• Percival Puggina
  • 08/10/2023
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Magia e sedução na Colmeia e na Papuda

 

Percival Puggina

 

         Primeiro contei até 10, três vezes por dia durante dez dias como recomendaria minha avó se o caso fosse sério. Depois, busquei no Google, em detalhe, o que escreveram CNN, Globo e Poder 360. Em todos, a mesma informação: a ministra Rosa Weber, no discurso de despedida do STF, contou que o colega Alexandre de Moraes foi aplaudido pelos presos dos atos de 8 de janeiro recolhidos à Papuda e à Colmeia durante visita a esses institutos penais.

Confesso a vocês minha estupefação e me surpreende que tenham sido tão rarefeitas quanto vãs as tentativas de aprofundar essa informação. Fazer o quê? O jornalismo brasileiro anda assim. É um curioso jornalismo sem a mínima curiosidade em relação ao que saia fora de suas pré-fabricadas narrativas e adjetivos de laboratório.

Aplausos ao ministro Alexandre de Moraes já me haviam surpreendido anteriormente na cerimônia de diplomação de Lula, em auditório lotado pela elite petista. Ao chegar à mesa para dirigir os trabalhos, o então presidente do TSE foi mais aplaudido do que Lula! A ruidosa saudação proporcionada por um público em pé, prolongou-se por 50 segundos. Experimente bater palmas durante 50 segundos. Os aplausos para Lula, um pouco depois, pararam aos 44.  A diferença é pequena, sei, mas eu a presumo inédita.

Por mais que eu busque motivos para os aplausos dos presos ao ministro relator de seus processos, eu não os encontro no mundo dos fatos conhecidos. Aplaudir é um ato de concordância ou de emoção positiva. Estariam os presos concordando com o modo como foram arrebanhados? Expressavam gratidão pelo tratamento dispensado a eles e a seus advogados? Manifestavam sua felicidade com as recusas aos habeas corpus, os empregos perdidos e a separação de suas famílias?

É desnecessário falar com os réus para saber que responderiam negativamente a qualquer dessas perguntas se fosse possível formulá-las de viva voz, olho no olho. Não posso deixar de lado, porém, o fato material conforme narrado em público pela ministra então presidente do STF: réus do dia 8 de janeiro aplaudiram o ministro relator de seus processos. Por fim, não me sinto confortável para especular sobre a natureza do fato ou fatos que impulsionaram as mãos àquela expressão ruidosa de concordância ou admiração por ... sabe-se lá o quê. No entanto, isso eu posso dizer: algo grave aconteceu ali para converter em aplausos o antagonismo que seria normal esperar. Como se obtém tamanha magia e sedução? Pois é...

Durante meses, enquanto reprovava a conduta criminosa e estúpida dos vândalos, eu me condoía com a imensa maioria dos presos em seu injustificável encarceramento e reprovava o tratamento de rebanho que lhes era imposto e que se reproduz nos julgamentos virtuais sob a ira das cortes. Talvez este seja mais um dos tantos mistérios, penumbras e ruidosas exceções que acortinam a história destes últimos anos.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 


Paulo Antônio Tïetê da Silva -   10/10/2023 12:53:30

Na minha opinião, existem três explicações para esse fato: 1º - É mentiroso; não aconteceu. 2º- Foram "aconselhados" a aplaudir. 3º- Pensaram: Como estamos subme- tidos ao poder e ira do visitante, vamos puxar-lhe o saco", na tentativa de evitar que ele torne nosso sofrimen- to ainda maior. É como se o escravo agradasse o feitor, para que este não colocasse muita força, quando aplicava as chibatadas ordenadas pelo seu dono.

Maria do Carmo -   10/10/2023 10:50:19

Realmente chega a ser surreal a capacidade dos togados em subestimar a inteligência brasileira, ou o deboche é tamanho que para eles somos uma espécie de sub-humanos dada a posição de deuses em que eles se colocam.

Menelau Santos -   09/10/2023 21:32:35

Seria como se Hitler fosse aplaudido pelos judeus ao visitar Auschwitz. Como o Fuher não pensou nisso?

carlos edison domingues -   09/10/2023 14:43:21

PUGGINA. Assisti o sorriso sádico, trocado entre a ministra e o ministro, no momento em que ela transmitiu esta opinião. Isto é o S.T.F. " Carlos Edison Domingues

marisa van de putte -   09/10/2023 11:39:35

Nao sei nao, porem eu creio que uma grande maioria de brasileiros e ingenua. Nao se sabe o que foi dito aos presos antes da visita. Como apresentaram o togado a estas pessoas? Basta um elogiu ao togado seguido de palavras de esperancas aos presos e eles acreditam. E muito triste a situacao. Eles sao"presos politicos," como em Cuba e Venezuela.

Danubio Edon Franco -   09/10/2023 11:05:01

Mistério é mistério! Dizer o quê? Só a dona Rosa interpretou aquilo como uma manifestação de gratidão ao carrasco ou será que alguém mais teria esse alcance?

MARCO ANTONIO GEIB -   09/10/2023 10:56:52

Mestre o fato de prisioneiros baterem palmas só se justifica como a "Síndrome de Estocolmo" !!! Um fenômeno psicológico que ocorre quando uma pessoa desenvolve uma ligação emocional com seu sequestrador ou agressor, e começa a ter sentimentos de simpatia, empatia ou até mesmo amor por essa pessoa. Um empresário nosso amigo teve, por um percalço, passar três dias em um presídio.....Seu comentário após ser libertado: a prisão, nos moldes formais, "destroe o ser humano, seja por um dia ou trinta anos".

Eloy Severo -   09/10/2023 09:38:02

Nada mais me rurpreende.

Pedro Amaro Ramos Machado -   09/10/2023 09:21:09

Bom dia, Professor! - maravilha poder contar com suas palavras inteligentes e esclarecedoras. Agora, quanto as palmas e tudo o mais que estamos presenciando, gostaria muito do juízo final mas penso que minha idade não a permitirá! Um abraço respeitoso.

felipe luiz ribeiro daiello -   09/10/2023 08:50:32

A luta continua.

Afonso Pires Faria -   09/10/2023 08:46:56

Da utopia a distopia e rumo a loucura.

Gerson Carvalho Novaes -   09/10/2023 07:43:08

Só há uma expectativa de minha parte: Quando será instaurado o nosso ‘Tribunal de Nuremberg’?

José Ruy Blanco Gogia GOGIA -   08/10/2023 11:37:29

É...Bem assim!! Eu não estava presente, nem nas imediações, dada às circunstâncias, interpretei como um SONORO PROTESTO. Bater palmas é uma forma de FAZER BARULHO, era o RECURSO dos presos naquele momento. Agora, coloque uma CANECA DE ALUMÍNIO nas mãos deles e imagine.........