O sujeito viu o muro de Berlim ser construído e tinha certeza de que o lado de lá era tudo de bom. Torcia pela URSS nas copas do mundo. Carregava sempre um caderninho com frases de Mao Tse-Tung. Admirava os Viet Congs e os Khmer Vermelho. Comemorou o sequestro de Aldo Moro pelas Brigate Rosse. Vestiu, lavou, secou e vestiu de novo sua camiseta do Che. Colou uma foto do Danny le Rouge no guarda-roupa. Sacudiu bandeirinha de Cuba. Passou uma temporada lá, em 1969, colhendo cana para atender ao apelo do camarada Fidel. Teve arrepios cívicos quando a cadelinha Laika subiu para a turnê da tecnologia soviética no seu canil espacial. Vociferou contra a Primavera Húngara de 1956 e a de Praga em 1968. Aplaudiu as ações dos tanques chineses na Praça da Paz Celestial. Todo ano, no dia 11 de setembro, faz feriado e bebe espumante. Varou o inverno acampado na frente da PF de Curitiba. Cumpriu a agenda direitinho.
Nunca esteve só. Muitos, como ele, dedicam a vida a argumentar em favor do comunismo e do caráter científico e inevitável do socialismo. Como professores, políticos, jornalistas, religiosos, intelectuais ou simples militantes partidários, gastaram seu latim e seu português em apontar e condenar as “insuperáveis contradições” do capitalismo e da economia de mercado. Capturaram corações e mentes. Fizeram (e perderam) todas as apostas possíveis na superioridade ética e técnica das teses esquerdistas.
Dá para ter noção, leitor, do pesadelo em que se transformou a vida dessas pessoas nos últimos anos? Seus porta-vozes e líderes têm sido tipos como Lula e Dilma, o casal Kirchner, Hugo Chávez e Nicolás Maduro, Daniel Ortega, Evo Morales, Rafael Correa. Você procura uma democracia construída sobre suas idéias e não encontra. Um livro que junte os cacos e reorganize consistentemente sua visão de mundo sobre as bases daquela crença? Nada. Um estadista de boa estirpe para seguir? Ninguém aparece. Para arrematar, os eleitores norte-americanos elegeram Trump e o Brasil deu vitória a Bolsonaro.
É dureza! Na contramão, as idéias que combateu retiram inúmeras nações da fome e do atraso. As economias abertas alcançam níveis consistentes de desenvolvimento social. Todos os modernos e bem sucedidos estados nacionais aderem à democracia representativa, ao pluralismo e viabilizam amplas liberdades públicas.
Até a China, do comunismo amarelo e vermelho, adotou o capitalismo e pôs em curso um dos mais espetaculares saltos econômicos e sociais que a humanidade já observou. Do comunismo ficou o pauzinho do picolé: a ditadura. E, com ela, a mal explicada história do Covid-19.
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* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
Juan Albornoz - 02/04/2020 05:53:46
Clarissimo e verdadeiro, e dai? O que se faz para acabar com o virus do comunismo? Ele é transmitido pelos professores, artistas, imprensa; prospera em ambientes cultos e ignorantes, é resistente à lógica, se infiltra nos sistemas, nas instituições, nos três poderes, nas três esferas do poder, não pode ser eliminado porque é concursado. Em fim, que se faz?Menelau Santos - 25/03/2020 00:44:25
Uma linha do tempo fantástica.Alexandre Azevedo - 23/03/2020 18:15:11
Excelente, mestre Puggina!felipe luiz ribeiro daiello - 22/03/2020 21:02:25
Brilhante como sempre. Para ser lido na Academia e acabar com os vírus ideológicos.Odilon Rocha - 21/03/2020 21:10:43
Caro Professor Não pude conter uma boa gargalhada da sentença “arrepios cívicos”. Esse pessoal é demais! Cegos pela seita, devem carregar consigo um escapulário cujo santinho se faz desnecessário apontar. Imagine o altar em casa! A bíblia? Interpretada à luz do conhecimento paulo freiriano. E assim vagam pela humanidade, perdidos e iludidos. Como pode não se indignarem com o capitalismo dentro da China? Mistério.Elizabeth - 21/03/2020 10:05:15
Em tão poucas palavras descreveu que o comunismo é sinônimo de corrupção e ditadura disfarçada em socialismo. ????????????????????Guilherme S Villela - 20/03/2020 20:54:13
Magistral, como sempre.Carlos Edison Fernandes Domingues - 20/03/2020 18:45:50
PUGGINA Lamentavelmente o Presidente da Câmara de Deputados do Brasil, apressado em se declarar contra todo o Bolsonaro, enviou mensagem ao governo chinês demonstrando repúdio (expressão usual da esquerda) ao pronunciamento de um integrante da Casa, que ele preside e que deveria respeitar, ainda que não concordando. Este presidente da Câmara integra uma legenda chamada Democratas e representa mais de vinte partidos que recebem dinheiro dos cofres públicos. Na China o Congresso é de um partido só e democratas o Mao se encarregou de eliminar. O presidente da Câmara toma atitudes inadequadas e inoportunas só para se apresentar como se fosse primeiro ministro. Ele não respeita lo cargo que ocupa. Carlos Edison Domingues