• Paulo G. M. de Moura
  • 06/10/2018
  • Compartilhe:

A FAIXA PRESIDENCIAL AO ALCANCE DA MÃO DE BOLSONARO

Prognosticar resultados eleitorais é uma tarefa difícil e arriscada. Conhecer teoria política, saber interpretar pesquisas de opinião e ter alguns anos de experiência sempre ajudam a qualificar o olhar do analista, mas há uma inevitável pitada de feeling que se agrega aos demais fatores para ajudar a explicar quando se acerta a linha de análise de uma eleição.

Segundo O Antagonista a consultoria Eurásia acaba de prognosticar em 20% as chances de Bolsonaro vencer no primeiro turno. A Arko Advice cravou 30%. Não gosto de expressar em percentuais essa probabilidade e não faço ideia como calculam isso, pois além das pesquisas há elementos qualitativos e subjetivos que influenciam minha linha de análise. Com base nesse ponto de vista, creio que “peguei essa eleição pelo rabo”, isto é, consegui captar a lógica de sua dinâmica. Por coerência com os argumentos publicados em meus artigos que avalio que há sim grandes probabilidades de Bolsonaro se tornar presidente no dia 7 de outubro de 2018. Perdoem-me as longas citações, mas elas poupam o leitor de ir aos links de cada artigo, a menos que queira lê-los na íntegra.

Em 05/07, no artigo intitulado “Uma eleição disruptiva” (http://emaconteudo.com.br/2018/07/05/uma-eleicao-disruptiva/), afirmei: “Quais são as novidades no cenário eleitoral: 1 – As mídias sociais deslocaram o poder das organizações tradicionais para as mãos de indivíduos e movimentos cívicos de novo tipo, que nada têm em comum com os ativistas e “movimentos sociais” do passado, todos cooptados pelo Estado ao longo dos 13 anos de governos petistas. (…) 2 – O PT é o segundo partido com maior acesso ao fundo eleitoral. Lula, segundo as pesquisas, pode alavancar Haddad como seu candidato ao patamar de 11%, acima de Ciro Gomes que pontua com cerca de 7%, e encostando em Marina, que não tem partido (a Rede é um gelatina que desanda na eleição), não tem fundo partidário e nem tempo de TV e não usa as mídias digitais de modo profissional. Todos esses fatores recomendam que não se deva menosprezar o potencial eleitoral do PT. 3 – Nos casos do Brexit, da eleição de Trump e do recente plebiscito sobre o acordo de paz com as FARC na Colômbia os eleitores fizeram questão de contrariar as “análises” predominantes na mídia, que é nitidamente enviesada à esquerda. Um eleitor com esse tipo de sentimento tende a manter distância e frieza diante da eleição, mas está atendo e crítico para escolher seu candidato na última hora, criando um movimento massivo e rápido de convergência em direção ao escolhido. Nesse contexto, o ativismo digital da rede real dos seguidores de Bolsonaro, cujo discurso está em sintonia com esse sentimento do eleitor é um ativo que nenhum dos demais competidores têm, ainda que contratem as melhores agências de publicidade para fazer suas campanhas nas mídias digitais em cima da hora, como não se deve fazer, mas, como estão fazendo. 4 – Jair Bolsonaro é o candidato que possui os maiores índices de engajamento nas mídias sociais. Seus 13% de manifestações espontâneas de voto nas pesquisas de todos os institutos constituem-se numa força organizada, monolítica e descentralizada mais poderosa de qualquer partido político. Bolsonaro vem operando bem, também, na dimensão tradicional da política (coligação com tempo de TV, articulação com parlamentares individualmente; alianças e articulações com evangélicos e outras forças sociais, conquista da confiança de setores do empresariado). Em janeiro desse ano eu mesmo aventei a hipótese de que Bolsonaro tivesse batido no seu teto e pudesse vir a cair nas pesquisas. Não foi o que aconteceu. As análises tradicionais partem do pressuposto de que, quando começar a campanha na TV, o candidato do centro (quem?) crescerá e Bolsonaro, devido ao seu discurso e postura, não apenas não crescerá em direção ao centro, como perderá parte dos eleitores no segmento que está além dos 13% de seu voto espontâneo. Todos os argumentos aqui listados sugerem que há grandes chances de esse tipo de análise dar com os burros n’água.”

