Herodes, rei dos judeus, foi personalidade cruel e sanguinária, que não hesitou em decretar a morte de dois filhos e da própria esposa. Quando nasceu Jesus, apavorado com a notícia de que nascera o futuro rei, seu sucessor, ordenou a matança de todas as crianças recém nascidas.
O júbilo na Argentina das massas urbanas festejando a esperada confirmação para breve da legalização do aborto, com milhares de apoiadoras de todas as idades, inclusive de muitas bruacas horrorosas em êxtase, rindo e batendo palmas, lembrando cenas do circo romano, demonstra que o sacrifício dos inocentes ainda está vivo como motivo de júbilo para muita gente. A carnificina covarde ordenada por Herodes, está viva na memória de muita gente.
A reprovação do aborto não responde a motivos religiosos, exclusivamente. Sua condenação se apóia, de direito, em argumentos leigos sem nada a ver com religião.
O argumento religioso tem o defeito de interessar somente à população devota.Não impressiona nem interessa à população leiga,talvez majoritária.
A novidade tem nome: “a interpretação antropológica do aborto”, antecipada pelo filósofo espanhol Julián Marías. A visão antropológica do aborto acompanha o desenvolvimento do nascituro desde o primeiro momento, que é a concepção. O cúmulo da hipocrisia está em marcar data para a legalização do aborto, depois de decorridos tantos meses. Quer dizer que o feto só assume a condição de intocável pela agulha do cirurgião depois de certo tempo?Quer dizer que o nascituro só assume condição humana a partir de determinada data?
Muito ao contrário, a condição humana, pessoal, do feto, tem início a partir da concepção. Por que razão o ser humano seria diferente das outras espécies? Por que razão um mamoeiro só poderia ser considerado mamoeiro depois de crescido? E antes, enquanto tenro arbusto,não mereceria o título de mamoeiro?
Muita hipocrisia é admitir que o feto antes dos três meses pode ser sacrificado cruelmente porque ainda não tem idade para ser portador de direitos, sobretudo o direito à vida,base de todos os demais direitos.
O feto, a partir da concepção,com um só dia de idade é portador do direito à vida, devendo ser respeitado como um embrião da futura pessoa plena.
Por isso mesmo é falso sustentar que o direito ao aborto justifica-se porque a mulher tem direito absoluto sobre seu corpo. Sim, é verdade, exceto quando a mulher é portadora em seu útero de um ser vivo,uma pessoa em embrião, que deve ser reconhecida plenamente como outro ser, outro destino desde a concepção.
Ou seja, o feto no corpo da mulher não pertence à mulher, compromissada a respeitar sua personalidade desde que sente a primeira palpitação em seu ventre de outro ser humano a caminho. Não é esta a beleza da gravidez?
*Procurador de Justiça em MP/SP
**Publicado no Facebook do autor.