Dartagnan da Silva Zanela
Nota do editor: Procusto, personagem da mitologia grega, era dono de uma estalagem onde hospedava seus clientes em camas sempre erradas. Se altos, dava-lhes um leito pequeno; se pequenos, um leito grande. À noite, invadia os quartos para cortar o que sobrasse dos maiores e espichar os baixinhos quebrando-lhes os ossos.
Mêncio, o grande sábio chinês, nos ensina que um homem que se dobrou a si próprio, aos seus desejos e às suas paixões nunca poderá endireitar os outros.
Um homem que se rendeu aos seus caprichos não pode servir de exemplo de retidão para ninguém e, por isso mesmo, não tem autoridade alguma para palpitar sobre a educação de alguém, tendo em vista que a essência do ato de educar é a apresentação da retidão através do constante esforço individual para retificar de si próprio.
Aliás, como bem nos ensina o velho brocardo romano, as palavras movem e isso, como todos sabemos, é bom, mas não é suficiente. Já os exemplos, estes arrastam, e isso é a própria excelência vestida de carne e ossos; ou a decadência, dependendo do que estará sendo apresentado como exemplo.
Infelizmente, tornou-se um lugar comum no mundo contemporâneo, acreditar que a presença de um monte de traquitanas eletrônicas seria mais do que suficiente para se educar uma pessoa, como se plataformas digitais e coisinhas similares fossem as colunas fundamentais para a edificação de uma educação de qualidade.
Além disso, os crédulos desse tipo de patacoada hi-tech também creem que uma avalanche de controles burocráticos, estéreis e caducos seriam a garantia de que tudo correrá muitíssimo bem na formação das tenras gerações.
E o pior é que os tapados nem se tocam de que eles estão cada dia mais preocupados, preocupadíssimos, com os números apresentados de forma Mandrake pelos sistemas digitais de controle; e, cada vez menos, com o que efetivamente os infantes estão, de fato, aprendendo e, principalmente, com o tipo de pessoas em que eles se estão tornando.
Pois é. Todos sabem que essa conversa toda de novas tendências em matéria de educação é uma cilada, uma baita cilada; mas, "sacumé" que são as coisas: todos sabem, todos veem e, por isso mesmo, praticamente todos preferem fingir não estar vendo a longa marcha da vaca para o brejo que se descortina diante de nossos olhos.
Esse clima de dissimulação que impera em torno das tais plataformas digitais, dos sistemas de controle burocrático e tutti quanti, é o retrato fidedigno daqueles que estão ditando os rumos do sistema educacional, imagem essa que fala por si só, contradizendo tudo, tudinho que está sendo dito a respeito das mesmas, tendo em vista que, como havíamos destacado linhas acima, as palavras muitas vezes podem ser dúbias, mas os gestos, os atos, os exemplos, estes são sempre transparentes e, por isso, arrastam.
Sim, eles podem empurrar para o alto, mas também podem nos puxar para baixo. Eles podem nos convidar para almejarmos a excelência, como também podem nos aliciar a nos contentar com a mediocridade, ou com menos do que isso e, esse simulacro de educação hi-tech, com suas dissimulações sem fim, está ensinando, com a clareza de uma manhã de primavera, que fazer manha, fingir e dissimular é essencial para se adaptar a mediocridade reinante, para corresponder aos números que não refletem nada que valha a pena ser mensurado.
Agora, conhecer, de fato, crescer e amadurecer em espírito e verdade, não. Isso seria, nas atuais circunstâncias, dominada por medalhões machadianos digitalizados, uma baita inconveniência.
Sim, eu sei, ninguém diz esse tipo de coisas, por meio de palavras, para uma criança, ou para um adolescente, porém, é bem isso o que todo o sistema educacional, de mãos dadas com a bestializada sociedade midiatizada, está fazendo com as tenras gerações, tendo em vista que todos nós, em alguma medida, nos dobramos caninamente aos nossos caprichos e nos curvamos, servilmente, para as veleidades da sociedade que se ufana de suas vergonhas, que não são poucas.