Em 09/08, no artigo intitulado “O divórcio do eleitor de direita com o PSDB” (http://emaconteudo.com.br/2018/08/09/o-divorcio-do-eleitor-de-direita-com-o-psdb/), afirmei: “Para efeitos de análise, o que importa é que hoje o quadrante direito do espectro político está ocupado e com cara própria, seja através da candidatura de Bolsonaro, seja do Partido Novo ou das lideranças políticas de movimentos como o MBL que optaram por uma estratégia de ocupação de espaços dentro das legendas tradicionais. Ou seja, saíram todos debaixo do guarda-chuva do PSDB, partido em quem antes votavam exclusivamente por falta de opção mais à direita. Libertaram-se da incômoda situação de terem que votar num partido de centro-esquerda para evitar o mal maior representado pelo PT. (…) Aliado com o centrão e tendo conseguido a maior fatia do tempo de TV e do fundo partidário, Alckmin vende como trunfo o que pode ser uma enorme vulnerabilidade. Afinal sua aliança representa tudo o que o eleitorado brasileiro passou a rejeitar com os escândalos de corrupção. Ou seja, o PSDB atraiu para si os olhares desconfiados e descontentes não apenas do eleitorado ideologicamente de direita antes referido, mas da imensa maioria dos eleitores que manifestam rejeição à velha política e que hoje desaguam intenções de voto em Bolsonaro e no não-voto (abstenções, brancos, nulos e indefinidos). Esse é o produto que Alckmin representa. O esforço de seus marqueteiros consistirá em esconder tudo isso numa embalagem dourada e reluzente na tentativa de convencer esse eleitorado de que a mudança passa por não mudar nada. Muito tempo de TV pode ser tornar uma vulnerabilidade nesse contexto. Especialmente porque Alckmin não joga sozinho e porque há vida inteligente no campo adversário. E, também, porque nas mídias sociais o processo de desconstrução da imagem de uma figura pública acontece muitas vezes de forma espontânea através de memes e vídeos criativos e com alto poder de corrosão e viralização.”

Em 08/09, no artigo intitulado “Um outro Bolsonaro é possível?” (http://emaconteudo.com.br/2018/09/08/um-novo-bolsonaro-e-possivel/) , afirmei: “Na eleição de 2014, Marina Silva assumiu a candidatura presidencial após a morte de Eduardo Campos e em duas semanas saltou para o segundo lugar nas pesquisas em trajetória ascendente que poderia levá-la à vitória não fosse o ataque vil do PT acusando-a de tirar o prato de comida da mesa dos pobres se fosse eleita. A condição de Bolsonaro é politicamente mais favorável ainda a ele, pois ele mesmo é a vítima sobrevivente de um atentado e convalesce, mas recuperando aos poucos a possibilidade de falar ao povo direto do leito do hospital, como aliás arriscadamente já o fez. Dadas as circunstâncias, a lógica sugere que Bolsonaro cresça nas pesquisas, não sendo despropositado imaginar-se que se aproxime da possibilidade de vencer no primeiro turno.”

