De onde a vejo, como cidadão e consumidor, a Petrobras é apenas uma empresa pública monopolista que, em perspectiva recente, adquiriu péssima reputação. Embora responda por 99% do petróleo refinado no Brasil e detenha o invulgar privilégio de fixar o preço de seu produto concorrente – o etanol –, permitiu que o governo anterior lhe criasse gravíssimos problemas financeiros e de imagem pública. Se eu tiver que escolher uma empresa para admirar e proteger, certamente ela não será monopolista, nem pública, nem vampirizada por corrupção ou corporativismo. Portanto, como cidadão brasileiro, o valor de suas ações me afeta muito menos do que a falta de combustível no posto da esquina.
E os caminhoneiros, grevistas da vez? Estão tapados de razão. Sintonizo com eles quanto aos preços dos combustíveis. Considero uma irracionalidade estarem submetidos a uma empresa monopolista que se concede o direito de alterar os preços de seus produtos dezenas de vezes por mês! Imagine uma indústria que adote a mesma prática em tempos de pequena ou nenhuma inflação. Imagine uma loja trocando diariamente, e mais de uma vez por dia, as etiquetas de preço na vitrina. Imagine isso num supermercado em tempos de preços estáveis. Loucura!
Como podem as atividades econômicas altamente dependentes dos combustíveis controlar seus próprios custos se um item tão importante oscila diariamente segundo a cotação do barril de petróleo, segundo a cotação do dólar, segundo as necessidades da Petrobras e segundo os interesses fiscais da União e das unidades da Federação? Tenho idade suficiente para afirmar que coisa igual nunca se viu. Não faltam razões, portanto, para a atitude dos caminhoneiros. Mesmo assim, sou contra o que estão fazendo. Não é a justiça da reivindicação que legitima a conduta dos manifestantes. Se aceitar que se tranquem rodovias, que se aterrorize a população com o pânico da escassez, que se leve caos à sociedade, devo admitir que as práticas delinquentes do MST se habilitem ao escrutínio da mesma lupa moral. E isso, por motivos óbvios, não posso fazer.
Uma soma algébrica de erros não produz um acerto. Agindo sobre erros antigos, não está certa a direção da Petrobras ao ver a empresa na perspectiva quase claustrofóbica em que a vê. Pedro Parente é um grande gestor, mas existe vida fora da Petrobras. Quando motoristas e transportadores usam a população e a escassez como forma de pressão, não estão a agir diferentemente de certos movimentos sociais que colocam mulheres e crianças na linha de frente de suas ações criminosas. O governo, ao tratar a Petrobras como se fosse uma prateleira de cristais, está deixando claro, para mim, que esses cristais não deveriam estar nessa prateleira.
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
mario m - 27/05/2018 18:43:37
Ops, Puggina! " Não faltam razões ..". ,não faltam e a conjugação com o momento por que atravessa o país faz parte de uma equação que não abona a sua posição contrária à atitude dos caminhonheiros. Com toda a consideração que lhe tenho, reflita mais sobre o assunto ou continuaremos amassando barro sem sair do atoleiro. Um abraço.Rossini - 26/05/2018 20:01:01
Ambulâncias, na maioria dos estados, não circulam por falta de manutenção HÁ ANOS! Cirurgias são canceladas TODOS OS DIAS por falta de leito, materiais, condições de trabalho e médicos, HÁ ANOS!!! Medicação fornecida de "graça" está em falta, HÁ ANOS. Polícias não tem armamentos novos há anos... professores tem as piores salas de aulas há anos... E a culpa é de quem? Claro, dos caminhoneiros que pararam há 5 dias!Rossini - 26/05/2018 19:58:11
Concordo com o Genimar Pereira. Algum sacrifício de nossa parte é uma demonstração de apóio.Ricardo Ventura - 26/05/2018 10:07:39
Esta prateleira de cristal já deveria ter sido privatizada há muito tempo. Lustram o cristal para parecer um diamante, mas não passa de bijuteria de vidro. Não serve ao País, constituindo-se numa formidável barreira para uma efetiva liberalização da economia. É o grande sustentáculo do "Capitalismo de Estado", do compadrio e da corrupção.Genimar Pereira - 26/05/2018 01:18:55
