Percival Puggina
Nos dias de mormaço que já ficaram para trás, assisti a três filmes muito interessantes no Prime Video. Em “Uma mulher contra Hitler” conheci a história e os eloquentes exemplos de solidez moral da jovem mártir alemã Sophie Scholl. Seus vários diálogos com o interrogador sob o tacão da Gestapo são instigante defesa de princípios e valores. Às noites, no silêncio pétreo da cela, a mocinha sofre antevendo o que poderia acontecer com seus pais por ter ela cometido o gravíssimo delito de usar a palavra escrita em defesa da liberdade de expressão... Como não pensar em nosso país, depois de assistirmos, aqui, o que desgraçadamente temos assistido?
As outras duas preciosidades do tórrido veraneio: o filme sobre a obra de Judith Kerr, “Quando Hitler roubou o coelho cor de rosa”, e “A conferência”, um quase documentário sobre a reunião do alto comando nazista ocorrida em Wannsee para tratar da “solução final” da “questão judaica”. Nas duas obras, a degradação do arbítrio totalitário, a brutalidade do Estado e a superioridade moral de suas vítimas. Relembro o que afirmei no título do meu vídeo da semana passada: “os príncipes de Machiavel estão no Inferno de Dante”.
Quando tantos missionários do absurdo usam seus poderes no Estado para lutar contra fantasmas que brotam das próprias narrativas, eu me pergunto se é o PT que instrumentaliza o Supremo. Ou se é o Supremo que instrumentaliza o PT. Ou se, em algum nível, eles se confundem. Ou, ainda – suprema ironia –, se vamos descobrir, ao final, que as raposas felpudas do Senado instrumentalizavam os dois em benefício próprio.
Como cidadão que reconhece a importância das instituições de Estado e o valor do papel reservado ao STF pela Constituição, qualquer das quatro situações me causa indigestão cívica. Tornou-se sombria a realidade nacional a partir do momento em que a Corte decidiu se tornar um poder que atua decisivamente no cenário político e eleitoral com objetivos e estratégias.
A partir desse momento, o ativismo que já era observado em setores do Poder Judiciário foi ficando cada vez mais parecido, no STF, com o petismo que viabilizou as indicações de 7 dos seus 11 ministros, graças à convergência das convicções, à identidade das conveniências e às características dominantes no petismo. Entre estas, o uso abusivo do poder quando dele dispõe e a odienta desfiguração da imagem de quem o antagoniza, tão nítidas, agora, na conduta da Corte pela expressão de seus membros mais loquazes.
É bom não esquecer que o PT entrou para o pleito de 2022 disputando a eleição no fundo do poço das quatro sucessivas gestões petistas. Faltava-lhe, por isso, credibilidade para uma oposição que paralisasse o adversário. Tornou-se visível, então, que o núcleo da ação oposicionista se deslocou para o STF, de modo exitoso, pela via de uma judicialização militante empreendida pela bancada de extrema esquerda no Congresso. Acolhidas, as demandas transformaram o Supremo numa verdadeira esponja de prerrogativas que só podia dar no que deu.
O passaporte para os excessos que passaram a constranger as consciências bem formadas foi fornecido pela “excepcionalidade das circunstâncias”. No entanto, circunstâncias excepcionais exigem homens excepcionais e não medidas excepcionais ou regimes de exceção.
Tornou-se impossível, para quem escreve, dizer que não percebe o STF e o PT agindo em perfeita sintonia para remover do quadro político as mais destacadas e eleitoralmente promissoras figuras da oposição. Cada um com seu inquérito, cada um com sua guilhotina armada e uma bacia no chão, à espera. Nem frei Gilson escapa! As analogias nacionais com o totalitarismo presente nos três filmes que mencionei são inevitáveis: inquéritos, ameaças e danos às famílias, passaportes tomados, prisões para intimidar, transporte obrigatório e enganos para o degredo, total desabrigo de direitos fundamentais e práticas de censura apresentadas como elevada contribuição do Estado ao bem estar social e à democracia.
A sensatez exige um Parlamento politicamente ativo e um Judiciário inerte; a mediocridade nos legou um Parlamento inerte e um judiciário politicamente ativo. Insisto: momentos excepcionais exigem pessoas excepcionais; regimes de exceção geram momentos excepcionais.
Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.
Afonso Pires Faria - 13/03/2025 12:50:49
Sábias palavras. Temos que ter muito cuidado para usarmos as palavras certas em momentos distintos. Gostaria eu de ter toda a sua educação para lidar com certas gentes e instituições. Parabéns.celso Ladislau Kassick56ncx - 13/03/2025 11:06:27
O " MODELO; MODELA " QUE SE PODE ESPERAR DESSE MODELO? NOSSA ( REPUBLICA ) É ESTRUTURA DE GOVERNANÇA FADADA AO FRACASSO E A CORRUPÇÃO! - AS MULTI-NACIONAIS COM SUAS EMPRESAS ESPALHADAS PELOS MAIS DISTANTES RINCÕES DESSE MUNDO SÃO EXEMPLOS DE EFICIÊNCIA E ECONOMIA DE COMANDADO. PENSE! : - VOTO C/PESO PONDERADO, EXIGÊNCIA TÉCNICA AOS CANDIDATOS AS FUNÇÕES, MANDATOS COMPESO PROPORCIONAL A REPRESENTAÇÃO INDIVIDUAL, EXTINÇÃO DE PARTIDOS! A ESTRUTURA GOVERNAMENTAL DO BRASIL É RIDÍCULA!