Em 29/08, no artigo intitulado “A eleição de 2018 e o efeito capote” (http://emaconteudo.com.br/2018/08/29/a-eleicao-2018-e-o-efeito-capote/), afirmei: “Tornou-se lugar comum afirmar que as pesquisas mostram um eleitorado desconectado do debate político. No entanto, o cenário político do país (corrupção, descrédito da classe política, falência do Estado, proeminência de candidatos a presidente percebidos como “antipolítica”), assim como, as manifestações de eleitores reveladas em pesquisas qualitativas sugerem que esse eleitorado do chamado “não-voto” está atento ao debate. É observador, crítico e está à procura de um nome. E, num determinado momento, vai escolher um candidato e convergir rapidamente e em massa para ele provocando um “efeito capote”. (…) Sob esse ponto de vista, não vejo como imaginar que Alckmin possa chegar ao segundo turno, pois, tal como o PT, o PSDB também encarna tudo aquilo que o eleitor rejeita. E piorou sua situação ao aliar-se ao centrão. O PSDB padece de hemorragia política e corre o risco de tornar-se irrelevante nessa eleição. Se esta análise está correta, e, de fato, acontecer o que chamamos aqui de “efeito capote”, a probabilidade maior é que o contingente de eleitores do bloco do “não-voto” migre para Bolsonaro e Amoêdo, não sendo descartável, a depender do tamanho da onda, que essa eleição se conclua em primeiro turno. Não é o mais provável, mas não é impossível. Havendo segundo turno, por coerência, o nome mais provável a ocupar a vaga no quadrante oposto é o do candidato de Lula.”

Em 15/09, no artigo intitulado “Espiral do silêncio e voto feminino em Bolsonaro (http://emaconteudo.com.br/2018/09/15/espiral-do-silencio-e-voto-feminino-em-bolsonaro/), afirmei: “Minha hipótese, em consonância com a análise que fiz em outro artigo (A eleição 2018 e o efeito capote – http://emaconteudo.com.br/2018/08/29/a-eleicao-2018-e-o-efeito-capote/) é a de que podemos estar em vias de testemunhar outra ruptura da espiral do silêncio em torno do voto em Bolsonaro e que, boa parte dessa virada virá do voto feminino no candidato. (…) Bolsonaro tem, entre as mulheres, um grupo organizado e politicamente mobilizado nas ruas e nas mídias sociais respeitável tanto pelo número como pela qualidade das ativistas que têm se pronunciado em vídeos nas redes em defesa do seu candidato. Assim como no comportamento de compra, as mulheres diferem dos homens na hora de definir suas escolhas políticas. Têm um estilo mais light, são menos impulsivas, mais cuidadosas e conservadoras, não são agressivas, argumentam racionalmente, analisam variáveis e possiblidades e pensam antes de escolher. Mas, no momento em que se decidem, passam a ser influenciadoras nos seus círculos de relacionamento. (…) O antipetismo é o maior partido do Brasil hoje e o crescimento de Haddad incentiva a migração do voto útil em Bolsonaro para impedir o perigo maior. Nessas horas quem quer tirar o PT busca o mais forte e capaz de fazer isso. Na guerra de rejeições a do Bolsonaro pode cair e a do PT, subir.”

Em 18/09, o artigo intitulado “O segundo turno já começou” (http://emaconteudo.com.br/2018/09/18/o-segundo-turno-ja-comecou/), afirmei: “Protegido pelo escudo da falsa candidatura de Lula, Haddad, então desconhecido, não carregava a carga da rejeição ao petismo. Assumindo a linha de frente após o veto do TSE à candidatura de Lula, Haddad começou a atrair o voto petista e, ao mesmo tempo, a rejeição ao petismo. Uma armadilha inescapável. Dessa forma confirmou-se também a possibilidade que antecipamos, de que essa eventual polarização favoreceria o voto útil à esquerda e à direita em direção aos dois polos mais fortes da disputa. Isso tornou a pregação precipitada do voto útil em outros candidatos um verdadeiro tiro no pé, pois, ao introduzirem o argumento no debate, catalisaram o deslocamento de eleitores antipetistas para Bolsonaro, o nome mais forte para impedir o mal maior. (…) Para entender-se como a coisa funciona, devemos olhar para o filme e não para a foto. Hoje, as duas tendências dominantes no tabuleiro da disputa são, por um lado, o crescimento da candidatura Haddad, mas também de sua rejeição, e, por outro, o crescimento da candidatura Bolsonaro e a redução da sua rejeição. As urnas sorriem para Bolsonaro e o segundo turno já começou. A possibilidade de sua vitória em primeiro turno tornou-se real. Já não está mais no radar. Está no horizonte.”

