• Percival Puggina
  • 06/01/2023
  • Compartilhe:

O pedido de perdão do Cacique

 

Percival Puggina

         Li aos saltos, sustando a leitura e meditando cada parágrafo, a nota oficial em que o Cacique Serere Xavante pede perdão ao “irmão Alexandre”, ao “irmão Lula”, ao TSE e ao STF. Foi preciso estacionar a mente, trecho por trecho, para tentar enquadrar aquilo que lia na moldura de um chefe tribal orgulhoso de sua função e de sua estirpe. Não deu, não coube. Preferi crer que não fosse dele a redação, mas de seus advogados, porque isso seria mais conforme à minha memória dos versos de Gonçalves Dias:

Meu canto de morte,

Guerreiros, ouvi:

Sou filho das selvas,

Nas selvas cresci;

Guerreiros, descendo

Da tribo Tupi.

Da tribo pujante,

Que agora anda errante

Por fado inconstante,

Guerreiros, nasci:

Sou bravo, sou forte,

Sou filho do Norte;

Meu canto de morte,

Guerreiros, ouvi.

Eu sei. Eu assisti pela TV a longa fala do cacique à beira do fosso que limita, os fundos do Palácio da Alvorada e sei que sua prisão foi pedida pela Procuradoria Geral da República. Vi que o índio, em sua longa fala, pisoteou várias bolas, avançou diversos sinais, falou coisas indizíveis, mas – que diabos! – será tão difícil entender o que lhe ia na mente naqueles dias e naqueles atos e a perspectiva dele mesmo sobre suas atribuições na cultura da tribo? Não estava li um chefe tribal exibindo vigor enquanto falava ao chefe branco? Eu o ouvi assim, reprovando o que dizia, mas entendendo a situação cultural ali manifesta.

Milhões de brasileiros, aliás, estavam e estão sendo servidos da mesma indignação que o animava naqueles dias de Brasília. Obrigados, todos, a cantar seu canto de morte, cerceadas as vozes e subtraídas as letras.

Não desconheço nem desconsidero sua condenação por tráfico de drogas em 2007. Fato grave em seu passado! Contudo, passado. Quanto aos atos criminosos de vandalismo desencadeados quando ele já estava preso, não vejo como possa o cacique ser responsabilizado, exceto se comprovada a prévia organização do ato. Leio que algumas dezenas de malfeitores já foram identificados, mas o processo – no ritmo da velha toada desses inquéritos – corre em sigilo. Seria tão importante saber se houve concurso aos atos efetivos de vandalismo e terrorismo por parte de pessoas conhecidas dos manifestantes diante do Quartel General do Exército! Isso tudo me parece tão improvável...

Não sei se o cacique assinou aquela nota oficial sob constrangimento, embora algo, dentro de mim, o considere mais compatível com quanto já revelou sobre si mesmo. Tampouco conheço o efeito dessa nota sobre aqueles perante os quais, agora, ele buscou ser perdoado. Será possível que alguém se sinta confortável, satisfeito, perante tal pedido? Parece-me que o senso de medida, também sumido na redação da “nota oficial” do cacique vem sendo, em toda parte, proporcionado pelas narrativas e se faz tão interesseiro quanto elas.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


Garivaldino Ferraz -   08/01/2023 14:49:24

A mensagem do índio foi, claramente, assinada de livre e espontânea pressão. Até me atrevo a acreditar que a tal suposta parada cardio respiratória divulgada tenha efetivamente ocorrido. Quem sabe, com o auxílio da velha "maricota, a infernal maquininha de choques elétricos.

Mercia Radicchi -   07/01/2023 16:24:01

o Cacique(que não era cacique) empolgou-se com o protagonismo e com os financiamentos, extrapolando em suas atitudes. Avançou sinal qdo resolveu invadir shoppings, aeroporto e sabe-se lá mais os próximos ambientes para os quais estavam programadas invasões. Ficou claro que os manifestantes não indígenas estavam escorando-se na valentia do "cacique", usando-o como escudo de manobra. Em video de 3hs e 23 minutos, gravado em direto por bolsonarista, no dia do quebra-quebra, quem financiava aquela ação e os movimentos acampados no QGEx. Alguns deles estavam lá, de corpo presente, à margem, assistindo ao vandalismo enquanto eram entrevistados pelo youtuber governista. Estavam lá altas patentes da PM / Deputados Federais e Estaduais, até um certo "padre", gritado pelo entrevistador para que viesse participar da gravação. Romantizar a participação de integrantes do segmento "povos originários" não funciona diante da gravidade do que ocorreu aqui em Brasília.

Luiz R. Vilela -   07/01/2023 10:53:52

Pois é, dizem que quando o pau é demais, até mudo fala. Parece que estamos vivendo na Itaguai, onde o Dr. Simão Bacamarte internava na sua "casa verde", todos a quem achava que sofresse problemas mentais. Agora são internados compulsoriamente em algum presídio, todos aqueles que que são classificados como anti democráticos. Democracia é o sistema político, que deve conviver com todas as correntes de pensamento, inclusive até mesmo com os que querem acabar com ela, que enquanto forem minorias, serão contidos naturalmente. Quando alguém é obrigado a fazer alguma coisa, e principalmente quando esta "coisa" não esta previsto na lei, é porque a democracia já foi embora. Estamos vivendo tempos estranhos, esperamos que o agora visto, não se transforme numa caça as bruxas política, e que se respeite a opinião de quem discorda da maioria, só então poderemos respirar liberdade. A eleição já aconteceu, o eleito tomou posse, nada mais justifica qualquer perseguição, e é bom que tudo volte logo a normalidade.

Menelau Santos -   07/01/2023 10:36:27

Não temos oposição, estamos sob um regime.

Teresa Rivero -   07/01/2023 07:24:29

Também não sabia desse problema com drogas!Mas isso não o desabonaria perante um tribunal que liberou André do Rap,ao contrário.O problema estaria em que o traficante ficou de boca fechada…