• Percival Puggina
  • 23/02/2018
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INTERVENÇÃO NO RIO

 

 Quando eu era criança, em Santana do Livramento, brincava-se com bolinha de gude. Por influência castelhana chamava-se “jogo de bolita” e era disputado “às brinca” ou “às ganha”. Às brinca jogava-se por diversão; às ganha, pela bolita do adversário. Daí a pergunta: a intervenção no Rio de Janeiro é às brinca ou às ganha?

Não posso sequer imaginar o Exército de Caxias descendo o morro, cabisbaixo, derrotado por homicidas, ladrões, traficantes e estupradores, sob o olhar desesperançado da população. Jamais!

A reprovação da oposição e movimentos sociais à intervenção no Rio de Janeiro se dá por motivos militares? Motivos policiais? Não. Por insuficiência dos meios em relação aos fins? Tampouco. Ela é determinada pelos motivos ideológicos de costume. São os mesmos que sempre estiveram ao lado da criminalidade. São os mesmos que a percebem como força auxiliar no processo da revolução social com que perfilam seus palanques e tribunas. Deles, em circunstância alguma, se ouviu palavra de reprovação a quaisquer condutas criminosas que não fossem atribuíveis a seus adversários. Nunca se ouviu dessa esquerda vociferante uma advertência sequer aos bandidos do país. Nos diferentes níveis de governo ou fora deles, governando ou impedindo de governar, legislando ou impedindo de legislar, sempre se alinharam com a justificativa ideológica da criminalidade. Nas comissões de “direitos humanos” dos parlamentos e nos conselhos nacionais, estaduais, municipais e siderais de igual viés, sempre se instalam, constrangendo e recriminando a atividade policial.

Trata-se de uma percepção política da Moral. Esse grupo - como reiteradamente tenho comprovado na experiência de décadas de debates - crê com fé religiosa que o capitalismo, o livre mercado e a propriedade privada são as causas da pobreza, das desigualdades sociais e as gêneses de todo mal. Por mais que a realidade, o presente e a história os contradigam, sustentam que, eliminados tais fatores, não só o mal deixaria de existir, mas a humanidade emergiria num paraíso de amor e paz. Quem acredita nisso conclui que não se deveria criminalizar a conduta de quem conduta diversa não possa ser exigida. Para esses preconceituosos, o pobre em nome de quem dizem falar é um bandido em potencial.

Voilá! A impunidade e seus corolários infiltram-se, por essa fresta, no lado formal, estatal, público, da cadeia produtiva da criminalidade. É um verdadeiro self service de leis brandas, persecução penal constrangida a escalar exaustivas e morosas escarpas recursais, penas mínimas, cadeias de menos, garantias demais, indenizações aos presos, progressões de regime, arrombados semiabertos, “prisões” domiciliares, maioridade aos 18 anos, restrições ao regime disciplinar diferenciado, indultos, ativismo judicial, insegurança jurídica, e o Poder Judiciário atabalhoado entre interpretações contraditórias. Quem buscar causas para o vertiginoso crescimento da criminalidade no Brasil se irá deparar, necessariamente, com a impunidade, esse verdadeiro energético aplicado diretamente nas artérias do mundo do crime. Sobre tudo isso, um desarmamento que permite selecionar a vítima com o dedo, assim como se elege o frango assado na vitrine da mercearia.

A criminalidade declarou guerra à nação e as Forças Armadas foram convocadas a intervir. Não posso imaginar o Exército de Caxias descendo o morro em retirada. Nem consigo supor que vá, simplesmente, espanar o morro e espalhar o crime, numa operação que exige aspirador de pó. Impõe-se forte pressão social para que os entraves jurídicos sejam removidos, a bem da segurança de todos e, principalmente das populações usadas como valhacoutos dos barões do crime.

 

Nota do autor: Aos 60 anos da revolução cubana, estou ultimando uma nova edição ampliada e atualizada de “Cuba, a tragédia da utopia”. Ela estará disponível nos próximos meses.


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* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


 


José Nei de Lima -   25/02/2018 18:47:39

Olá meu amigo, acho que é as brincas e não as verdas, o que a tempo à verdadeira Incompetência dos nossos gestores públicos.

Carlos Fernandes -   25/02/2018 14:43:36

Isamsel, vc está enganado. Alguns meses antes do exercito e da marinha subirem os morros, foi dado à marinha e à aeronautica o mesmo poder de policia que o exercito ja tem. Informe-se antes de falar bobagem.

FÁBIO -   25/02/2018 13:32:52

Estou bastante cético quanto a essa "intervenção". Com o arcabouço jurídico (e, sobretudo, cultural que a esquerda conseguiu com extremo êxito enxertar na mentalidade do brasileiro médio) a atuação do Exército tende a ser um fracasso. Tudo será violação à "dignidade da pessoa humana", como se o estado de coisas que já vigora no Brasil fosse a mais límpida face da dignidade de uma humana pessoa... Parabéns, Puggina! Aguardo ansiosamente pela nova edição de "Cuba, a tragédia da utopia".

