• Paulo Briguet
  • 19/12/2015
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CONFISSÕES DE UM EX-ESQUERDISTA

 

Confesso que acreditava na revolução socialista como futuro da humanidade. Todos os meios estavam relacionados a esse fim.

Confesso que não via o roubo necessariamente como um mal. Se o dinheiro fosse desviado em nome da causa, tudo bem. Roubar dos ricos (patrões) para dar aos pobres (esquerdistas) era aceitável. Nunca roubei nada, por não levar o mínimo jeito para a coisa, mas pensava assim.

Confesso que não acreditava em Deus e, se Deus não existia, tudo era permitido, desde que contribuísse para a emancipação da humanidade.

Confesso que não acreditava em fidelidade conjugal. Todas as regras morais eram mecanismos de controle impostos pela sociedade burguesa. Se tinha a chance de ser feliz com várias mulheres, por que não?

Confesso que não gostava de empresários. Não aceitava a ideia de que uma empresa fosse criada para ser rentável. O lucro me parecia algo essencialmente imoral.

Confesso que participei de vários linchamentos morais, um deles contra um amigo.

Confesso que, se fosse necessário para o bem da revolução, trairia qualquer amigo.

Confesso que não acreditava em verdades absolutas. Portanto, a mentira inúmeras vezes era um dever.

Confesso que morria de medo de ser desmascarado e humilhado em público. No fundo, eu me considerava uma farsa. E era.

Confesso que odiava o povo. Afinal, se a revolução traria tantos benefícios, por que os pobres continuavam votando em candidatos “da direita”?

Confesso que odiava especialmente os bem-sucedidos e gostaria de vê-los despojados de todos os confortos, luxos e facilidades. A inveja era meu oxigênio.

Confesso que via todos os assassinos e marginais como vítimas da sociedade. Os verdadeiros heróis eram os bandidos.
Confesso que vivia mergulhado em depressão, vício e rancor. O medo era meu principal companheiro.

Confesso que a minhas únicas consolações eram a música e a literatura. Mas não conseguia encontrar a alegria nem mesmo nas obras-primas de Bach e Tolstoi.

Confesso que a conquista do poder e o suposto “bem da coletividade” eram muito mais importantes do que o destino dos indivíduos. Minha vida era uma convenção coletiva sem fim.

Confesso que não afastava a hipótese de eliminar fisicamente aqueles que se pusessem no caminho da revolução.
Confesso que tinha medo de morrer, mas principalmente de sofrer.

Então, um dia, aos 30 anos de idade, descobri que a minha alma era um cenário mais desolado que uma igreja destruída por um incêndio. Descobri que não fazia outra coisa a não ser mentir para mim mesmo e para todos aqueles que me amavam. Comecei a pedir perdão, começando por aquele amigo que hostilizei.

E peço perdão até hoje. Isso inclui você, que lê esta crônica.

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