Em 20/09, no artigo intitulado “Quem botar mais gente na rua será presidente” (http://emaconteudo.com.br/2018/09/20/quem-botar-mais-povo-na-rua-sera-presidente/), afirmei: Num contexto de polarização como o que vem se configurando, não é de todo improvável que o PT consiga mobilizar segmentos da esquerda dos grandes centros urbanos que temem um governo Bolsonaro. No entanto, as evidências empíricas demostram que mesmo nesse contexto, o poder de mobilização de Bolsonaro é muito, mas muito superior. Que evidências empíricas? Amparo-me em todo o processo de mobilização social que desembocou no movimento do impeachment de Dilma Rousseff e no poder de mobilização da base de Bolsonaro. (…) No campo oposto temos Bolsonaro. Desnecessário evidenciar seu poder de mobilização espontânea. Basta ver os vídeos de sua campanha anteriores ao atentado e seu poder de fogo imbatível, descentralizado e voluntário nas mídias sociais. Quem conhece os movimentos de rua que protagonizaram o impeachment sabe que hoje a esmagadora maioria das lideranças que puxaram aquelas mobilizações, exceto talvez pelo VPR que ainda resiste com Amoêdo, está com Bolsonaro. O MBL, que ensaiou voo solo, vem manobrando o leme gradualmente para aderir à onda Bolsonaro. Além dessa preferência por Bolsonaro entre os movimentos cívicos, há uma imensa massa de cidadãos comuns cuja mobilização espontânea vai muito além do alcance desses movimentos organizados. Por fim, no entorno desses, há o predominante sentimento antipetista que hoje, se constitui no “maior partido” do Brasil. Eis a locomotiva e seus vagões. Todas as condições estão dadas, portanto, para que a onda Bolsonaro que todos os institutos de pesquisa estão apontando se encontre com esse sentimento dominante formando o amálgama da vitória eleitoral amparada na maioria.”

Por fim, me perguntará o leitor, se todos esses prognósticos estão se confirmando, por que então a pesquisa independente por mim coordenada não registrou o “tsunami” pró-Bolsonaro que está em curso nesse momento e pode levá-lo a vencer no primeiro turno?

O campo da nossa pesquisa ocorreu entre 28/9 e 3/10, e coincide, na margem de erro, com as pesquisas Ibope e Datafolha que fizeram coleta de entrevistas em torno do dia 3/10. O gráfico da pesquisa da Ipespe/XP Investimentos que ilustra esse artigo, mostra claramente o capote começando após essa data. Portanto, o fenômeno do capote que previ com muita antecedência começou após o campo da nossa pesquisa.

Por fim, deixo aqui os links de dois posts de Felipe Martins, a quem considero um dos melhores analistas de pesquisas no Brasil hoje, em seu Twitter, comentando nossa pesquisa: (https://twitter.com/filgmartin/status/1047908639317643264) “Conheço os responsáveis pelo Instituto Amostra e sei que são pessoas honestas e muito competentes. Os números da pesquisa estão dentro do esperado para o intervalo da coleta de dados (de 28/09 a 03/10): eles nos dão a média da última semana mais do que o retrato do momento atual.” E (https://twitter.com/filgmartin/status/1047909784601726976) “A divulgação dessa pesquisa, contratada e realizada por pessoas independentes, é pedagógica e mostra que as pesquisas, mesmo com limitações, captam tendências e precisam ser consideradas em qualquer análise. A grande questão é que boas análises qualitativas alcançam mais longe.”
Subscrevo.

* Paulo G. M. de Moura – Cientista Político