• Percival Puggina
  • 14/04/2013
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NOVA LEI PARA ENFRENTAR AS DROGAS

O problema das drogas e seus dependentes vem sendo tratado, em nosso país, de um modo piegas e desconjuntado da realidade. Os instrumentos legais disponíveis quase nada fazem para enfrentar essa pandemia que avança sem encontrar resistência suficiente para contê-la. Talvez o melhor exemplo da impotência que menciono possa ser representado pelo fato de que toda tentativa de internar um dependente químico esbarra, ainda hoje, no simples não quero que ele possa antepor a quem se disponha a tratá-lo. Já ouvi contar sobre a violência de uma internação forçada. É fácil intuir o quanto algo assim afeta a sensibilidade de todos. São terríveis os relatos sobre os limites aos quais são empurrados os pais de um jovem prisioneiro do vício e de suas exigências cotidianas. Imagino os sentimentos contraditórios que afloram diante dos protestos de um filho sendo internado compulsoriamente. Afinal, ele não é um criminoso. Afinal, ele é um doente. Afinal, ele é um ser humano dotado de liberdade. Afinal, será que ele não pode fazer o que bem entende de sua vida, inclusive drogar-se até a morte? Afinal, não está a própria sociedade sendo orientada para lidar com a existência como um espaço onde cada um realize os próprios desejos? Afinal, não está inscrita na regra do jogo da vida como a vivemos nestes anos loucos que não devemos frustrar nossa vontade? Penso que as ingênuas objeções à internação forçada de dependentes químicos são espelho dessa deplorável visão de mundo. Refletem a liberdade sem norte, sem rumo, ignorando o fato de que aquilo que chamamos vontade não é sinônimo de desejo ou pulsão, mas um poderoso dom, inerente à natureza humana, para resistirmos às atraentes versões com que o mal se apresenta às nossas vidas. Essas e muitas outras interrogações certamente estiveram presentes em dezenas de audiências realizadas para debater o projeto que pretende proporcionar melhores instrumentos à ação do Estado e da sociedade no combate à drogadição e que deve ser votado pela Câmara dos Deputados nos próximos dias. Aprovado o projeto do deputado Osmar Terra, havendo solicitação da família e recomendação médica, os dependentes poderão ser internados compulsoriamente, por determinação judicial. É desumano não internar uma pessoa destituída, pelo vício, de seu discernimento. É dever da sociedade produzir os meios que viabilizem cuidar dessas situações extremas com medidas adequadas. O projeto em pauta, ademais, aumenta a pena e reduz as atenuantes para o tráfico. Já não era sem tempo! Divide a competência das ações antidrogas entre União, estados e municípios. Prevê isenções fiscais às empresas que abrirem postos de trabalho para egressos do tratamento e disponibiliza um conjunto de regras para a avaliação e acompanhamento da gestão das políticas sobre drogas. A nova lei, por fim, será extremamente benéfica para as comunidades terapêuticas, essas preciosas instituições, nascidas da generosidade social, cujos voluntários realizam uma das mais valentes expressões do amor ao próximo. Tais instituições, doravante, passarão a contar com apoio financeiro do poder público e poderão fazer muito mais. No entanto, mesmo com a nova lei e mesmo com novos e melhores meios para lidar com o problema, é indispensável ter presente que a droga sempre se infiltrará numa sociedade regida por chavões do cotidiano, como são as expressões - Querer é poder! Eu quero eu posso! Eu sei o que é bom para mim! Perante tais lemas, quase nunca comparecem as objeções que qualquer consciência bem formada deveria antepor - É lícito querer o que quero? Aquilo que considero bom para mim serve ao meu próprio bem e ao bem dos demais? As drogas também refletem, portanto, o mau caráter de uma sociedade e seu desapreço por certas virtudes e práticas indispensáveis ao desenvolvimento integral e harmônico da pessoa humana. _____________ * Percival Puggina (68) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões.