• Percival Puggina
  • 19/01/2018
  • Compartilhe:

DA MENTIRA COM TORCIDA AO ESPLENDOR DA VERDADE

 

“Todos têm direito à própria opinião, mas não a seus próprios fatos”. Daniel Patrick Moyniham

Em 1980, a jornalista Janet Cooke trabalhava na seção de temas "Semanais" do Washington Post. Para ali ingressar, inflara significativamente seu nível de formação profissional. Nessas condições, escreveu um artigo - "Jimmy's World" - no qual relatou a surpreendente história de um menino de oito anos que se tornara dependente de heroína, levado a tal condição pelo namorado da mãe. A história causou comoção nacional. Enquanto ela "preservava sua fonte" (o caso inteiro era uma invenção narrada com extraordinário talento), as autoridades se empenhavam, inutilmente, em procurar pistas que levassem à criança. Dentro do próprio jornal surgiram dúvidas sobre a veracidade do relato. A direção, porém, bancou a funcionária e sua matéria. Candidatou-a ao cobiçado "Pulitzer Price for feature writting" (textos de especial interesse humano). Eram negros, o menino, o namorado da mãe, a mãe e a jornalista. O principal postulante do prêmio para a autora de Jimmy's World dentro da comissão de seleção era um militante negro, interessado em revelar aos brancos a realidade das drogas na comunidade negra.

Janet Cooke ganhou o mais cobiçado troféu do jornalismo norte-americano, mas foi desmascarada, dias depois, porque a divulgação de seu perfil profissional fez com que a universidade onde obtivera o bacharelado suspeitasse de tudo mais que ela dissera sobre si mesma. E a teia das mentiras foi se rompendo. O Post divulgou o que ficara sabendo, extraiu a confissão da moça, e pediu a retirada do prêmio.

Há mentiras muito mais graves sendo contadas em nosso país. Estão acobertadas pelo direito de mentir conferido aos acusados e são referendadas pela multidão que depende fisiológica, financeira, psicológica, política e ideologicamente de que elas sejam acolhidas e se propaguem. São mentiras tão relevantes que poderiam ser classificadas como institucionais. Determinam fatos políticos. Geram enorme círculo de conexões cuja ruptura põe em risco sistemas e esquemas. Estimulam uma densa solidariedade que, primeiro, sai a pichar muros e colar cartazes e, depois, atiçada a adrenalina, passa a prometer fogo e fúria.

Poderia estar relatando qualquer item de um verdadeiro catálogo de mentiras envolvendo a corrupção do ambiente político em nosso país. E isso, certamente, não surpreenderá o leitor. Nenhum corrupto desses de mala de dinheiro, conta na Suíça, offshore no Caribe, chegou a tal estágio sem, antes, ter sido um competente mentiroso. E a mentira, à qual damos tão pouco valor, é gravíssima forma de degradação moral por corromper esse bem precioso que é a verdade.

A infame corrente de males desencadeada pela mentira é bem mais sinistra do que se possa depreender da simbologia infantil representada por Pinóquio. Ela se agrava com os reforços retóricos construídos mediante sofismas (que corrompem a razão) e com calúnias e difamações que lançam sobre a honra alheia as indignidades do mentiroso.

Felizmente, a exemplo do que aconteceu com a senhora Janet Cooke, o que se esconde na penumbra das conspirações um dia chega às manchetes e a verdade vem à tona. E não como flutuante achado lúgubre de filme de terror, mas esplendente como um anjo dourado no alto de seu campanário.


_______________________________
* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

 

 


Marco Antonio Longo -   22/01/2018 00:41:39

Professor, Mario Vargas Llosa escreveu o romance A Guerra do Fim do Mundo, a respeito de Canudos. o chefão político baiano do romance, Barão de Canabrava, expressou a frase, reproduzida abaixo, durante um diálogo com um jornalista, a qual se encaixa muito bem no seu artigo:"Desde que me afastei da política, quase sempre digo a verdade. O que quer saber?"

FABIO -   21/01/2018 19:35:13

Gostaria de sentir o mesmo otimismo expresso nesse texto. Infelizmente as brumas que cobrem o Brasil não me permitem chegar às suas conclusões. Acho que morrerei sem usufruir de um país onde prevaleça a verdade. Estamos nos acostumando com os sabujos e impostores. É uma pena.

Celso Pompermaier -   21/01/2018 13:18:57

Caro amigo Puggina, bom dia. Como sempre um profundo e sensato artigo, dedo na ferida, tão verdade, os comentários acima. Tenho certeza, pelas decisões anteriores prolatadas a 8ª Turma do TRF4, irá continuar a fazer justiça. Único medo é, depois, lá prá cima. Abraço.

Aldorindo Antonio Colvero -   21/01/2018 09:53:40

A coisa está tão séria, que é impossível assistir televisão, principalmente noticiários e comentaristas comprometidos com a mentira. Minha preocupação hoje é garimpar nomes para decidir meu voto nas próximas eleições.

