• Percival Puggina
  • 31/07/2020
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ENFIM, A CONFISSÃO

 

 “Todo órgão de imprensa tem censura interna. Em que sentido? O seu acionista ou o seu editor, se ele verifica ali uma matéria que ele acha que não deve ir ao ar porque ela não é correta, ela não está devidamente checada, ele diz: ‘Não vai ao ar’. Aí o jornalista dele diz: ‘Mas eu tenho a liberdade de expressão de colocar isso ao ar?’. Entendeu? Não é à toa que todas as empresas de comunicação têm códigos de ética, códigos de conduta, de compromisso. Nós, enquanto Judiciário, enquanto Suprema Corte, somos editores de um país inteiro, de uma nação inteira, de um povo inteiro”. (Ministro Dias Toffoli, em vídeo conferência promovida pelo site Poder 360 e pelo Observatório de Liberdade de Imprensa do Conselho Federal da OAB

 Nos três dias que se seguiram a essa mal costurada fala do ministro, procurei no Google matérias a respeito que tivessem sido publicadas em grandes meios de comunicação. Praticamente nada! O presidente da Suprema Corte de um país que se declara Estado democrático de direito, afirma serem, cada um e todos os seus 11 ministros, “editores de um povo inteiro”, e o dito passa batido? Nenhum nos grandes jornais exclamou um “Epa!” sequer?

Chamou-me a atenção matéria do site Conexão Política, com o título “Toffoli diz que STF atua como editor da sociedade e recebe críticas da Internet”. Sim, é fato. Essencialmente na Internet, nas redes sociais tão antagonizadas pelos veículos da mídia militante, verdadeira multidão de brasileiros registrou seu estupor perante a presunção do ministro ao formular tal disparate em presença de tantas testemunhas.

Não fiquei surpreso. Reiteradas vezes tenho expressado, ao conhecer certas decisões de nosso Supremo e ao presenciar certos votos de alguns senhores ministros, minha percepção de que pretendem ser, ou agem como se fossem, reitores da sociedade, pedagogos da nação. Essa tendência se revela exatamente nos momentos em que as percepções, as concepções e as visões de mundo dos membros do pretório excelso transbordam além das gélidas linhas dos votos lidos. Houve quem julgasse exagerada minha observação. Agora não resta dúvida: o ministro presidente faz uso de outra palavra para definir a mesma ousada tarefa. Para ele, os membros da Corte não são reitores nem pedagogos da sociedade. São editores. E o são com agrado geral da Corte porque não apareceu um só para dizer diferente.

A orientação “editorial” do STF está em consonância ou fornece regência à linha dos grandes veículos da mídia militante e a ela não escandalizou. Sabe por quê? Porque esta só receia o fantasma da censura da direita; censura da esquerda, real e evidente, é feita dentro de casa mesmo, ora essa. Daí o silêncio ante a analogia formulada pelo ministro. Note-se que para não deixar dúvida sobre o sentido dessa simetria, o ministro falou que tais jornalistas editores, cada um no seu quadrado, atuam como censores do trabalho dos colegas.

O “inquérito do fim do mundo”, dito inquérito das fake news, o eterno compadrio com o Senado Federal, a fala do ministro e a indulgência plenária concedida pela mídia militante são sinais de uma rejeição ao resultado das urnas de 2018. Ele afetou o juízo de muita gente.


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* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.



 


Antonio -   02/08/2020 21:14:35

Pela confissão de Toffoli, o Brasil não é uma democracia (governo do povo), mas uma ditadura cujos ditadores são os ministros do STF. Cadê as FFAA para garantir a nossa democracia constitucional?

Luiz R. Vilela -   31/07/2020 19:34:03

O falecido Assis Chateaubriand, dono dos desaparecidos Diários Associados, em certa ocasião, demitiu um jornalista, seu funcionário, por ter escrito uma matéria que era contrária ao pensamento dele, patrão. Como o jornalista era um "medalhão", tinha muitos amigos na política, foram pedir ao velho, que reconsiderasse a decisão. Ele encerrou o caso, dizendo apenas o seguinte: "Quem quiser ter opinião, que tenha um jornal". Encerrou o assunto, no jornal dele, só valia o que ele sentia. Sabe-se muito bem que a tal liberdade de expressão, só pode ser usada pelo patrão, empregado tem que seguir a linha editorial do veículo, ou ir arrumar emprego em outro lugar. Acontece que nas empresas privadas, o poder de decisão é do dono, é o proprietário e responsável por tudo na sua administração. E no poder público? Agora também tem dono? Só pode ser publicado o que uma casta de privilegiados permite? Os onze do pretório, agora também se acham onze "Luís XIV",? O estado é eles? É assim que estão usurpando os poderes da república? Já não integram mais uma corte constitucional? Passaram a ser a polícia dos "bons costumes"? A ingerência chegou a tal ponto, que um ministro proibiu a atividade policial nas favelas cariocas. Se a polícia não pode combater a criminalidade, é reconhecido o direito dos criminosos terem a sua própria lei? É a anistia antecipada pelos crimes que são e serão cometidos nestes locais? A coisa esta ficando perigosa, a criminalidade aumenta a olhos vistos, e os responsáveis pelo seu combate, cada vez mais encastelados nas sua vaidades. O Brasil não é um pais. É uma fraude.

Reuvaldo Antônio Vasconcellos Ferreira -   31/07/2020 19:21:11

Penso que o silêncio das mídias militantes se assemelha "a tirar a serpente do cesto com as mãos dos outros". As medidas adotadas pelo STF, no inquérito "fake news" das "fake news", contra as contas de apoiadores do PR Jair Bolsonaro, interessa as mídias militantes uma vez que o pensamento da direita está afetando o "prestígio" delas e monopolizando opiniões favoráveis ao governo federal, inimigo comum. A liberdade, independência e autonomia das opiniões dos usuários nas redes sociais, indiferente ao que publicam as mídias militantes não convém aos seus negócios, aos jornalistas da esquerda que povoam as redações ou a quem os apóia. As mídias militantes se calam diante das ações do STF uma vez que não poderiam, por elas mesmas, inibir e combater a instantaneidade e a força das opiniões geradas nas redes sociais.

Hermes Ribeiro -   31/07/2020 18:13:13

Estou de acordo com o texto, temos uma necessidade grande de mais cabeças pensantes com coerência, ética e moral.

Menelau Santos -   31/07/2020 16:37:26

Ótimo texto Professor e perspicaz. De fato, é a confissão. E sem rodeios. Se através do "mensalão" e do "petrolão" o PT se apossou da riqueza do Brasil, esse mesmo PT e sucursais (PSOL, PC DO B, REDE, PSDB) estão tentando se apossar da opinião e do pensamento brasileiro através do STF. É o fim da picada.

Regina Campos -   31/07/2020 15:50:02

Está explicado porque não respeitam a constituição. Estão a editá-la, constituintes auto eleitos, assim como editam a realidade, de modo a ajustar o mundo ao seus próprios interesses. Napoleão de hospício perde em megalomania.

José citolin -   31/07/2020 13:08:30

Muito bom seu comentário! Tenho admiração pelo conteúdo e forma de expressar!

Lourival Souza -   31/07/2020 12:20:36

O Censor excelso!Esquece que o Editorial reflete a opinião do dono do jornal e não do editor.No Brasil o dono é o povo e não o STF