• Percival Puggina
  • 20/06/2018
  • Compartilhe:

CORRUPÇÃO MAIÚSCULA, DEMOCRACIA MINÚSCULA


 

Leio no jornal: Dilma e Aécio lideram pesquisa para senador em Minas Gerais.
Deu pra mim. Fui!


Voltei! “A ditadura é muito melhor, só que é pior”, talvez exclamasse um amigo que gosta de construir frases surreais. De fato, se você quer pôr ordem numa confusão de cabaré como essa aí acima, mais fácil e eficiente do que conversar com o eleitorado mineiro é apelar para o sujeito com cara de caminhão off road, parado lá na porta. Sim, democracia é coisa complicada. E fica muito mais enroscada quando não há mínimos consensos éticos, quando o sistema político é pouco ou nada racional, quando os agentes do processo ou são omissos ou desonestos, e quando os eleitores, tanto quanto os agentes, se regem por critérios imperdoáveis.

O presidencialismo agrava as dificuldades. Ao entregar todas as fichas e assegurar quatro anos de mandato ao presidente, ainda que sua gestão seja uma catástrofe, a nação se expõe a uma situação que nem empresas familiares toleram! Cria instabilidades que derrubam o PIB, as bolsas e desvalorizam a moeda. Como submeter uma sociedade complexa, com mais de 200 milhões de habitantes, a governos – quaisquer governos – que não podem ser destituídos, ainda que ineptos e desastrosos? Onde mesmo o impeachment de um governo criminoso envolve prolongada crise?

Por outro lado, a irrestrita criação de partidos políticos como sublime expressão do pluralismo, tolice bancada em 2006 pelos doutores da lei do STF, franqueia a porta do poder para aproveitadores que inventam legendas cartoriais e as transformam em rentáveis empreendimentos. Ora, a formação de maiorias parlamentares é questão central do jogo político e da governabilidade. Os processos eleitorais brasileiros, no entanto, vêm proporcionando minorias cada vez menores, cuja existência custa caro ao país e cuja agregação para formar bases de apoio se inclui entre as mais repulsivas e vacilantes tarefas de quem governa.

Cada vez mais, o ambiente político nacional se afasta das grandes pautas que deveriam interessar ao desenvolvimento econômico e social para se perder em retórica e propaganda. Os próprios eleitores não se ajudam: vão às urnas dissociando o governante que escolhem do parlamentar em quem votam, como se o segundo não fosse indispensável ao sucesso do primeiro.

Como regra, o eleitor vota num governante para que cuide do país, segundo suas convicções, e escolhe um parlamentar para defender seus interesses pessoais, corporativos ou setoriais. Inevitavelmente, essas duas tarefas se contrapõem, pois o parlamentar só pode cumprir a sua gerando ônus ao setor público e agindo contra a conveniência nacional. Isso é moralmente inaceitável! Parlamentares deveriam ser representantes de opinião e não de interesses.
Eleitores incapazes de perceber os desvios a que são conduzidos pelo critério eleitoral do interesse próprio afundam num paradoxo: julgam normal eleger alguém, pago pela nação, para cuidar de si, para legislar e negociar em seu benefício, mas se escandalizam quando os eleitos, orientados pelo mesmo norte moral, passam a cuidar de si mesmos, dos seus negócios e de suas próprias fatias no bolo do poder e dos impostos que todos pagamos.

Uma democracia tem a racionalidade de suas instituições e a força dos consensos éticos da sociedade.

 

* Percival Puggina (73), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o Totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil, integrante do grupo Pensar+.
 


Rossini -   01/07/2018 01:41:25

De fato, a democracia é complicada (venho compreendendo isto com o Sr) para entender e exercer. Estamos a mercê dos demagogos. Ainda mais quando há a obrigação de votar, entendendo ou não da coisa. Na verdade, eu penso que o brasileiro não se sente responsável pelos políticos eleitos. Ele lava suas mãos no mesmo instante em que pressiona a tecla verde. Pessoalmente, acredito na democracia e na importância das instituições políticas. Mas o atual sistema brasileiro exala ilegitimidade desde suas bases. E meu pai, seguindo o pragmatismo do menor dos males, recorda-se com saudosismo da ditadura. Não é preciso ser vidente para saber em quem ele vota no próximo pleito! Vamos dar a Cesar o que é dele. Mas será que é mesmo só dele? Difícil a tarefa de melhorar a política a partir de dentro! Seu artigo inspira perguntas inquietantes!

Ary Txay -   23/06/2018 15:22:08

Esses obstáculos encontrados na democracia são insuperáveis no curto prazo. Não por acaso o Fidel Castro desprezava tanto a democracia .

Marco Z -   22/06/2018 20:50:15

Tanto se fala ...."vê se vota certo, o voto é a arma do povo e etc". Em pleno 2018 a maioria não entende básico, relação executivo/legislativo. Exemplo prático é Marchezan, prefeito de Porto Alegre. Sem entrar no mérito se é bom ou ruim, cito como exemplo. No executivo elegem PSDB , já no legislativo elegem 1 vereador do PSDB e 4 pro PP (partido coligado). Dos 36, tem apenas 5 vereadores da coligação. É o voto esquizofrênico, escolhem alguém pra mudar a atual administração enquanto elegem bancada que bloqueia os projetos de mudança. Por isso muitos , em total desesperança, apelam a ditadura porque por via democrática mudará como? De um lado, sistema político/judicial podre, do outro um bando de eleitores que são totalmente ignorantes e/ou só pensam no próprio umbigo.

mario m -   22/06/2018 00:17:33

Excelente, Puggina. ´É a nossa realidade.

estado mínimo -   21/06/2018 17:44:29

Perfeito. Só para reforçar, segue um comentário de Thomas Sowell: . "Se você vota em políticos que lhe prometem benesses com o dinheiro dos outros, então você não tem o direito de reclamar quando eles tomam o seu dinheiro e o distribuem para terceiros, inclusive para eles próprios."

Fernando A. O. Prieto -   21/06/2018 13:27:52

Como escolher candidatos para votar, já que todos dizem praticamente a mesma coisa ("que darão prioridade à educação, saúde, segurança, etc") e temos a expectativa, por experiências passadas, de que não farão nada disto se eleitos? Então, escolhamos os novos? Quem garante que não serão, se possível, iguais ou ainda piores (embora isto seja difícil de acreditar, "nada há tão ruim que não possa piorar"). E o tão-falado"idealismo da juventude"? Nunca passou de uma lenda; nenhuma idade humana tem o monopólio da bondade ou da maldade... Por absoluta ausência de outros critérios, é minha opinião que devemos levar em alta conta como um dos fatores principais da escolha, o passado concreto e verificável do candidato: Desempenhou bem seu trabalho na área profissional? É recomendável como exemplo em dedicação ao trabalho, ou só pensa em coisas ligadas ao lazer, como viagens, carnaval, festas, futebol,...? Se ele não se sair bem nesta avaliação e não der prioridade ao esforço próprio dirigido para fins úteis, certamente não é adequado para receber nosso voto, qualquer que seja a afinidade que tenha conosco (filosófica,ideológica, religiosa, emocional, ... É essencial também que se pronuncie, durante a campanha, sobre temas importante para o país (exemplo: reforma da previdência, fim dos privilégios e altos salários e adicionais do funcionalismo público mais graduado, etc). Creio que nenhum candidato deve se omitir em dar opinião sobre esses e outros temas.