• Percival Puggina
  • 27/10/2019
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INVEJA DE JOSÉ NÊUMANNE

 

 Nestes últimos dias sinto uma santa inveja do José Nêumanne, homem certo, no lugar certo, na hora certa quando o vaidoso ministro Marco Aurélio Mello, em abril de 2016, se expôs perante a equipe de jornalistas do Roda Viva e teve a má sorte de topar com Nêumanne na roda de entrevistadores (1). O bravo jornalista não deixou barato e lavou a alma nacional. Apontou a morosidade do Supremo, a impunidade que conferia aos crimes praticados por aqueles réus que dispusessem de prerrogativa de foro. Ironizou e teatralizou o que era sabidamente ridículo, apontou a onerosa e inútil farsa do julgamento do mensalão, cujas penas, abrandadas pela exclusão do crime de formação de quadrilha, praticamente não se cumpriram. Em dado momento, sem encontrar porta retórica para evadir-se daquele aperto, o ministro tentou inverter a situação e de entrevistado virou entrevistador:

“Por que essa fixação no Supremo? Você não acredita na sua Suprema Corte?”. Ao que a resposta de Nêumanne veio fulminante: “Não, não acredito”. O comentário de Marco Aurélio Mello à dura afirmação ecoa através dos anos: “Isso é muito triste”. E é, ministro, acrescento eu. Os senhores não imaginam quanto, aos olhos da sociedade, é triste o papel que tantas vezes desempenham!

Se a pergunta que ele fez ao jornalista fosse endereçada hoje à nação, esta, quase unânime, expressaria seus sentimentos de maneira ainda mais áspera. A composição do STF que os anos petistas legaram ao país merece-lhe tanta confiança quanto aqueles a quem põe em liberdade, atendendo, por gosto ou não, querendo ou não, à ecologia do crime e ao preservacionismo da corrupção. É o que fazem.

Nestes dias, só nos resta aguardar os votos finais e gritar nossa repulsa e desalento ante o que ouvimos em votos dados no tom de quem ensina. Por vezes, são lições inaudíveis, intoleráveis. Os votos a favor do cumprimento das penas somente após as festas do Dia de São Nunca são proferidos sob um guarda-chuva retórico que tem apenas duas varetas. Não abre, não protege o discurso nem o voto. Uma vareta levanta seu pedaço de pano torto para a leitura literal da Constituição, soltar milhares de bandidos sobre cuja culpa não cabe dúvida e restaurar a impunidade, alegando que o contrário disso seria legislar. A outra , do lado oposto, faz o mesmo para legislar e criar tipo penal por analogia ou para inovar no direito processual em matéria de insignificante relevância como são as alegações finais. Assim, a Lava Jato e o combate à criminalidade vão definhando aos olhos de todos. 

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* Percival Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 


FERNANDO A O PRIETO -   30/10/2019 08:16:05

Ótimo artigo, sábias palavras. Ninguém de bom senso e bem intencionado discordaria que a péssima reputação dos componentes do STF é merecida... Esperemos algo melhor para o futuro. Como a indicação é meramente política, não temos ação direta... Mais uma vez fica clara a importância do voto: ao menos para cargos no Congresso e para cargos do Executivo temos (alguma) voz... A imensa maioria deles também foi mal preenchida, com ladrões ou mesmo com pessoas que, superficialmente honestas,só se preocupam com a próxima eleição, com a própria família e os amigos! Façamos o possível para que essa praga diminua! Se não conseguirmos eleger pessoas que realmente pensem no país - são poucas, mas devem existir - o resultado, a médio prazo, poderá ser a verdadeira calamidade que seria a volta do PT e outras quadrilhas associadas ao poder, pela desilusão do povo com a alternativa! Deus nos livre que esses gatunos voltem...

