Como disse, sabiamente, o escravo liberto do senador romano PublioTerêncio: “Sou humano, nada do que seja humano pode ser-me estranho”. O poeta não divagava. Sabia na carne o que não distingue nobres, plebeus e escravos na essência da criatura humana. Terêncio sabia bem mais do que as sombras da aparências enganam. Nada do ser humano é estranho a sua essência.
Por sua dramaturgia e poética satírica percebe-se, claramente, o seu ceticismo quanto aos valores morais de uma sociedade que já se pronunciava decadente. Em declínio não só da sua fé nos deuses que teriam ungido Roma como o tabernáculo exclusivo de um povo eleito – mitologia na qual ele evidentemente não acreditava – mas nos costumes que haviam se perdido nas campanhas militares que expandiram seu império: e os revelaram mundanos.
Falta-nos essa lucidez de Terêncio. Sobretudo seu ceticismo quanto aos deuses humanos que a mitologia moderna, moderníssima tenta recuperar do Olimpo para instalar em Brasília. Somos uma nação carente desses deuses desde que Getúlio Vargas suicidou-se no palácio do Catete. (Só no Brasil um deus tirou sua própria vida para ser amado e jamais esquecido pelos órfãos que ele deixou como seu salvador.)
É verdade, insofismável, que um deus suscitou-se para preencher esse vazio: Lula. E até que ele superou as expectativas. Ninguém foi mais capaz de herdar o martírio no qual se imolou o deus que tanta carência nos deixou o seu precursor.
Politicamente mais maduro e muito melhor aconselhado, no entanto, Lula já mandou avisar que não vai sucumbir, como Getúlio Vargas, à sanha dos seus inimigos. Só vai ao seu enterro se for carregado. E antes disso vai meter o juiz Sérgio Moro na cadeia.
Isso mostra que o nosso povo evoluiu muito em nada mais do que duas gerações de brasileiros. Por isso precisamos mudar o provérbio que tanto nos humilhava. Em vez de “governo” digamos: CADA POVO TEM O DEUS QUE MERECE.