• Percival Puggina
  • 31/08/2018
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HÁ MALES QUE VÊM PARA PIORAR AS COISAS

 

 Estamos padecendo a síndrome que acomete o Brasil a cada quatro anos. A bolsa cai, o dólar sobe, os empreendedores pisam no freio e o PIB encolhe. Há várias décadas venho denunciando que o sistema de governo e o sistema eleitoral são concebidos para favorecer os interesses políticos colegiados dos senhores congressistas. Quando isso é alcançado, que tudo mais vá para o inferno.

 O tempo mais perdido da minha vida corresponde às muitas horas que gastei assistindo sessões de Comissões Especiais de reforma política promovidas pelo Senado e pela Câmara dos Deputados. Completamente inútil. Ao final de todos os trabalhos, preservamos o sistema vigente, cuja mais notável competência é a geração de crises periódicas.

 Entende-se o motivo de nos mantermos amarrados ao pelourinho das tragédias: parcela significativa do conjunto dos eleitos vê sua atividade com os mesmos olhos que seus eleitores os veem. É uma questão de coerência: assim como os eleitores escolhem um parlamentar para cuidar de seus interesses pessoais, familiares, corporativos, etc., tais congressistas, simetricamente, entendem seus próprios mandatos como delegação para zelarem por seus próprios interesses pessoais, familiares, corporativos, etc.. Eleitor egoísta, que elege alguém para zelar por si, vota em candidato egoísta igual a si.  E se desaponta.

 Depois que ingressou na corrente sanguínea das instituições algum preceito que serve às conveniências corporativas dos parlamentares, dali não mais sai. É como despesa pública – uma vez transformada em rubrica orçamentária, fica até o Juízo Final. É o que vai acontecer com a conta das campanhas eleitorais. Uma vez transferida para a sociedade, pela extinção do financiamento privado, nunca mais será cancelada.

A imensa maioria dos eleitores brasileiros ansiava por grande renovação do Congresso Nacional na eleição do dia 7 de outubro. Contudo, a pressão exercida por um grupo de entidades – entre as quais OAB e CNBB – levou o STF a examinar a questão do financiamento privado e nossos supremos descobriram que ele era “inconstitucional”. Não me pergunte por quê.

A consequência logo se fez sentir. Os congressistas que estavam desistindo de suas reeleições voltaram à ativa. Paradoxalmente, nunca houve tanto desejo de renovação e nunca tantos buscaram a reeleição. De uma hora para outra, lhes foi proporcionada a prerrogativa de dispor sobre o montante e sobre a distribuição do dinheiro para as campanhas! Nossos mateus, então, passaram a cuidar dos seus, deixando à míngua de recursos os demais pretendentes às cadeiras que ocupam. E para tornar ainda mais difícil a vida dos novatos, o TSE regulamentou a atividade de campanha em proporções minimalistas. É quase proibido fazer propaganda eleitoral. A péssima prática agora em vigor impediu que candidatos novos pudessem buscar recursos entre empresas de sua região para enfrentarem, em condições menos desiguais, os detentores de mandato.

Contrastando com o dito popular, há males que vem para piorar as coisas. E essa modalidade de financiamento passa a ser um novo mal vitalício do nosso sistema político porque os parlamentos não revogam preceitos que beneficiem seus membros. Agradeçam ao STF essa conta financeira e  o embaraço à manifestação democrática da vontade nacional nas urnas brasileiras.

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.


 


Menelau Santos -   03/09/2018 16:05:30

E o pessoal ainda não quer a volta da monarquia. Mas ela já existe. É a "eternonarquia"! Quem entra não sai nunca mais.

PERCIVAL PUGGINA -   03/09/2018 01:15:18

Miguel Dutra, tico e teco pediram para lhe dizer que uma coisa é perder a fé no sistema, sentimento que tampouco eles têm e por isso reiteradamente denunciam a malícia a ele inerente; outra é querer a greve dos caminhoneiros, a ruptura da ordem e o fim do mundo.

