O partido que comandou a política brasileira neste início do século XXI contempla seu naufrágio. Os ventos sopram, as águas batem e rebatem sobre o convés enquanto a esperança some com o vento, em busca de outro norte. Atacado pela direita e pelo centro, por conservadores e liberais, com seus principais líderes presos ou a caminho do cárcere, o partido afundou em todo o país. Salvou-se no Acre. Os avanços das investigações tornaram inevitável a catástrofe petista. E nada mais fidedigno do que uma eleição municipal para diagnosticar essa catástrofe. Eleições municipais são minuciosas. Com a intensidade das tensões locais, elas envolvem centenas de milhares de campanhas e transcorrem em 5,5 mil municípios. É a maior de todas as pesquisas políticas que se pode fazer. E o Brasil, simbolicamente, mandou o PT para o Acre.
O orgulho é um veneno de efeito lento, mas devastador. O orgulho impediu o partido de Lula de reconhecer suas faltas, expurgar seus malfeitores, bater no próprio peito. Eleitores ocasionais e mesmo os de carteirinha não entendem algo que não pode ser compreendido fora de um divã de analista. Como pôde o partido nada dizer ou fazer sobre tudo que se tornava conhecido? Como pôde considerar suficiente desqualificar a polícia, o juiz, o promotor e o Cunha enquanto bilhões sob sua guarda sumiam na voragem da corrupção? E como pode tratar de si mesmo com tanta condescendência?
A eleição de domingo foi, também, um instantâneo das tropas em trânsito do PT para o PSOL. Ela identifica um movimento, um fluxo que não encontra motivos para cessar. Vai ampliar-se. O PSOL é o PT com certidão negativa. É o PT de segunda geração. É o filho de Átila, o flagelo de Deus, que volta para atacar os descendentes de Grécia e Roma. Aprendeu com seu genitor que não se faz política sem inimigos. Ora, o mostruário de inimigos disponíveis para compor um discurso político não é tão grande assim. Como resultado, o PSOL alugou os inimigos do PT. Não foi dito, mas deu para notar algo assim tipo mexeu com o PT mexeu comigo. Entrando, inteligentemente, no coro contra Cunha e contra Temer, abriu as porteiras para acolher o eleitor petista de narinas mais sensíveis.
Com o assento sobre a janela e sem um discurso que possa chamar de seu, o PT não conseguirá, tão cedo ao menos, fazer com que o sangue e o oxigênio se encontrem nas proporções devidas. Recolhe-se à tenda de oxigênio. E ao Acre.
O atraso está sob nova direção. O populismo troca a razão social. As últimas greves, especialmente as greves estudantis secundaristas, a resistência ao projeto da Escola sem Partido, a identificação com a esquerda ibero-americana, o apoio aos delirantes comunistas bolivarianos, saem desta eleição guarnecidos pela agenda do PSOL. O perigo ronda as salas de aula do país.
Agora só falta a moçada do PSOL dizer que "lutamos contra a ditadura".
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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
Henri Breton - 08/10/2016 16:23:55
Excelente texto. Talento demais para uma pessoa.elson - 08/10/2016 16:14:50
Atualmente o PDT é maior partido comunista do Brasil, no meu entender.Joao Luiz Pereira Tavares - 08/10/2016 01:19:46
Preciso falar aqui e DIVULGAR uma CARTINHA PICARETA do PCdoB, do Rio Grande do Sul. O PCdoB sempre, disfarçadamente, tentando dar uma de sabichões e de tabela ajudar o velho PT. Observe aqui: A MANUELA D’ÁVILA, do PCdoB/RS, está escrevendo UMA CARTINHA picareta para a MARCELA TEMER, hoje dia 07 de outubro de 2016, sexta-feira… Para a Manuela D’Ávida: Manuela cabe a você fazer o seguinte. Veja: Repare que coisa mais ELEGANTE. Visualize a IMAGEM: veja: EM SILÊNCIO: Não precisa falar NADA. Em silêncio, leve seu cartazinho ao açougue, quando for comprar carne. Levante seu CARTAZINHO na fila, vire-o para um lado e, depois, vire para o outro. Levante bem alto seu cartazinho de Fora Temer; para que todos o VÊEM! P.S.:?Manuela, escreva, também FRASINHAS no G+; no FACEBOOK ; no Twitter.?Mas saiba de uma coisa: não PRECISA TER INVEJA de Marcela Temer: a Marcela é muuuuuito mais bonita que você própria!Ernesto Ribeiro - 05/10/2016 17:08:52
Poético. Lindamente poético. O ensaio político mais bem escrito que já li. Uma delícia. Mestre Percival Puggina, me orgulho de ser seu leitor. Sempre recomendo seus artigos valiosos a todos os meus contatos via e-mail. "É indispensável ler as análises de Puggina sobre política e ideologia, pois são os diagnósticos mais certeiros sobre esse gigante doente chamado Brasil." Junto com Olavo e Carvalho, você é o maior expert nestes assuntos, com a vantagem de ser equiibrado e objetivo. Parabéns, sir Percival. Siga em frente na batalha e continue produzindo mais destes biscoitos finos da Língua Portuguesa. São como belos filmes sobre um tema horroroso. Eis aí a suprema vitória estilística do grande escritor jornalista sobre a realidade tupiniquim.Genaro Faria - 03/10/2016 19:37:15
Não surpreende que os "progressistas" tenham levantado acampamento. E que o PSOL seja o fornecedor das barracas, novinhas em folha, como foram as do PT quando este era o "partido da ética". Durante o impeachment, tanto o PCdoB quanto o PT arderam no fogo que atearam para incendiar o país. O PSOL e a Rede, porém, se resguardaram um pouco. Sabiam que seriam os futuros desaguadouros das mágoas derramadas pela frustrada tentativa de hegemonia política do PT. Sobretudo o PSOL, que tem um nome mais vistoso: socialismo com liberdade. Que é como chupar cana e assobiar ao mesmo tempo, ilusão que tanto agrada aos ingênuos quanto os super homens e mulheres maravilha da saga dos super heróis. O PT vem aí, com outro nome.Anicio Oliveira - 03/10/2016 18:08:49
O problema é que muitas coligações que o PT estava escondido ganharam e essa é a grande questão.Fabio Salvador - 03/10/2016 17:23:27
Acredito que o PT tenha se esfacelado não apenas pela sujeirada toda em Brasília mas porque, diante desses episódios que obviamente diminuir-lhe-iam as forças, resolveu continuar a ser "cabeça de chapa" na maior parte das praças eleitorais. O PT quer sempre colocar o prefeito. Quer sempre colocar o governador. O presidente. Nunca é o aliado coadjuvante. Nunca dá o lugar principal a ninguém. Então, com seus candidatos enfraquecidos, com sua legenda emporcalhada, nem assim rendeu-se em seu orgulho. Quero fazer aqui um comparativo com o PMDB. O PMDB ás vezes está com bons nomes e concorre a prefeituras, governos, poder de topo. Mas quando não os tem, pega, numa boa, a vice. Ou apenas o apoio. A maioria dos partidos tem o bom senso de perceber quando deve fazer o papel secundário. PT e PSOL só querem saber de dar cabeçada, de serem os maiorais, os nomes na urna. Mesmo quando não têm a menor chance. Por isso as fases ruins transformam-se em desastres de longa duração, quase irreversíveis.