• Percival Puggina
  • 06/12/2023
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Os filhos dos outros

 

 

Percival Puggina

         Nosso sistema eleitoral proporcional afasta o eleito do eleitor e até o voto dado a alguém que não se elegeu migra desse candidato para sua legenda, onde outra pessoa o aproveita... É ótimo para gerar desconexão e descompromisso dos candidatos com seus eleitores, mas é péssimo para o espelhamento da vontade dos cidadãos, inerente às democracias representativas. Nossa cultura política soma omissão, desatenção e esquecimento. Como consequência, a imensa maioria não acompanha a vida pública.

Com exceções sempre raras, os políticos não têm interesse em mudar esse sistema feito por encomenda para lhes proporcionar total liberdade. Um congressista pode votar contra o interesse dos cidadãos em temas como liberdade de expressão, propriedade, tributos, tamanho do Estado, porque tem certeza de que esse fato não chega ao conhecimento de quem nele votou.

Conscientes disso, os partidos de esquerda tratam de se tornar orgânicos estruturando-se na sociedade através de inúmeros movimentos. Esses organismos, denominados “coletivos”, são mobilizados em torno de pautas que reativam a luta de classes para suposto benefício de grupos “minoritários”, “oprimidos” ou “excluídos” que buscam representar. Todos reagem ao comando partidário nos temas de interesse de cada um ou da sigla. Basta ao comando assobiar para que um enxame de entidades interessadas em “empoderamento” proclame manifestos e dispare seus mecanismos de comunicação. A velha e marxista luta de classes se reconstitui, assim, através de minorias com contas a receber e maiorias com contas a pagar.

Surge, assim, o problema: como aglutinar nessa dialética o topo da cadeia alimentar, os esquerdistas de 1ª classe que se refugiam em condomínios de luxo, que rodam de SUV, que têm senha para as salas VIP e cujos filhos estudam nos melhores colégios?  No discurso que vale para todos os demais, esses companheiros são o “incluído” padrão, são o “opressor” padrão. O que fazer com eles? Suponho ter sido dessa constatação que surgiu a franquia “Para a Democracia”. Ela inclui, por exemplo, Juízes para a Democracia, Ministério Público para a Democracia, Artistas para a Democracia e, mais recentemente, Mães e pais para a Democracia, que sempre aparecem para defender a militância política de esquerda nas salas de aula onde estudam os filhos dos outros.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 


Jose Rui Sandim Benites -   09/12/2023 17:59:30

Mestre Puggina. Sempre trazendo um assunto interessante para a reflexão. Sim quem tem poder aquisitivo coloca os filhos nas melhores colégios, no ensino privado, do ensino fundamental ao médio. Para com as notas maiores ingressarem nas universidades federais. Sempre foi assim. Os vestibulares e/ou Enem. Mas o que nos leva para a hipocrisia. Muitos falam nas Escolas públicas no discurso, mas colocam seus filhos nas Escolas particulares.. Assim caminha a humanidade.

LUIZ VICENTE VIEIRA DUTRA -   08/12/2023 09:49:19

São estes democratas de ocasião, à la Gerson..., que por estudar nos melhores colégios, pagos, que conseguem passar nos exames Enen e correlatos e ingressar nas Universidades Federais, onde se tornam o defensores dos excluídos. Como diria minha avó italiana, " poca vergonha"

claudio godinho novaes -   08/12/2023 07:15:37

Muito boa a análise. Uma diferença gritante entre a direita liberal e a esquerda estatal é a narrativa. Direita é trabalho esquerda é marketing!

Afonso Pires Faria -   07/12/2023 20:59:16

Em breve teremos os "comunistas pela democracia". Não riem. Sou pródigo em prever anomalias.

Ajacio Brandão -   07/12/2023 10:59:14

Um olhar perfeito sobre o caos politico em que vivemos

José Vicente Lessa -   07/12/2023 09:16:14

Democracia é como o ar. Quando existe, ninguém dele sente falta. Respiramo-lo sem dele nos dar conta. Mas, quando falta, como no caso de alguém na galeria de uma mina que desabou, ou no interior de um submarino condenado, o ar, o oxigênio é objeto principal de toda preocupação, assunto de todos os discursos. Em países civilizados e verdadeiramente democratas, democracia é algo que se respira normalmente. Ninguém precisa invocá-la a todo momento.

Gerson Carvalho Novaes -   07/12/2023 08:41:50

Matéria perfeitamente lúcida. Comunistas ‘trabalham arduamente’ para defender seus próprios interesses e passam suas férias em lugares como Miami, Orlando, Paris, Barcelona, Milão e outros lugares bacanas…

Fernando Moraes -   07/12/2023 08:15:58

Sim, um senador gaúcho com longo tempo em Brasília, alega que as suv não são dele, são do Gabinete. Entendeu?

celsoladislaukassick -   06/12/2023 18:43:15

Os votos de vereadores, dep. estaduais, federais e senadores deveriam ter valor ponderado ao seu sufragio!