• Arthur Jorge Costa Pinto
  • 23/12/2018
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NITROGLICERINA PURA

 

A dívida bruta brasileira, que é um somatório das obrigações envolvendo os governos federal, estaduais e municipais, excluindo o Banco Central e as estatais, vai ingressar numa rota de crescimento, devendo apresentar fortes indícios de atingir o pico de 81% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2022, mesmo que sejam aprovadas as reformas estruturais como a da Previdência, a mais importante de todas, segundo previsões divulgadas recentemente pelo Tesouro Nacional no Relatório Quadrimestral de Projeções da Dívida Pública. Sem elas, alerta o órgão, a dívida poderá ultrapassar 90% do PIB. Todavia, ocorrendo o avanço das reformas, o nosso endividamento começará a cair a partir de 2023, podendo chegar em 2027 a 73,2% do PIB.

A dívida bruta de R$ 5,5 trilhões é um dos principais indicadores internacionais utilizados pelas agências de classificação de risco (rating agency). As notas atribuídas por elas servem para avaliar o grau de confiança dos investidores na economia de um país. De acordo com as agências, o patamar de 80% representa a "faixa da morte", indicando que o endividamento de países emergentes como o Brasil, é insustentável. Serve também como uma recomendação, ou não, na tomada de decisões sobre investimentos.

Havendo uma tendência crescente da dívida, em um cenário de ausência de reformas, ocorrerá o agravamento da nota brasileira e os investidores estrangeiros fatalmente terão que retirar seus recursos do Brasil, em função do elevado risco de ser decretada uma "moratória" interna. Esta seria uma condição um pouco semelhante ao que ocorreu conosco durante o governo Sarney, só que, naquela época, isso ocorreu com a nossa dívida externa.

A situação poderia estar muito pior, caso não tivessem sido acordadas, logo após o impedimento da "iluminada" Dilma, as antecipações nas devoluções dos empréstimos realizados pelo Tesouro Nacional ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), principalmente durante o desgoverno da petista com o pretexto de serem "subsídios" para estimular o setor produtivo através do crédito. No fundo, a finalidade era outra, ou seja, "acolher" com outras intenções preferencialmente os empresários próximos à caneta presidencial.

Com isso, esta se tornou uma interessante contribuição para o controle da dívida. Até momento, já foram devolvidos R$ 310 bilhões, havendo o cronograma de retorno acertado com este banco de fomento que ampliará de R$ 6 bilhões para R$ 25 bilhões, podendo chegar a R$ 30 bilhões, os reembolsos anuais ao Tesouro. Os custos dessa "generosidade" nos últimos anos chegaram ao incrível montante de R$251 bilhões.

Até 2027, existe uma possibilidade de redução da dívida bruta de aproximadamente nove pontos porcentuais, consequência dessas restituições já realizadas e as firmadas pelo BNDES com o Tesouro para os próximos anos. É bem provável que se não houvesse a implantação desse cronograma de reembolso, a dívida bruta atingiria o patamar de 82,2% do PIB em 2027 , sendo este, reforçando o que já foi dito, um percentual considerado altamente explosivo conforme os padrões internacionais na avaliação de sustentabilidade para nações emergentes como a nossa.

Outro ponto relevante encontrado nas projeções do relatório do Tesouro é que a dívida vai crescer 3,3% no exercício de 2018 e deverá se colocar a 77,3% do PIB no final desse mês. Nos últimos cinco anos, sua trajetória saltou de 51,5% ao final de 2013 para 77,2% em outubro passado. Isso indica que o custo de não fazermos as reformas implicará que certamente o mercado irá se antecipar, tornando bem mais dispendioso o financiamento da dívida interna. Consequentemente, existe o risco de a inflação voltar e o crescimento da atividade econômica ser muito baixo e, até mesmo, retornar ao negativo. São fatos realmente concretos e extremamente preocupantes.

Não consigo enxergar outra alternativa no primeiro ano do novo governo que não seja o enfrentamento da dívida pública. Sem falar que ele tem que assegurar o crescimento da economia e as reformas estruturantes, uma vez que a estabilização do endividamento público somente terá resultado se for realizado por meio de um caminho mais duro. São inevitáveis os cortes profundos nos gastos, a fim de evitar o aumento de impostos que a sociedade brasileira jamais aceitará pois já vem sendo sufocada há décadas. Além do mais, isso vai na direção contrária ao que foi defendido pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, durante a campanha eleitoral.

Outra grande verdade se deve ao fato de que a economia, a partir do final de 2014, foi perdendo fôlego a cada mês, em virtude da recessão que começávamos a enfrentar e das despesas que até hoje não param de crescer. Evidentemente, a arrecadação despencou a um nível insuportável. Atualmente, já apresenta uma tímida recuperação frente às nossas reais necessidades. Afinal de contas, se as coisas continuarem nesse ritmo a expectativa é que os resultados fiscais do Brasil sejam muito piores que os dos demais emergentes nos próximos anos.

O desafio de restaurar as condições de sustentabilidade da dívida é prioritário e está inteiramente correlacionado com a recuperação da capacidade de crescimento, de geração de renda e emprego e na redução das desigualdades sociais, por meio de um Estado mais eficiente e, igualmente, eficaz.

*Arthur Jorge Costa Pinto é Administrador, com MBA em Finanças pela UNIFACS (Universidade Salvador).

**Publicado originalmente em http://lorotaspoliticaseverdades.blgspot.com.br/