Li aqui o artigo escrito pelo meu amigo e advogado Marcelo Leal no Estadão em data de ontem (06/02). Tenho lido muitas e diversas críticas ao projeto anticrime/corrupção apresentado pelo Ministro da Justiça Sergio Moro. De um lado advogados criminalistas, especialistas e professores universitários seguindo a linha de raciocínio desenvolvida pelo Marcelo, apontando hipotéticas e futuras inconstitucionalidades derivadas das mudanças contidas no projeto. De outro lado alguns Promotores, Procuradores de Justiça e Juízes apontando a timidez das mudanças apresentadas.
A guerra Cultural, as narrativas contrapostas em todos os setores da sociedade também se refletem no âmbito jurídico. Penso ser necessário, previamente à análise específica de cada ponto do projeto, ter em mente que todo o aparato legal, logístico e humano que íntegra o sistema penal, do Inquérito a Execução tem se mostrado insuficiente ao enfrentamento da criminalidade crescente em nosso país nos últimos 30 anos. Esse é o primeiro dado sensível da realidade. ESTAMOS FALHANDO MISERAVELMENTE NO COMBATE AO CRIME. A simples constatação dessa realidade já demanda, por si só, uma mudança sistêmica profunda em toda a estrutura estatal de combate ao crime.
Recentemente tivemos uma morte brutal de um amigo nosso, assassinado com um tiro na frente da esposa, quando saia de casa. Alguém aqui considera justo que o assassino, cumprindo 40% da pena ( caso primário ) a si imposta, ou 60% ( caso reincidente ) , obtenha progressão de regime e vá cumprir o restante da " pena " em casa?. Ou então que o sujeito que entra na sua casa e furta suas coisas adquiridas honestamente com suor e trabalho honesto cumpra 16,51% somente da pena e vá para o regime semiaberto?
Estamos há muito tempo vivendo uma espécie de autoengano jurídico. O Estado juiz determina a aplicação de 08, 10, 15, 20 anos de pena e o condenado, mercê da benevolência da Lei de Execução penal e da construção jurisprudencial dos tribunais cumpre uma fração ínfima da pena e é agraciado com a progressão de regime. Vai para casa, e para a rua. Isso transforma a sanção penal em algo absolutamente ineficaz. Noutras palavras, os criminosos não tem receio de cometer os crimes, sabedores do quão leniente e benéfico o sistema penal é. Resultado: explosão de criminalidade e violência.
Lembro a vocês que, paralelamente ao fato de termos nos tornado um dos países mais violentos do planeta, somos um dos povos mais ignorantes e iletrados do mundo. Nossos estudantes ocupam os últimos lugares nos testes do PISA. Nunca tivemos um prêmio Nobel em mais de 100 anos no Brasil. É esse o contexto que tem que ser considerado racionalmente e anteriormente a qualquer análise do projeto proposto por Sérgio Moro. VIVEMOS HOJE UMA SITUAÇÃO QUE PROPICIA AO CRIMINOSO O CRIME SEM CASTIGO E À SOCIEDADE O CASTIGO SEM CRIME, para usar uma expressão do meu querido amigo Paulo Antônio Briguet.
Quero lembrar ainda aos colegas do grupo, que a Lei dos Crimes hediondos ( 8072/90 ) previa o cumprimento integral da pena em regime fechado. Esse dispositivo vigorou até 2007, ocasião em que em decorrência de mudanças na composição no STF, tal dispositivo foi considerado inconstitucional em apertada votação ( 6 x 5 ).
Precisamos de um sistema penal mais eficiente, que efetivamente trate o criminoso como individuo responsável por seus atos e não como vítima da sociedade, e que efetivamente PUNA a prática do crime. É nesse contexto inicial, a meu ver, que o projeto deve ser avaliado.
* Promotor de Justiça no MP/PR