José Nei de Lima -   20/01/2018 22:10:55

Uma grande mentira hoje se torna uma grande verdade, por isso que o país não cresce, falta vontade não só nos políticos mas sim em relação ao Povo em geral que cai no ciclo vicioso da impunidade e o famoso cheitinho brasileiro, vamos acordar e prestar atenção nos oportunistas de plantão, um grande abraço amigo que Deus vos abençoe e ilumine sempre amém.

ALCIDES POLIDORO PERSIGO -   20/01/2018 19:27:06

Ok. Percival. Devemos listar, para não esquecer, todos os maus políticos. Nos unirmos em campanha ferrenha, para que sejam cassados, confiscados seus bens, presos. Acabar com o Foro Privilegiado. Peço a Deus que te proteja sempre e te de força e coragem para denunciar os maus políticos partidários.

André Ambrosio Abramczuk -   20/01/2018 19:10:18

Esse artigo me lembrou uma frase do Martin Luther King: "O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética... O que me preocupa é o silêncio dos bons." Nesse agito todo em torno do 24 de janeiro, a escumalha petista está desrespeitando a lei, clamando contra as instituições, pois para essa corja só existe democracia se da minha boca sair o que é do interesse dela.

Flauri Migliavacca -   20/01/2018 18:24:19

Extraordinário como sempre Percival....texto até com dedicatória explícita aos que mandaram e roubaram este país com o aval da pobreza de espírito e a esperteza deslavada dos mandantes do PT. Você vai buscar os exemplos que já foram detonados pela verdade como este da jornalista Janet Cooke, do Washington Post e que pra nós brasileiros com a mente SADIA ainda, aguardamos seja colocada na mesa da justiça pela segunda vez a condenação da MENTIRA pelos 3 desembargadores do TRF 4 no dia 24, confirmando de pleno o maior e mais contundente JUIZ que este Brasil viu nos últimos anos......Deus faça estas cabeças brilharem para que as mentiras possam começar seu declínio de crédito. Sou seu fã...Obrigado

João Carlos Biagini -   20/01/2018 16:00:39

Os seus texto são e estão maravilhosos. Parabéns!

Rogério Nunes -   20/01/2018 15:45:18

Exatamente. Na era do "fake news", da desonestidade intelectual virtual ou não, mentiras são propagadas na velocidade da internet e alçadas à condição de verdade, por grupos interessados e absorvidas por uma multidão de credulos, inocentes ou não.

Antonio Fernando Bassotelli -   20/01/2018 14:43:43

Excelente artigo que analisa profundamente, mas com suavidade, os engodos a que nossa sociedade esteve sempre submetida, mas que nos dias atuais assume proporções assustadoras.

Joma Bastos -   20/01/2018 14:09:50

Corrupto e/ou criminoso uma vez, corrupto e/ou criminoso para sempre. Para que a atual situação caótica e suja da política do pais não se repita, temos que proibir a todos os indivíduos já criminalmente condenados de assumirem para sempre um cargo político ou de gestão pública. Há que definir escrupulosamente, que qualquer político ou gestor público na situação de arguido criminal, tem que ser suspenso imediatamente de seu cargo. Também há acabar com o Foro Privilegiado, para que criminosos políticos e do judiciário não se escondam atrás dele. E também há que estipular que todo o mundo deva ser julgado inicialmente em um tribunal de primeira instância. Temos muita gente responsável neste país, com boas qualificações e com boa ética e moral para exercer com idoneidade qualquer cargo político ou de gestor público. Para cargos políticos ou públicos em geral, não necessitamos de arguidos criminais, nem de gente já criminalmente condenada. Necessitamos de gente criminalmente limpa, desde um Presidente da República até a um simples Vereador.

Juan Koffler -   20/01/2018 13:48:21

Acabo de republicar seu artigo em minha página (grupo fechado) do Facebook: "Sociedade & Humanismo", recém criada para discussões sérias sobre temáticas críticas da atualidade.

Juan Koffler -   20/01/2018 13:39:22

Belíssimo e emblemático texto, meu caro Puggina! Felicitações efusivas e mais que merecidas! Há algum tempo publiquei um artigo em torno do mesmo tema: "A mentira institucionalizada" (em espanhol). Curiosamente, não teve a repercussão que eu esperava. Pelo visto, nossa sociedade hodierna não aceita ser desmascarada em público. Seu alvo foi efetivamente certeiro e mais que pontual, nestes tempos de "mentira institucionalizada", tantas vezes repetida que acaba sendo reconhecida como "verdade verdadeira". Aliás, me permita dizer-he que você se aprimora a cada dia. Quem sabe, sabe! Forte abraço!

Genaro Faria -   20/01/2018 11:48:26

As pernas da mentira afundaram no lamaçal do crime. Só quem acredita na própria mentira ainda pensa que o golpe comunista pode instalar um regime totalitário no Brasil sem que a nação perceba. Venezuela e Bolívia já mostraram a caricatura macabra por trás da fantasia da utopia socialista. Vivemos aqui um momento crucial de nossa história. Para o bem ou para o mal, o Brasil não será mais o mesmo depois dester 2018. E o RS é a nossa encruzilhada. Viva o Brasil!