O documentário da Netflix “O dilema das redes” parte de um fato verdadeiro, mas conduz o espectador para uma armadilha. Para quem ainda não percebeu, o documentário é apenas mais uma peça de propaganda dos grupos progressistas radicais contra o avanço do conservadorismo mundo afora. Os tons avermelhados do roteiro não passam despercebidos e revelam o comprometimento do filme com a nova obsessão progressista: controlar as redes sociais.
A peça parte de uma premissa verdadeira, que é o fato de as redes sociais ocuparem cada vez mais o tempo das pessoas, tornando-se uma espécie de vício para muitas delas (interessante notar que o documentário compara as Big Techs a traficantes de drogas, visto que também chamam os seus clientes de “usuários”). Estudos já mostram a relação entre o uso intensivo das redes e problemas como ansiedade, depressão, suicídio, entre outros males que afligem especialmente os mais jovens, inclusive crianças. Até aí o documentário funciona como um importante alerta, principalmente para os pais, no sentido de observarem o comportamento dos seus filhos e cuidarem para que não centrem as suas vidas em likes ou dislikes nas redes. Mas a partir desse ponto, o documentário sofre uma inflexão para se transformar em instrumento de propaganda política numa cruzada contra as redes sociais.
Para quem duvida, repare que o pano de fundo do roteiro se restringe a temas caros às ideologias mais à esquerda, como o meio ambiente, sugerindo-se serem fake news as informações que refutam, por exemplo, a tese do aquecimento global. O documentário também sugere que movimentos como os protestos em Hong Kong são fruto de uma manipulação orquestrada nas redes pela extrema direita, e não uma reação natural e espontânea de pessoas livres contra as investidas da ditadura comunista chinesa. O documentário também usa imagens dos presidentes Donald Trump e Jair Bolsonaro para ilustrar a suposta interferência das redes sobre o resultado de eleições legítimas, deixando evidente que os diretores só consideram indevida a manipulação quando o escolhido do povo é um conservador.
Agora, a evidência mais eloquente do viés ideológico do documentário reside na afirmação de que as redes sociais manipulam as pessoas e, por isso, representam uma ameaça para a democracia, razão pela qual devem ser controladas pelo Estado.
Não se ignora que as redes sociais têm o poder de induzir os seus usuários, na medida em que os seus algorítimos controlam de certo modo o fluxo de informações. Isso, no entanto, não é nenhuma novidade. Desde que o mundo é mundo, pessoas, partidos e ideologias tentam manipular dados e informações para se beneficiarem. A propaganda comunista soviética é um exemplo bem sucedido de manipulação da opinião pública para esconder o genocídio experimentado pelo povo russo desde a implantação forçada do comunismo em 1917. O mesmo se pode afirmar da propaganda do regime totalitário chinês, disseminada até hoje por veículos de comunicação no ocidente para ocultar as violações às liberdades e aos direitos humanos perpetradas pela ditadura comunista. A chamada “grande mídia” até hoje publica apenas o que lhe convém, seja por motivações políticas ou econômicas. A diferença é que as redações dos noticiários dessa mídia tradicional são dominadas por jornalistas comprometidos não com fatos, mas com narrativas progressistas. Daí porque a manipulação da opinião pública nunca foi uma preocupação dos intelectuais esquerdistas. Essa preocupação somente surge no momento em que as redes sociais quebram o monopólio da difusão de (des)informações pela mídia tradicional. Muito conveniente, não?
Os diretores do documentário também acusam as redes de estimularem a polarização do debate político. A preocupação não é exatamente com a polarização, até porque há tempos os progressistas incitam a divisão da sociedade como estratégia para conquistar e manter o poder. É assim quando colocam patrões contra empregados, brancos contra negros, homens contra mulheres, heterossexuais contra homossexuais, filhos contra pais, jovens contra idosos e por aí vai. De novo, o que preocupa esses radicais é perda de espaço e de protagonismo político. De fato, antes das redes sociais, não havia polarização alguma, simplesmente porque o discurso progressista era hegemônico. As opções no cardápio político tinham uma cor só, mudando apenas a tonalidade. Com a quebra do monopólio das informações, as “tias do whatsapp” começaram a difundir ideias conservadoras e, para desespero dos radicais, as pessoas voltaram a valorizar instituições desprezadas pelo “progresso”, como a família, a religião e a educação tradicionais, pilares da nossa civilização. Portanto, aquilo que a Netflix chama de “polarização” nada mais é do que um contraponto ao um discurso totalitário que até bem pouco tempo atrás era difundido sem nenhuma crítica.
A questão do uso intensivo das redes sociais realmente é um problema sério e que merece ser discutido em sociedade. Porém, a Netflix não está preocupada com a saúde das pessoas. O objetivo do documentário é convencê-lo de que as redes sociais devem ser controladas pelo Estado a bem da democracia. Não se deixe iludir por essa falácia. Se o controle estatal sobre a internet, as redes sociais ou qualquer outra coisa fosse garantia de democracia, China, Cuba e Coréia do Norte seriam paraísos democráticos na terra, já que nesses países o Estado controla tudo com mãos de ferro, inclusive as redes sociais. O controle das redes pelo Estado é só mais uma medida totalitária para garantir que o controle sobre a opinião pública continue sendo um privilégio exclusivo dos progressistas. Não caia nessa armadilha.
Leandro G.M. Govinda é Promotor de Justiça em Santa Catarina e aluno do Mestrado em Direito na Universidade George Washington em Washington D.C. Formou-se em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina e especializou-se em Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina. Foi pesquisador do CNPq, Técnico e Auditor-Fiscal da Receita Federal e Procurador da Fazenda Nacional. Ex-Professor da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) e da Escola do Ministério Público.