 70% da população e tivesse uma “capacidade de transmissão” de 3. Por sorte nossa , talvez nem 20% precisem ser contaminados e a transmissão do vírus é muito provavelmente inferior a 2 na média.
Pasmem! Os “cientistas puros” (não terraplanistas!) nunca mencionaram que , se o distanciamento social funcionasse ( repito,caso funcionasse) sua grande função talvez não fosse reduzir o número de mortos pela doença , mas sim, distribui-los ao longo do tempo. E é exatamente isto que estamos assistindo em nosso país e estado. Nosso estado começou a quarentena em pleno verão (bactérias adoram verões, vírus são apaixonados por invernos) e o resultado do primeiro estudo de prevalência ( da UFPEL) mostrou que com mais de 20 dias de quarentena a doença praticamente inexistia no RS. 2/4000 ou 0,05% de positivos. Pasmem! Nesse momento foi mantida a quarentena o que poderia ter uma de duas explicações: preconceito (não acreditaram no próprio estudo), o que inicialmente é perdoável em ciência ou erro de interpretação dos resultados, o que é imperdoável em ciência, empurrando a epidemia para o inverno, o que indubitavelmente consistiu no maior erro de gestão de saúde da história do RS. Entre 15/3 e 31/5 , os médicos assistiram a maior epidemia de saúde de nossa história. Hospitais vazios UTIs vazias, ambulatórios despovoados. Os jornais assustavam a população com 70-80% de lotação de UTIs, quando a média histórica fora do inverno é superior a 95%. No inverno ultrapassa 100%. E a cada rodada de divulgação da “pesquisa de Pelotas” , é registrado uma redução de pessoas que cumprem o distanciamento social ( o censor do Pravda da quarentena não percebeu e divulgou esses dados !).É óbvio : são 4 meses e seguramente 2 deles desnecessários , mesmo para os que acreditam na Medicina Medieval! Fecharam-se escolas, quando comprovadamente crianças transmitem o vírus 10 vezes menos que adultos e a mortalidade entre elas é inferior a 1 para 1 milhão. Entre adultos provavelmente seja de 0,1% ( 1 em mil).

Mais grave ainda, o artigo da Cochrane enfatiza que não avaliou os efeitos colaterais (sociais, psicológicos, físicos, aumento de gravidade de outras doenças crônicas e agudas, desemprego etc...) da conduta tomada. Interessante que os muito preocupados com os efeitos adversos da HCQ, deveriam saber que de todas condutas existentes, a de longe mais carregada de efeitos colaterais, inclusive mortais, é a quarentena. É sabido com evidência grau A (“nota máxima” ) por estudos em vários países que quanto maior a taxa desemprego de uma dada população , maior a mortalidade em sua população economicamente ativa. No Brasil , estudo avaliando mais de 5000 municípios entre 2012 e 2017 , verificou que 30000 pessoas morriam a mais no ano seguinte a cada ponto percentual de aumento na taxa de desemprego. Os primeiros 2 meses ( até 15/5/20) de quarentena custarão a vida de aproximadamente 2800 gaúchos entre 18-60 anos até 15/5/2021, caso nosso estado mantenha a média nacional de desemprego. Isto é evidência grau A. É ciência.

Não entrarei no detalhe dos estimados 50.000/60.000 casos de câncer que terão retardado seu diagnóstico e, consequentemente, impedido sua cura em nosso País. Um determinado serviço privado de radiologia de Porto Alegre diagnosticava em média 14 casos por mês de câncer de mama. Em abril foi zero. em maio foram 2. Em 2021, teremos provavelmente 26 mulheres a mais com câncer de mama incurável diagnosticadas na nossa cidade. E a ciência? Não vou comentar o aumento nas taxas de femininicídio , depressão , suicídio e outros incontáveis danos psicológicos causados pelo medo dos políticos em lhes serem imputados mortes, da histeria da grande mídia (que tem, e muito, parcela de culpa) e da pseudo-ciência evidência D dos ouvidos por nossos governantes em Porto Alegre e RS.


Prof. Dr. Julio Pereira Lima , MD, PhD , FASGE.
Prof. Associado do Serviço de Gastroenterologia da UFCSPA/ Santa Casa de Porto Alegre.
Chefe do Serviço de Endoscopia Digestiva da UFCSPA/ Santa Casa de Porto Alegre.
Presidente da SIED (2016/2018).
2019 German Endoscopy Society Honour Award Carrier
2019 DGVS-Sektion Endoskopie Ehrenpreisträger