A Grécia está mostrando ao mundo o que acontece com os Estados perdulários que gastam riqueza não produzida e buscam manter seu padrão de vida usando a poupança alheia. Por esse caminho, formam-se dívidas dotadas de uma extraordinária capacidade de multiplicação. Um dos fatores determinantes dessa multiplicação leva o nome antipático de taxa de juros. Outro consiste em tomar dinheiro novo para pagar dívida velha. Outro ainda é a irresponsabilidade fiscal que leva governantes a não enquadrarem a despesa pública na capacidade contributiva da sociedade.
Países quebram. Leva bom tempo para isso acontecer, mas a estrada acaba. Um dia, não há mais pista para rodar. No horizonte só se avista, então, terra inóspita, mata cerrada, montanhas e rios sem pontes. É a situação grega, um país que deve quase dois anos inteiros de seu decrescente PIB e já perdeu 400 mil jovens para outras oportunidades de trabalho e de vida no exterior. Os gregos creram que seu ingresso na Zona do Euro era um cartão de crédito ilimitado para implantar no país um estado de bem-estar social. Com o dinheiro dos outros. E isso, simplesmente, não existe no mundo real.
Países quebram. No mundo irreal, os políticos que seduziram os gregos e deles colheram votos com a ideia de um Estado provedor, benfazejo, inexaurível em sua prodigalidade, trataram de convencer a opinião pública de que o resto do mundo tem o dever de subsidiá-los com novos empréstimos. A Grécia deve 360 bilhões de euros, não conseguiu pagar uma parcelinha de 1,5 bilhão (ou seja, 0,5% do que deve) e segundo os cálculos dos principais credores (ministros da Zona do Euro), pode estar precisando de mais 83 bilhões de euros. Além de ser difícil estabelecer um consenso sobre esse atendimento, muito mais difícil será obter acordo interno na sociedade grega e em seu círculo de poder para as duríssimas e necessárias medidas de contenção de gastos, aumento de tributos, venda de patrimônio, redução de salários e pensões.
Países quebram. Estados da federação quebram. Durante a campanha eleitoral de 2014 no Rio Grande do Sul, alguns analistas denunciavam hecatombe fiscal em que se constituiu o governo Tarso Genro. Ele estava deixando a seu sucessor uma situação de insolvência que, em breve se tornará nacionalmente conhecida. Perante tais acusações, os políticos petistas afirmavam em orgulhosos rompantes: "Nós não nos submetemos a essa lógica neoliberal". O que chamavam lógica neoliberal era, simplesmente, o zelo pelos recursos do contribuinte, contendo-os nos limites da receita, conforme impõe a lei de responsabilidade fiscal.
O governo petista no Brasil, indo pelo mesmo caminho das pedaladas e da gastança desmedida, jogou-nos numa crise pela qual não precisaríamos estar passando. Vínhamos bastante bem. Nossos governantes dos últimos 13 anos, porém, gastaram demais, fizeram loucuras demais, jogaram dinheiro fora e mandaram dinheiro para fora, torraram reservas demais, locupletaram-se demais. Foram longe demais. E agora chamam golpistas quem busca uma saída política e constitucional para que não sejamos mais golpeados por tanto desmando, incompetência e irresponsabilidade.
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.
André Carvalho - 15/07/2015 04:31:45
Quanto à Grécia, o negócio é mesmo sair do Zona do Euro e começar tudo do zero. A Argentina, embora teime em errar - ainda bem para nós (aliás, quase 30% de miseráveis no pais "europeizado", orgulho da ignorante claque rio-grandense de alma castelhana, qualquer semelhança não parece ser mera coincidência...) -, não morreu, mesmo com calotes. A vida fica mais difícil, mas não acaba. Vale para o país o que vale para nossa vida: fazer o dever de casa, cortar gastos, não se gastar mais do que se ganha... Boa sorte, Grécia!Genaro Faria - 14/07/2015 14:08:13
Deve ser muito difícil, para uma grande parcela dos seres humanos... ser humano. E não é nada fácil mesmo. Se nos concebermos como o único animal a quem a natureza dotou da consciência de que não passamos de um animal, convenhamos que qualquer macaco é digno da nossa inveja. Tanto que nenhum deles comete suicídio nem precisa tomar remédio para dormir. Nem precisa inventar modelos racionais pelos quais se um macaco cismar que é gente será liminarmente eliminado. Nenhum macaco pode ter o direito de pensar que não é macaco. Eventualmente, essa norma haverá de implicar um ou outro sacrifício capital. Mas o que importa é a integridade do bando. Para quem? Não sei. Talvez para uma abelha rainha decaída, que a ver aquele bando sem dono resolveu botar ordem no galinheiro.Genaro Faria - 14/07/2015 07:26:57
