Curitiba, sábado pós-feriado do Dia do Trabalho. Sede da Superintendência da Polícia Federal paranaense. Audiência desdobrada entre o final da manhã e o início da noite. Presentes na repartição o depoente, dois delegados da Polícia Federal, três advogados, três procuradores da República designados pelo Chefe do Ministério Público da União e um escrivão.
Este cenário resultou num depoimento de dez laudas, na disponibilização, pelo ex-ministro Sérgio Moro, de uma conversa ocorrida no seu aparelho celular entre ele e o Presidente da República, numa aparente confusão entre relatórios de inteligência e de inquérito e, por fim, de referências nominais a Ministros de Estado que teriam participado de tensas negociações nos últimos dias de abril. Dentre as respostas às indagações formuladas ao depoente, algumas chamaram a atenção. A referência de que caberia ao titular do Palácio do Planalto prestar esclarecimentos sobre os motivos das trocas do Diretor Geral e dos Superintendes da Polícia Federal nos Estados do Rio de Janeiro e de Pernambuco, bem como sobre quais informações especificamente pretendia obter da PF e que lhe teriam sido sonegadas foi uma delas, eis que apareceu por sete vezes.
Esta, sem margem para muitas dúvidas, foi uma questão relevante que emergiu com força. Aliás, provavelmente a mais relevante de todas. Afinal, além de não abordar frontalmente o item relacionado à suposta vaga para o Supremo Tribunal Federal, o experiente ex-juiz, seja não elucidando, seja alegando desconhecer quais seriam os efetivos motivos do Presidente da República para efetuar as trocas, “interferências na PF” conforme acusou na sua coletiva, deixou transparecer que não dispõe de outras provas acerca dos fatos que alegou. Ao menos nesta etapa da marcha do processo é o que se pode depreender da leitura do termo.
Contudo, diante da petição do Procurador Geral da República que deflagrou a investigação, o momento para a entrega de áudios, vídeos e outros elementos mais, caso existam - ou existissem-, seria ali, salvo se o outrora magistrado aposta na judicialização do inquérito para ampliar o leque probatório das suas imputações. No entanto, isso pode ser - ou ter sido - uma estratégia arriscada caso as testemunhas a serem inquiridas logo adiante não confirmem as suas versões.
De outra parte, o Chefe do Poder Executivo “interagir, telefonar e obter relatórios de inteligência” não tipifica, de modo pronto e acabado, na conduta de interferir num órgão público. E sempre é importante lembrar que no campo probatório, sobremodo na seara criminal, a prova deve ser inequívoca. Ademais, o depoente enfatizou, por duas vezes, que o Presidente alegou improdutividade funcional para as mencionadas substituições. Enfim, ainda é prematuro avançar.
Como já era imaginado, o teor da oitiva gerou expectativas e posicionamentos. Juristas, parlamentares, formadores de opinião e veículos de comunicação, cada um se filiando a um determinado entendimento, externaram os seus pontos de vista. Porém, uma vez racionalizado o depoimento e, a despeito das múltiplas versões ou análises vertidas em torno dele, algumas enfatizando outras aniquilando um e outro trecho do seu conteúdo, o certo é que não houve nenhuma revelação do tipo “bombástica” como se costuma aguardar de um episódio que tomou a proporção deste. Muita fumaça e pouco fogo.
* Advogado, Professor de Direito Eleitoral e Escritor.