Paulo Malta -   29/10/2019 21:29:14

O jornalista José Nêumanne Pinto deu um verdadeiro exemplo de jornalismo independente ao enquadrar o min. Marco Aurélio. Gostaria de ver o dono do STF, min. Gilmar, enfrentando o RODA VIVA. Essa coragem falta-lhe.

Paulo R Kherlakian -   29/10/2019 02:17:28

O ministro após aquele papo com o Neumane, deve ter ficado traumatizado com a objetividade do jornalista, que com o passar do tempo ganhou ainda mais credibilidade pela sua visão correta sobre os sinistros. É de jornalistas raiz com o Neumane que o jornalismo esta precisando.

Ralpho Oliveira -   28/10/2019 23:13:04

Todos sentimos essa santa inveja de fazermos valer ao indigitado ministro que ela não é dono da verdade, muito ao contrário.

REJANE APARECIDA ZANIN ALVES -   28/10/2019 20:09:54

Brilhantes e sábias palavras !!

Menelau Santos -   28/10/2019 18:07:36

José Nêumanne foi um ótimo professor, mas o ministro foi um mau aluno. Não prendeu a lição.

Décio Antônio Damin -   28/10/2019 13:55:27

Não se sensibilizar com a opinião pública é incompatível com a Democracia em que “todo o poder emana do povo e, em seu nome será exercido.” A prisão “após a segunda instância” valerá para todos, pois “todos são iguais perante a lei”. Recorrer preso, quando for o caso, igualará “pobres e ricos”. A opinião pública cansada de tanta impunidade quer que TODOS os que fizeram por merecer sejam presos! Ainda dá tempo para o STF se redimir!!

Donizetti Aparecido de Oliveira -   28/10/2019 13:37:22

O que penso do STF não se pode expressar e muito menos publicar, e garanto que a maioria da população concordaria comigo em gênero, número e grau. Só as divindades judiciárias não percebem, ou não querem perceber o sentimento da população brasileira que é bandida.

Luiz R. Vilela -   28/10/2019 11:47:39

José Nêumanne Pinto, jornalista da velha guarda, preservador das características fundamentais do verdadeiro jornalismo. Até hoje, pelo que se lê nas suas escritas, nunca foi partícipe ou recebeu "incentivos" governamentais, para "divulgar" as boas ações dos governos, como se tornou comum no jornalismo pós ditadura. Sempre foi um crítico, como deve ser a comunicação social, ajudando o governo a governar, sempre apontando os erros, na esperança que sejam solucionados. Nêumanne é um dos orgulhos do bom jornalismo. Quanto aos ministros do supremo, a deficiência, é a olhos vistos, apenas um deles, foi juiz de carreira da justiça comum, muitos nunca foram juízes, vieram diretamente da advocacia, trazendo no seu DNA, o pendor para a defesa, para o a qual são formados nas faculdades de direito. Para a acusação, eles olham com lupa, para ver se não existe uma vírgula fora do lugar, que anule o processo, como agora cogitam fazer com os do lula. Para a defesa, é só mamão com açúcar, chegando ao ponto, até de se valer de mensagens roubadas, com o intuito explícito de beneficiar o réu. Chegará o dia, que nem prova, por mais robusta que seja, terá qualquer valor, irão querer que o acusado seja réu confesso, com confissão por escrito, registrada em cartório e com firma reconhecida. Em matéria de STF,parece que chegamos ao fundo do poço. Os ministros da suprema corte, parecem que são meros procuradores de quem os nomeou. Seus votos seguem as tendências dos "arranjos" políticos dos seus padrinhos, apenas o lula, pela quantidade que nomeou, um ou outro destoou do princípio, até porque ficaria esquisito cumprir as vontades de um encarcerado. O STF brasileiro, é o supremo criatório de todas as impunidades da bandidagem de terno e gravata, que vai do Queiros, até o baronato da turma que empreita obra pública, passando também pela "gloriosa" classe política. O "criador" deveria estar embriagado, quando fez o Brasil.