• Percival Puggina
  • 28/08/2019
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DALLAGNOL NÃO É MEU AMIGO, MAS...

 Não. Ele nem sabe que eu existo. Mas mexeu com ele, mexeu comigo. E vale o mesmo para o juiz Sérgio Moro e para a Lava Jato como um todo.

O trabalho de combate à corrupção desenvolvido por todos os que participaram e participam da força tarefa tem um valor capaz de garantir nome de rua e monumento na praça. A Lava Jato, graças ao trabalho de seus procuradores, dos policiais federais, do juiz Moro e seus sucessores representa o mais extraordinário salto ético no ambiente judicial, político e nas relações de poder no Brasil.

Agiram com plena consciência dos riscos a que se expunham. Sabiam que as condenações, as prisões, os aplausos que recebiam e recebem da sociedade brasileira fariam desabar sobre eles ciúmes cômicos e iras cósmicas daqueles a quem falta brio e brilho. Não se toma dinheiro de organizações criminosas sem pagar por isso. No submundo do crime, coisas assim acabam em saco plástico na cabeça e esquartejamento. No grande mundo do crime, as estratégias não são mais brandas: a vítima vai ser despedaçada por outros modos, jogarão um saco plástico sobre sua voz, cuidarão de desfazer seus feitos e atacarão o que mais apreço lhe merece: seu patrimônio moral, sua família e assim por diante. Na ribalta da comunicação social não faltam gangsteres para executar esse trabalho sujo.

Também no mundo trevoso das instituições nacionais há quem se deslumbre com argumento de bandido. Há quem fique indignado quando algum juiz destemido condena frequentadores dos grandes salões, e mais ainda quando audaciosa ordem de prisão é expedida.

          Faz sofrer, como brasileiro, a consciência de que heróis nacionais estão sendo atacados por personagens que entrarão para a história como pombos de estátua. Aparecerão nas fotos sujando os homenageados.

Como são pequenas essas almas que se contorcem em sentimentos tão vis quanto inveja e ciúme. Por mais rebuscada que seja a retórica, ela não oculta a expressão das faces.

Incomoda-me, então, a sensação de que Deltan Dallagnol está ficando ao relento. Isso é inaceitável. Não, Deltan não é meu amigo, mas mexeu com ele, mexeu comigo.


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* Percival Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


 


Giovane -   30/08/2019 18:04:17

Parabéns pelo excelente artigo. Este é um blog cujo nível dos leitores é medido pelos comentários, de fato nunca vi um blog com a qualidade dos comentários aos quais me deparo aqui. É em lugares assim, que ainda consigo ter fé na humanidade, na inteligência e civismo. Atributos que andam escassos atualmente. Parabéns aos comentaristas.

Vicente Lino -   29/08/2019 01:38:53

Extraordinário. Pena que outros da imprensa não tenham a sua coragem, sua dedicação e seu amor ao Brasil. Parabéns Mestre. O Brasil que trabalha precisa de exemplos como os seus.

João Jesuino Demilio -   28/08/2019 19:46:12

Assertivo como sempre...Parabéns! Seriam minhas palavras se não fossem suas..Dallagnol também não é meu amigo...mas o considero como se fosse!

Guilherme Socias Villela -   28/08/2019 14:48:31

Arguto e magistral, como sempre!

Luiz R. Vilela -   28/08/2019 14:46:59

Lá na Roma antiga, ainda na fase republicana, dizia o senador Marco Túlio Cícero ao também senador Lúcio Sergio Catilina, "até quando Catilina, abusarás da nossa paciência". Esta citação antiga, com mais de dois mil anos, poderia ter sido dito ontem, aos ministros da segunda turma do STF, pelo povo brasileiro. Senhores ministros, até quando vossas excelências, abusarão da nossa paciência, inventando normas inexistentes em processos penais, para livrar a cara de corruptos comprovadamente culpados. O que aconteceu ontem no STF, é gravíssimo, dizem os juristas que se for criada jurisprudência, se foi a lava jato. Criar exigências novas, quando o processo já esta em fase final de julgamento, é ai sim ser totalmente tendencioso e se posicionar ao lado de uma das partes. É um escárnio com quem trabalha e paga imposto neste pais onde a vergonha é uma mercadoria muito escassa. Não é, senhores ministros da segunda turma? Parece que descobriram o mapa da mina, o Bolsonaro ao ter entendimentos com o presidente do STF, para proteger seu filho, parece que deu a senha para que os acontecimentos estranhos, viessem com toda força. Até a pouco, era eu um dos brasileiros crente na nova ordem, mas já me desiludi, o Brasil começou a voltar ao seu estado natural e não será surpresa alguma se Moro e Dallagnol, passarem a ser considerados os reais bandidos dos acontecimentos. O Sergio Moro, já esta pendurado no pincel, tiraram-lhe a escada e o Dallagnol já começa a ser tratado como alma penada, a impunidade esta triunfando, e seria bom que em Brasília se erigisse também um "arco do triunfo", para celebrar a vitória da insensatez contra os propósitos da cidadania. As críticas mais contundentes e verdadeiras, estamos vendo agora, sempre vieram da França e acho que já devemos nos preocupar com 2022, daqui pra frente, nada será diferente.

José Reis -   28/08/2019 12:56:04

Belíssima e verdadeira reflexão.

Menelau Santos -   28/08/2019 12:04:21

Um anjo do mau percorreu o mundo e, chegando à presença de Deus, conclui que todas as pessoas são más, embora façam alguma coisa boa de vez em quando. Um anjo do bem também percorreu o mundo e, à presença de Deus, concluiu que todas as pessoas eram boas, apesar de eventualmente terem pensamentos maus. Deus então concluiu, o mundo é o espelho dos olhos de quem vê. O Sr. consegue extrair sempre uma coisa boa em meio à críticas. Estamos esquecendo todas as coisas boas que Deltan trouxe ao Brasil, e ficando só com as coisas negativas. Muito obrigado pelo excelente texto Professor.

Odilon Rocha -   27/08/2019 23:54:29

Caro Professor Nunca, nunca mesmo, talvez voltemos a assistir o que de fato se passa neste país. Quem não acompanhou, vem acompanhando ou se mantém em uma neutralidade covarde, ainda que respeitemos o livre arbítrio de quem assim deseja se manter, mal sabe o momento ímpar em que as forças do bem, surradas, vilipendiadas, desacreditadas, saem da ponta do ringue e acertam em cheio um gancho de direita no queixo empinado, arrogante e cínico daqueles que se dizem progressistas, na realidade, regressistas, de mãos dadas com o mal. E o momento é inusitado, aqui e no mundo.