Há cerca de 20 anos, visitei diversos assentamentos do Incra no sul do Rio Grande do Sul. Alguns tinham barreira no acesso. Ninguém podia entrar sem autorização e a autorização era negada a curiosos. Eu era exatamente isso. Os que visitei estavam praticamente inativos, sem aproveitamento. Quase não se percebia sinal de vida. Em um deles, porém, encontrei animais de pasto e vasta extensão cultivada, prenunciando generosa safra. Pertencia a uma família de vários irmãos, procedentes da região noroeste do Estado, que trabalhavam seus lotes em conjunto. Fui conversar com eles e perguntei o motivo do contraste em relação aos demais assentados. A resposta foi surpreendente - eles plantavam. No entanto, fariam a colheita e iriam embora porque a vizinhança era perigosa. À menor desatenção, eram roubados.
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Os órgãos destinados à Reforma Agrária no Brasil operam com a terceira geração de servidores. As duas anteriores se dedicaram a fazer a reforma agrária e hoje se beneficiam da aposentadoria. Uma terceira vai tocando o trabalho, olhos no desenvolvimento de suas vidas funcionais. Nada haveria de extraordinário nisso. É o que acontece em todo o órgão público longevo e os órgãos públicos costumam ser longevos. Depois que o Estado abre uma porta ou um guichê, dificilmente essa abertura se fecha. O que torna incomparável a atuação dos órgãos de reforma agrária, hoje convergentes no Incra, é a constrangedora falta de dados sobre aquilo que é objeto de seu oneroso trabalho, oficialmente iniciado há 54 anos com a criação da Superintendência de Reforma Agrária.
Nesse "já longo andar", nosso país optou por ir na contramão da tendência mundial, que é de concentração das propriedades rurais para torná-las mais produtivas e eficientes, com ganhos de competitividade e rentabilidade. Essa tendência, natural e inevitável, reduziu a menos de 5% a população rural dos países desenvolvidos, inclusive nas potências agrícolas com as quais o Brasil compete. Resultado? Maior renda per capita no campo, aproximando-a da renda média do meio urbano.
Para atender a esse projeto de desenvolvimento com farol voltado para o século XIX, o Brasil dedicou à Reforma Agrária uma formidável extensão de terras. "Quantos milhões de hectares?" perguntará o leitor. Pois é, meu caro. Ninguém sabe! Pelo que encontrei enquanto tentava descobrir, trata-se de algo entre 40 e 80 milhões de hectares. Por outro lado, ninguém - ninguém mesmo! - sabe o que acontece nos assentamentos. As perguntas mais naturais da sociedade, que paga a conta da "reforma agrária" e os salários dos servidores ativos e inativos do Incra, não têm resposta. O que produzem essas dezenas de milhões de hectares destinados a resolver o problema social do campo pelo tão ambicionado projeto do MST e seus assentamentos? Os técnicos sequer arriscam palpite. Provavelmente se trata de insignificante fração do que poderia ser produzido se adequadamente aproveitado. Não é por acaso que o Incra aparece, mesmo nos levantamentos do próprio governo, como um dos principais responsáveis pelo desmatamento em certas regiões do país.
Até agora, o que de mais robusto se produziu com essa política foi o MST, com aquele extraordinário suporte que as organizações internacionais a serviço do comunismo dedicam aos que abraçam estratégias e pedagogias revolucionárias. Venderam caro - e, mesmo assim, parcela significativa da sociedade comprou - a ideia de que todo brasileiro nasce titular de um direito natural a receber dos demais um lote de terra para dela fazer o que bem entender, inclusive nada.
Ah, se fosse produtivo o que já se destinou para reforma agrária! Ah se não houvesse o MST, pedagogicamente, ensinado violência, desrespeito à lei e uma ideologia de primatas! Ah, se tivesse sido aplicado em educação junto aos excedentes do meio rural tudo que foi gasto para promover algo cujo resultado não se vê nem se conhece! O Brasil estaria num outro estágio de desenvolvimento socioeconômico, regido com maior racionalidade e paz.