Eu não consigo ver esse "terror à população com o pânico da escassez" após 6 dias de manifestações. Essa população não frequenta os mesmos restaurantes que o senhor, Seu Puggina. Ela está habituada à escassez, não pela falta de oferta, mas pela falta de condições de aproveitar a fartura. E está demonstrando isso no apoio aos manifestantes. Digo isso após ter me manifestado publicamente contrário a pauta de reivindicações no início das manifestações. Também afirmo que condenei o vandalismo do MST e outros grupos afins que bloqueiam estradas quando os próprios transportadores querem trabalhar. Ocorre que, passada a primeira negociação, quando um grupo de aproveitadores, que representam grandes empresas de transporte, aceitaram um acordo mandrake que só beneficia alguns grandes patrões, a maioria dos transportadores não cairam na farsa e mantiveram a paralisação. Somou-se a isso o apoio de outros setores e classes trabalhistas. Cá em Santa Catarina, os comerciantes aderiram ao movimento inclusive com o apoio institucional dos CDLs. Mas o principal ponto dessa manifestação foi o caráter pacífico e ordeiro que não permite comparações com os grupos anteriormente citados. E as demonstrações de fraqueza desse governo ilegítimo, por que partícipe e conivente com os 13 anos de saque responsáveis pelo estado atual, mostram que, se a população quiser mesmo um ponto de ruptura, irá consegui-lo e o momento é este. O que vem após a ruptura é inimaginável, mas o que virá sem ela, isso sim é apavorante!Donizetti Oliveira - 25/05/2018 20:21:53
Dói-me o coração discordar do professor, mas não posso corroborar com sua afirmação que Pedro Parente seja um grande gestor, onde, quando???? Qualquer ser mediano sabe que é irracional e imoral atrelar qualquer item produzido internamente com o preço dele no exterior. É um INCOMPETENTE esse Pedro Parente, tanto que até rimou, e tem que ser DESPEDIDO da PTroubrás.Dalton Catunda Rocha. - 25/05/2018 19:35:47
O verdadeiro problema do Brasil não é Temer. Como também não era Dilma, não era Lula, nem FHC, nem Collor, nem Sarney, nem Jango ou Jânio. O verdadeiro problema do Brasil é, o patrimonialismo. A eterna mania nossa de confundir patrimônio público, com patrimônio privado. Afora isto, estamos sempre apostando em fracassos e vergonhas. Em 1888, nós fomos o último país das Américas a acabar com a escravidão e seguimos hoje, tendo coisas abjetas, tais como o monopólio estatal do petróleo e o imposto sindical. O petróleo é dos árabes. E a Petrobrás é da CUT. Dei-me um país, que tenha monopólio estatal do petróleo e, eu lhe darei um país pobre e uma cleptocracia. Tudo o que a Petrobrás deu ao povo brasileiro, desde que foi criada em 1953, é uma sentença de viver num país pobre. Qual deveria ser o hino do PT? Aquela música que diz: “Onde está o dinheiro? O gato comeu, o gato comeu. E ninguém viu. O gato fugiu, o gato fugiu. O seu paradeiro está no estrangeiro.” Quem quiser, que veja a música completa neste site: https://www.youtube.com/watch?v=92rr8EcDc90Fernando A. O. Prieto - 25/05/2018 16:41:34
Mesmo admitindo que a insatisfação com a política de preços é justa, nada, como diz o artigo, justifica bloquear estradas e coagir os que não querem aderir à greve a fazê-lo. "Os fins não justificam os meios!". Como poderíamos criticar os bloqueios do MST, MTST e entidades semelhantes se admitíssemos como certa a ação dos caminhoneiros? Os que estão dirigindo estas ações são tão ruins como os nossos políticos (e olhe isto que já é ruindade numa escala para ninguém achar pequena...). De fato, esses auto-intitulados e ungidos "líderes sindicais" e "representantes" são, também eles, políticos, na má acepção da palavra... Que achariam este "líderes" se o bloqueio impedisse um seu parente querido de receber um tratamento médico de emergência (p. ex. internação em UTI, hemodiálise,...) por causa de seus métodos de "luta pela categoria"?Helena Nunes - 25/05/2018 15:02:33
Prezado Professor Puggina. Eu compreendo que o caos não seja bom, entretanto o caldo entornou não por culpa dos caminhoneiros, e sim pela bandidagem sem precedentes instalada no planalto. Eu e várias outas categorias somos 100%, a favor da paralização, que as FFAA, tomem as providências cabíveis em favor da Nação, e até agora estão inertes, Twitter, vídeos e áudios de Generais, Tenente-Coronel e demais patentes, não resolvem o problema da população. Avante caminhoneiros! Fora Foro de São Paulo e et caterva!Pedro Rodrigues - 25/05/2018 14:04:02
Meu estimado Puggina Sempre leio seus artigos, e acabo de ler o atual. Compartilho em parte seu juízo, mas não haverá modificação do Brasil sem sacrifício. Ainda que passemos fome ou outras necessidades, não há o que fazer senão parar a 'tapeação' dos políticos e governos... Já fizeram uma traição uma vez recente com os caminhoneiros e farão de novo. Por que eles é que terão de praticar o sacrifício sozinhos enquanto nós vivemos no 'bem bom' de tudo à nossa disposição? Sacrifício deve ser para todos. Estou com eles e aceito meu sacrifício no que for preciso, ou senão não tiraremos a camorra corrupta do congresso e do governo. Brasileiro gosta muito de reclamar e não fazer sacrifício. É preciso a 'trombada' dos caminhoneiros para sacudir a modorra covarde dos brasileiros resmunguentos.