Ismael de Oliveiira Façanha -   25/02/2018 01:25:40

O Exército já andou peneirando os morros cariocas, mas nada foi alcançado quanto a melhorias na segurança física dos cidadãos cariocas. As Forças Armadas estão sendo usadas para fins estritamente políticos, elas não possuem sequer de "PODER DE POLÍCIA" para agir dentro do ordenamento constitucional! Não cabe a mim orientar nossos governantes, mas, só para desabafar diria, que, de um lado seria necessário impor o "estado de defesa" ou de "sítio" no Rio de Janeiro, levantando as garantias constitucionais da população, e abrindo as portas dos mucufos e tugúrios onde se escondem arsenais e gangues de malfeitores. De outro lado, o consumidor de entorpecentes deveria receber a mesma punição reservada ao traficante, como o RECEPTADOR tem o mesmo tratamento penal do LADRÃO. Pela óbvia razão de que traficante e consumidor vive um em função do outro, sem este não existiria aquele. Mas essas medidas requereriam um governante de outra envergadura, melhor e maior do que a desse pobre coitado que está no poder.

Max Cosendey Toledo -   24/02/2018 21:49:37

Intervenção federal no Rio de Janeiro .Qual é o palavrão que deve ser dito ? Sem alinhamento estratégico perdemos vidas de civis e militares e desqualificamos uma instituição policial/Militar tão cara a sociedade ,transformando ações táticas em ações isoladas de pouca eficácia e eficiência .O crime organizado ao assumir o legislativo envia tentáculos ao executivo e como uma toupeira ameaça a base de qualquer possibilidade de reação ao crime.Os gestores políticos definem qual a estratégia. Constatamos que para efetividade de alinhamento estratégico é imprescindível um setor de inteligência . A reflexão sobre os fatos apontam para a questão que não adianta um braço tático de excelência sem um centro de comando e controle impermeável ao crime organizado.Reconhecer uma inteligência capenga onde o papel da contra inteligência se atrofiou e se limita a proteção e blindagem de uma liderança venal é o palavrão que deve ser dito . Pai e filho policiais militares Rg 48877 Carvalho, e Rg 94359 Jonathan de Carvalho mortos no combate ao crime. A propósito a ficção que copia a realidade é muitas vezes tênue sombra,que o diga o cineasta Padilha,”Tropa de Elite 2”.

Rivo Ficher -   24/02/2018 17:53:05

É gritante a torcida para que a intervenção não dê certo é esse "videntes" possa proclamar o "eu não disse?". Lamento informá-los de que a intervenção não tem como não dar certo, por tantas que não há espaço para explicar a esses ignorantes (e acho que nem adiantaria). O que vai acontecer? Parte dos bandidos vai morre, parte vai ser presa e parte fugirá (para recomeçar). É só esperar pra ver.

Joao Domarques de Menezes -   24/02/2018 17:45:21

Existe alguma diferença entre as diversas "classes de bandidos"? Ressalvadas as raríssimas exceções, qual a diferença entre os marginais dos morros cariocas e o parlamento? Não estamos falando do povo trabalhador que é obrigado em morar nos morros; tampouco, não se entenda que a bandidagem somente habita nos morros cariocas.

Carlos Lasaro Carneiro -   24/02/2018 17:03:08

Nossa! como escreve bem, os textos parecem um tônico cerebral.

Luiz -   24/02/2018 11:54:01

Aconteceu assim: PCC- "Agente bota o exército no Rio pra expulsar os bandidos de lá, já que o chefe deles tá na cadeia, e nós ficaremos livres pra negociar." A reação de quem está no comando local foi de matar vários integrantes da facção. Essa intervenção é mais uma palhaçada da administração pública contemporânea do Brasil.

Amauri Bezerra de Oliveira Luz -   24/02/2018 00:13:47

Leio tudo do Puggina. Quero saber quando estará nas livrarias a nova edição de “Cuba, a tragédia da utopia”. Creio que tenha de comprar pela internet, assim como fiz com "A Tomada do Brasil", que não chegou em nenhuma livraria da minha cidade, Belém/PA. Um grande abraço, grande Puggina.

Dalton C. Rocha. -   23/02/2018 16:24:43

Há quase cem anos atrás, o marxista Trotsky (1879 – 1940) escreveu isto: Para dominar uma sociedade, basta que a esquerda faça duas coisas: 1- Colocar os pobres, contra os ricos. 2- Colocar os bandidos, contra os pobres. O petróleo é dos árabes. E a Petrobrás é da CUT. Dei-me um país, que tenha monopólio estatal do petróleo e, eu lhe darei um país pobre e uma cleptocracia. Tudo o que a Petrobrás deu ao povo brasileiro, desde que foi criada em 1953, é uma sentença de viver num país pobre. Qual deveria ser o hino do PT? Aquela música que diz: “Onde está o dinheiro? O gato comeu, o gato comeu. E ninguém viu. O gato fugiu, o gato fugiu. O seu paradeiro está no estrangeiro.” Quem quiser, que veja a música completa neste site: https://www.youtube.com/watch?v=92rr8EcDc90