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* Percival Puggina (71), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
Percival Puggina - 17/10/2016 12:54:15
Parece-me, prof. Rômulo, que o senhor cita uma exceção. Um assentamento na região metropolitana de Porto Alegre só não será produtivo por ato de extrema estupidez, coisa de quem queira jogar dinheiro fora. Mas não é disso que se fala quando se fala em reforma agrária e, menos ainda, quando se fala nos exércitos do senhor Stédile e seus objetivos ideológicos. Neste momento, por exemplo, há um assentamento dentro do colégio Pedro II no Rio de Janeiro que é um comitê revolucionário comunista, com vaias à eleição e loas à revolução. Parece que eleição só serve se o PT ganha... Desconhecer que o MST é isso, a serviço dessa causa, é olhar a cesta de hortaliças e desconhecer as invasões, as depredações, o desrespeito às leis, a ruptura com a ordem, os negócios imobiliários, a semeadora de uma ideologia malsã,e por aí vai.Rômulo Plentz Giralt - 16/10/2016 23:54:21
Sou professor da UFRGS. Sim sou funcionário público concursado e antes que alguém se arvore em me agredir, lembro que somos nós, professores universitários que ensinamos todas as suas profissões. Mas vamos ao que eu gostaria de compartilhar. No campus central da UFRGS, todas as terças-feiras, temos uma feira de produtos orgânicos (verduras, legumes, frutas, cereais, etc.) produzidos pelos agricultores de um assentamento em Águas Claras, município de Viamão, na grande Porto Alegre. Eles também vendem seus produtos no pátio do Centro Administrativo do estado às sextas-feiras. Com esta informação quero deixar o meu depoimento de que não podemos generalizar. Muitos assentamentos deram muito certo e são, sim, muito produtivos. Finalizando, lamento a ignorância, o preconceito e o ódio gratuito do autor do artigo e dos comentários subsequentes.J. Falavigna F. - 09/10/2016 14:01:19
Maria-maria, buenas. A guria está indicando o famoso Assentamento do Banhado do Colégio, criado pelo "prenda minha" Brizola, com o objetivo de organizar vários Grupos dos Onze? Pois eu estava para perguntar ao Prof. Puggina se ele tinha alguma notícia daquele protótipo do que viria a ser o MST, quando deparei-me com o teu comentário elucidativo. Parabéns ao Prof. Puggina pelo enfoque dado no artigo de hoje. Ad sumus!Ismael de Oliveira Façanha - 08/10/2016 20:25:44
Que misteriosa, que nada. Apenas é uma bandeira para arregimentar a Esquerda; todo bando tem seus símbolos, suas bandeiras. Os cristão novos tinham as suas, de pano, com elas iam do que hoje é São Paulo, para o Prata, destruir Missões jesuíticas da Igreja, buscando vingança pelos judeus queimados nas fogueiras da Inquisição Ibérica. Refiro-me aos "bandeirantes". Esclareço os 99,999...% que pensam que pensam que conhecem História.Ricardo Bordin - 08/10/2016 20:07:28
Lembrei da colonização dos Estados Unidos, quando o modelo comunitário foi substituído pela primeira experiência de capitalismo de que se tem notícia - antes disso imperava o mercantilismo. Não deixem de assistir: https://www.youtube.com/watch?v=Fi6X-8X2ziM E não deixem de ler sobre os plebiscitos para independência do Sul: https://bordinburke.wordpress.com/2016/10/08/o-sul-nao-e-o-meu-pais-e-brasilia-sabe-e-abusa-disso/Joma Bastos - 08/10/2016 18:42:34
Os MST foram o braço armado do PT com o objetivo de praticarem uma ditadura do terror, para fazerem prevalecer no poder um partido revolucionário de estilo bolivariano/castrense da esquerda comunista. Essa pretensa Reforma Agrária do PT nunca cogitou na possibilidade de ter como objetivo a igualdade e justiça social, mas sim fomentar a ditadura e o terrorismo social no nosso Brasil.Luiz Coelho - 08/10/2016 17:35:43
Nesse caso, o “direito” de propriedade daqueles que se autodenominam “sem terras” é mais sagrado do que para os comuns dos mortais, contando com a delegação do Estado comunista “para fazer dela o que bem entender, inclusive nada”. Trata-se de mais uma hipocrisia comunista que põe por terra filosofia antinatural absurda que pregam de que tudo deve pertencer ao Estado. Fica bem claro que o propósito dos burocratas é enfraquecer os grandes produtores que, no final das contas, são os únicos responsáveis pelas gordas safras decorrentes da competência a qual os jagunços do MST não se esforçam para ter.maria-maria - 08/10/2016 15:49:06
