Eu nunca acreditei, mas houve quem pensasse que já tínhamos superado essa fase. Que tal palavra não assustava mais, mas certos vícios de pensamento de um povo inteiro não desaparecem assim tão facilmente, em coisa de uma década. E eis que a palavra “privatização” surge de novo como um bicho papão para apavorar candidatos às eleições de 2018.
A maioria deve lembrar como Lula venceu as eleições de 2006, apesar de desgastado pelo escândalo do mensalão. No primeiro turno, venceu por pequena margem o então candidato Alckmin. Os dois foram para o segundo turno, onde Lula sacou a sua arma mais poderosa, a bala de prata que fuzilou a candidatura de Alckmin: a ameaça de privatizações caso o tucano fosse eleito. Lula acabou aumentando a vantagem obtida no primeiro turno. Alckmin não resistiu à rejeição que o povo tem de “vender patrimônio público”, por mais prejuízos que tenha ao mantê-lo.
Aparentemente, tentando compreender o que está por trás desse quase masoquismo que o brasileiro nutre em relação às estatais e ao tal “patrimônio público”, dá para notar que há quase que uma fé cega em alguma coisa semelhante ao “bilhete premiado” ou à “sorte grande” que pode aparecer a qualquer momento, quando sob a batuta do estado. Basta assistir um dos tantos filmes publicitários na TV, patrocinados por sindicatos de todos os tipos. Em um deles, uma estatal seria “a galinha dos ovos de ouro”, que iria pagar com seus lucros todas as necessidades brasileiras nos próximos séculos, a despeito de vir acontecendo justamente o contrário, os prejuízos que ela tem dado na realidade corroeram os fundamentos da empresa e não geraram um centavo de lucro para o estado brasileiro nos últimos anos.
Obviamente, além de esconder que mesmo privatizada a empresa continuaria dando muito dinheiro para o estado brasileiro, na forma de impostos cobrados sobre sua atividade e/ou produtos, tais propagandas escondem mais. O não tão óbvio para muitos, é que uma saudável concorrência aumentaria a competição, reduziria preços ao consumidor e estimularia a economia como um todo, pois permitiria um maior acesso da população a mais serviços e mais produtos, porque mais baratos. Isso impulsionaria o crescimento do PIB e da arrecadação como um todo.
Mas quê! Na cabeça do povo brasileiro, isso seria como “rasgar o bilhete premiado”! Capaz! De forma alguma! Morre-se com o bilhete, mas não se entrega ele de “mão-beijada” para os estrangeiros, para o “capital”, para o “imperialismo econômico”. O que vai acontecer é simples: a tecnologia dos combustíveis fósseis acabará superada e o “bilhete premiado” vai perder seu valor, e ainda vamos ficar com um mico na mão. Não duvide que no futuro, por questões ambientais e de avanço da tecnologia, internacionalmente acabe-se proibindo a extração de petróleo, assim como já se baniu a extração de outras commodities pelos mesmos motivos em anos recentes.
A campanha política deste ano será divertida. Há alguns candidatos, que ainda em pré-campanha, falam de boca cheia em privatizar, reduzir o tamanho do estado e outras pautas liberais. Quero ver quando chegar a hora dos debates, do olho no olho, das pesquisas mostrando que a maioria ainda rejeita largamente as privatizações, se a valentia de defender privatizações vai se manter. A recente greve dos caminhoneiros e a recente rejeição da aprovação do plebiscito para privatizar estatais no Rio Grande do Sul já deram a sinalização para os candidatos.
Quando começarem as campanhas para valer, vamos ver do que são feitos os candidatos liberais, se de barro ou aço inoxidável.
*James Masi Dressler é formado em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS e pós-graduado em Ciência da Computação pela mesma universidade.