Jorge Hardt Filho -   03/09/2018 00:06:18

"Agradeçam ao STF" Depois que os ministros do STF foram nomeados por critérios político-partidários e não pela que diz a constituição deu no que deu

Áureo Ramos de Souza -   02/09/2018 01:17:28

E os políticos irão fazer o que sempre fizeram protegendo seus familiaraes. Voltam por interesse público. Disso eu já sabia e os candidatos novatos se dois ganharem darei meu salário, que vai ganhar são os antigos pois já tem o macete

Miguel -   01/09/2018 23:32:44

Puggina, leia o conjunto dos seus textos e se dará conta que o tico e o teco da sua cabeça não se conversam. Você faz diagnósticos mais ou menos corretos, mas critica, menospreza, chama de pueris aqueles que, como eu, perderam a fé nesse sistema. É coisa de louco!

AHT -   01/09/2018 22:27:53

OS PODERES O destino para os canalhas da república Só pode ser um: a prisão! Prevenidos contra mudanças que afetem seus interesses, Os canalhas e demais apegados aos poderes & riquezas De tudo fazem em gabinetes e na calada da noite – pois, se Expostos à luz do Sol correriam o risco de motivar Razões e imprevisíveis reações que despertem Sentimentos de liberdade no explorado povo-eleitor. AHT 01/09/2018

Antonio Augusto d´Avila -   01/09/2018 22:10:14

O STF tomou outras duas decisões mais trágicas que essa. Em 2006, declarou inconstitucional a cláusula de barreira e depois decidiu que o parlamentar que ingressasse num partido em formação não perderia o mandato. Os mais de 30 partidos não nasceram do nada.

jaime antonio cimenti -   01/09/2018 19:04:56

Belo texto, Puggina! Como dizia o Barão de Itararé, de onde menos se espera, daí mesmo é que não sai nada. Ou, como dizia o outro "tem que mudar para ficar tudo como está" ou o Dantesco "voi che entrate, lasciate ogni esperanza" Bom finde, andei escrevendo umas linhas sobre o Frei Rovílio Costa , homem sangue ótimo, né? abração, bom finde!

Neiva Maria Demoliner -   01/09/2018 18:25:28

Esta é mais uma das soluções mirabolantes que eles encontraram para continuar piorando o que está péssimo. Haja Deus.

Afonso Pires Faria -   01/09/2018 18:05:06

Brilhante professor. Só que eu não gostaria de ter lido isto. Gostaria isto sim, ler um texto bem mais promissor, elogiando a nova forma de eleição para o parlamento. Mas, fazer o quê? Infelizmente a matéria prima que lhe foi fornecida foi de péssima qualidade. Houve um esforço, o texto foi maravilhoso mas a desilusão foi maior ainda. Pobre povo, pobre país.

José Nei de Lima -   01/09/2018 17:48:25

Olá meu amigo, só pode acontecer no Brasil, à famosa terra do cheitinho, ou seja A Lei de Gerson, o mais gritante é o nosso Supremo Tribunal federal, que libera os antigos políticos, para se reeleger continuar enganando, vão voltar para as Câmaras apenas por interesse próprio e seus familiares, e jamais em prol do país, deste jeito nunca haverá mudança nas Câmaras de todo país, Acorda Manifestantes de plantão, é muito vergonhoso para aqueles que não tem conhecimento político e como funciona a política no Brasil, com muita tristeza fiz este pequeno relato, um ótimo fim de semana meu amigo um grande abraço que Deus nos proteja e ilumine neste momento de eleições no país ??????.

Armando Micelli -   01/09/2018 14:42:41

Prezado Percival. Muito boas colocações. Bem simples e no alvo. No centro do alvo. Dois momentos marcantes neste artigo que você assina. O primeiro é a frase: " Eleitor egoísta, que elege alguém para zelar por si, vota em candidato egoísta igual a si. E se desaponta." , e o segundo é o alerta para que nos mexamos se quisermos renovação. Uma beleza. Abraços.