Num dos primeiros núcleos de "reforma agrária", situado no município onde moro, a desfaçatez dos "agricultores" fez que vendessem os lotes por inaptidão para o trabalho, pois eram gente incapaz de reconhecer uma pá de um ancinho. Os compradores ficaram com uma apreciável área em terrenos férteis e os "vendedores" foram engrossar a fila dos sem-terra em acampamentos onde tudo é provido pelo estado-mãe ,às custas dos escorchantes e ilegais impostos que pagamos.Genaro Faria - 07/10/2016 22:27:21
TIRAR O BRASIL DO VERMELHO - Eu gostaria que a frase fosse VAMOS TIRAR O VERMELHO DO BRASIL. Assim tudo ficaria definido, às claras. E corretíssimo. Tirar o vermelho do Brasil é um requisito incontornável para se tirar o Brasil do vermelho.sanseverina - 07/10/2016 21:45:59
O MST intensificou as invasões no pontal do Paranapanema em S. Paulo e no noroeste do Paraná na década de 90. Era um desassossego cotidiano para os proprietários de terra nessas regiões que se socorriam de seguranças em guaritas a cadeados nas porteiras (estes apenas para caracterizar mais um rompimento de obstáculo, já que os invasores cortavam as cercas). Instalados nas sedes das fazendas, expulsos os donos e seus empregados, o saque ia de roupas e brinquedos ao gado, às máquinas agrícolas e até a colheita: um roubo continuado sob as barbas das autoridades. Com a ascensão de FHC em 94, a Prof. Ruth Cardoso (antropologia/USP), cumprindo a cartilha marxista como o marido, deu trela ao campesinato, não só se omitindo em medidas coercitivas, mas até enviando cestas básicas para os coitadinhos. Visitei um desses acampamentos escudada por um empregado rural da região: nas barracas de plástico preto, às 14 h, marmanjos jogavam baralho e um dos líderes (com prisão preventiva decretada por assassinato), dono de um caminhão-baú (!), mostrou orgulhoso no curral o plantel “adquirido” nas vizinhanças, gado furtado de todas as idades à venda. Havia também carne para churrasco à venda, ou doação para cooptação da polícia local. Em 99 no Paraná, o governo Lerner, pressionado pelos proprietários vitimados, acabou por acatar as reintegrações de posse e enviou grupos especiais da PM para a desocupação das áreas, mas alguns proprietários negociaram e por lá ainda restam os agora com-terra produzindo quiçaça, filhos e desconfiança, principalmente.Genaro Faria - 07/10/2016 19:59:50
Se alguém quiser evitar encontrar um revolucionário, procure-o no local de trabalho. A vocação do nosso herói é outra. É ir pra rua com bandeiras, megafone, num carro de som ou em cima de um trio elétrico. É invadir escolas, órgãos públicos, propriedade alheia e fazer passeatas para atrapalhar o trânsito de quem trabalha. É subir num palanque, armar um piquete e ameaçar parar tudo e botar fogo no país. Trabalhar, jamais! Eles são nobres demais para cuidar dessa atividade própria de um reacionário, um burguês. Emprego eles só aceitam com o único propósito de fazer justiça social, transferindo a renda de milhões de anônimos para o seu nobilíssimo partido... e ficar com o troco.Tito Augusto Stella Borges - 07/10/2016 18:15:30
O horror que esquerdistas tem do mérito se explica com este tipo de coisas. Os espertalhões que comandam estas ações não precisam prestar contas de nada, pois sempre haverá um "intelectual", artista, professor, jornalista ou um estudante universitário para defender o "mérito social" que este tipo de iniciativa traz, mesmo que o resultado seja inexistente.Dalton Catunda Rocha - 07/10/2016 16:52:41
Pois é. Assim como os índios e os quilombolas todo o sem-terra é um funcionário público. Por sinal cada sem-terra é um funcionário público indemissível e tendo direito a transferir tal cargo público para os filhos, netos e demais descendentes, que sempre mamam nas tetas públicas. Falo disto como engenheiro agrônomo (desempregado) que sou. De Afeganistão ao Zimbabwe, não faltaram reformas agrárias, nas última décadas. Por sinal, desde a posse do lulista José Sarney, o Brasil é o país do mundo que mais gasta com reforma agrária no mundo. Cadê o imenso desenvolvimento, o pleno emprego o declínio da criminalidade? O gato ou melhor dizendo, o MST comeu?