Mas as paixões cegam nossos olhos E a luz que a experiência nos dá É de uma lanterna na popa Que apenas ilumina as ondas que deixamos pra trás. (Samuel Taylor Coleridge) Antes de nos debruçarmos sobre a crise da Grécia e de suas eventuais consequências para a moeda comum europeia - o euro - seria de melhor alvitre questionarmos a gênese dessa união continental. O Mercado Comum Europeu nasceu de um acordo entre a França e a Alemanha sobre o ferro e o carbono, duas riquezas minerais que a natureza dividiu entre as duas margens do rio Reno. E que foram objeto de disputa entre os dois países desde que a produção siderúrgica tornou-se uma das matrizes do desenvolvimento industrial, pari passu com a produção energética. Era vital produzir aço e petróleo para os países industrializados que competiam por mercados para os seus produtos. O acordo sobre o ferro e o carbono - a liga do aço - resolveu a disputa que tantas vezes antagonizou as duas potências industriais de cada margem do Reno. Por que, então, não estender esse acordo na abrangência de um tratado continental? A União Europeia foi a resposta a essa pergunta. Equivocada. A Grécia é apenas o elo mais fraco dessa corrente que sequer une alemães e franceses quanto a manter sua estrutura a qualquer preço. Como num casamento, o preço da ruptura costuma cobrar mais caro do que sua manutenção. É essa dúvida que ainda mantém a Grécia respirando acima da linha d'água. De canudinho, feito jacaré em temporada de caça. Mas o homem não aprende nada com a História. Nem mesmo a lamentar os erros nos quais incorreu. Não fosse assim, a Guerra da Secessão teria ensinado aos europeus que estados industrializados não se harmonizam com estados tecnologicamente atrasados. Essa discrepância sempre implicará um confronto inevitável. Porque um lado haverá de submeter o outro inevitavelmente. Somos tão pródigos nessa cegueira que às vezes nem concedemos ao tempo um mínimo de intervalo para ele suspirar antes de apagar nossa memória. Como foi o caso da queda do Muro de Berlim. O mundo ainda festejava a derrubada daquele ícone do império soviético quando o ditador Fidel Castro - de uma Cuba que ficou órfã de pai e mãe - procurou o camarada Luis Inácio Lula da Silva para "recuperar aqui (na América Latina) o que foi perdido nos leste europeu (a União Soviética)". E assim nasceu o Foro de São Paulo. E não é que eles conseguiram recuperar "a História perdida"? Àquela época, 1990, Lula não passava de presidente da CUT e deputado federal. E Fidel era uma espécie de leão aposentado do Circo de Moscou. Como foi que essa dupla tomou de nós o Brasil e já conquistou mais da metade da América Latina? Mais da metade da "Grande Pátria" que foi perdida no leste europeu? Foi assim porque nós não aprendemos nada com a História. E com isso contam as minorias motivadas ideologicamente, que sempre conseguiram impor sua agenda sobre a imensa maioria desavisada de que está prestes a perder sua liberdade. Diante dessa minoria, a maioria sempre foi e ainda é irrelevante. Se nove entre cada dez brasileiros rejeitam o governo o que importa? Nada. Importante é aquele um, aquela unidade sem valor que acrescenta zeros que lhe dão a força de dezenas, centenas, milhares e até milhões de pessoas motivadas por uma ideologia. Foi assim que sucumbiu a vontade da maioria na Rússia, na Itália, na Alemanha, no Japão. E está sucumbindo aqui, na Argentina, na Bolívia, na Venezuela. A Grécia? Não chorem por ela. A Grécia ainda tem sua importância no tabuleiro da geopolítica. Chorem por nós, que nem somos mais identificados como o "cone sul".Gustavo Pereira dos Santos - 14/07/2015 03:19:56
Eu entendo desse assunto: i) quebrei feio em 1998 por minha exclusiva culpa. Cheguei a dever para muitos bancos (8, se não estou enganado), além de parentes e amigos. Ataquei a causa do problema, gastar mais do que ganha, me curei, o remédio foi amargo, levei uma década para me recuperar, hoje devo zero pila. ii) A Alemanha levou mais de 80 anos para pagar a dívida da 1ª guerra mundial, que deu origem a 2ª guerra mundial. Pagou a dívida da 2ª guerra mundial (com desconto, o que é normal). Conseguiu alcançar a liderança da Zona do Euro graças ao povo trabalhador e as políticas corretas. iii) Sair da merda dói e leva tempo. O comuna grego aceitou medidas mais duras que o antecessor, depois de enganar o povo com discurso demagógico, like a ANTA em 2014. A Grécia não terá outra alternativa, no máximo conseguirá um descontinho. iv) A partir da constituição socialista, o governo Yeda foi o único que gastou menos do que arrecadou. Germano também foi comedido. Os petistas e pedetistas botaram pra quebrar.Marcos TC - 13/07/2015 23:40:02
Caro Puggina, vamos usar a mesma lenga lenga dos petralhas. As doações das empreiteiras foram dentro da lei ? O golpe também é dentro da lei .Sérgio Alcântara, Canguçu RS - 13/07/2015 21:48:47
Obrigado, Professor Puggina, pela determinação em partilhar lucidez com uma sociedade tão enredada na teia ideológica lançada pelo ardiloso "trabalho" dos "agentes da transformação", que se utilizam de meios lícitos e ilícitos; leais ou desleais. Meu sonho é ver mais pensadores de sua envergadura, dispostos a agir pela causa da liberdade e da democracia.Odilon Rocha - 13/07/2015 20:09:47
Parabéns, Puggina! Belo artigo elucidativo que retrata muito bem o resultado da irresponsabilidade fiscal, típico de governos socialistas. Para consertar, a situação fica complicada e á dolorida. E ainda por cima tem gente braba com a Gerente alemã. Bradam: Durona! Falta de coração! É impressionante!