• Percival Puggina
  • 02/04/2024
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A passividade do Legislativo golpeia a democracia.

 

Percival Puggina

       Em breve, o STF prosseguirá com mais uma das tantas tarefas que resolveu assumir, embora – por todas as razões da razão e do espírito da Constituição – sejam de competência do Congresso Nacional. Do alto de sua onipresença, onisciência e onipotência, o Supremo usará esses três poderes sobrenaturais, divinos, para o feito notável de definir quantos exatos gramas um maconheiro pode portar como limite máximo. Com o ar mais sério do mundo, os ministros ocuparão as cadeiras em torno da mesa e se ocuparão disso. Eu não sabia, mas há fumacinha na Constituição.

Os ministros dizem estar preocupados com a discricionariedade policial. No entanto, o que chamam de discricionariedade, eu chamo de experiência.  É experiência de quem está nas ruas e conhece as “bocas de fumo”. Mais do que a gramatura da apreensão interessa a ficha da pessoa abordada, o local da abordagem, o dinheiro que a pessoa tem consigo e sua atitude. A simples possibilidade de ser o usuário vitimado por um discernimento equivocado do policial que o aborde tem efeito inibidor no consumo. Dá argumento aos pais para orientar os filhos. Aliás, dispensada a experiência dos policiais, do ministério público, dos advogados e dos juízes diante dos casos concretos, toda a sociedade ficará exposta às consequências de uma decisão que o Congresso Nacional, sabiamente, não quis tomar e que a sociedade também rejeita por esclarecida maioria. No Brasil “progressista”, de fumaça e pó, a maioria é sempre a grande discriminada.

Em cinco ocasiões, o Legislativo se recusou a modificar o que está na lei: produzir, transportar, comercializar e consumir drogas é crime. Isso é lei de uma sociedade que entendeu o recado dos fatos a quem tem ouvidos de ouvir e olhos de ver: se está ruim assim, qualquer ato que possa ser visto como permissivo ao consumo será muito pior para todos. Aumentará a demanda e multiplicará os males decorrentes.

Enquanto se aguardam os votos faltantes no plenário do STF, a nação que leva o país a sério olha sem esperança e ilusão para o Congresso Nacional que vive a expectativa de mais um momento de submissão. A PEC 45/23 estacionou na Ordem do Dia do Senado Federal.

A omissão do Legislativo naquilo que lhe compete e sua passividade perante excessos do STF ferem o espírito da Constituição. Você pode ler este artigo e crer que estou exagerando. No entanto, examine a realidade da América Latina. Faça isso como quem vê a realidade a uma distância que o desconecte de seus gostos e desgostos e das figuras de nossa cena política. Faça as observações que proponho como se estivesse embarcado numa estação espacial para observar as ditaduras de esquerda que existem em nosso continente.

Detenha-se, então, nas realidades de Cuba, Venezuela e Nicarágua. Essas repúblicas, em acelerado empobrecimento, são unidas por um denominador comum: o Executivo nomeia e comanda o Judiciário. As ditaduras de Maduro e Ortega, que não são de partido único, como a cubana, valem-se do Judiciário para conter a oposição parlamentar e preservar tranquila a perpetuidade do grupo governante. As cortes inibem, coíbem e controlam a divergência nos parlamentos, caçam mandatos, impõem inelegibilidades e criminalizam quaisquer ações que representem risco à estabilidade do poder instalado. Impõem censura à comunicação social e instauram o crime de opinião.

Agora, dê uma olhada para o Brasil e responda a si mesmo: “Qualquer semelhança é mera coincidência?”.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 


Daniel Duarte -   06/04/2024 10:22:23

Professor, dói na alma assistir ao silêncio e submissão da classe política. É surpreendente, afinal, a oposição não é maioria? Assistimos apenas alguns deputados fazerem “barulho”. Fico me perguntando, se o silêncio dos demais é porque têm “rabo preso”? Caso a justiça brasileira fosse, efetivamente, Justiça, não seria o caso desta abrir suas gavetas e tirar esses “rabos” para fora?

Carlos Eduardo Medeiros -   04/04/2024 18:34:05

Como dissestes em outro artigo ainda há pessoas que tem esperança e lutam por ela. Para eles e para mim. A minha é uma migalha tão pequena que não me dá forças para lutar.

Afonso Pires Faria -   03/04/2024 16:12:36

É a nossa democracia sendo consumida de dentro para fora. Justamente por aqueles que deveriam estar lhe protegendo.

Menelau Santos -   03/04/2024 10:19:22

Se o STF está preocupado com a discricionariedade policial, a sociedade está muito mais preocupada com a discricionariedade dos deuses do STF. Deus nos proteja!

judson -   03/04/2024 10:10:10

Legislativo comprometido com dinheiro das emendas dá nisso. Estamos ferrados. Muito triste isso tudo!!!

IGNÁCIO JOSÉ DE ARAUJO MAHFUZ -   03/04/2024 08:26:54

Percival, Caro Mestre Puggina. SAÚDE E PAZ! Chê, triste e infelizmente, o congresso brasileiro (com letras minúsculas, claro...) é formado por uma maioria de elementos vis, fisiológicos, CORRUPTOS E VENAIS - verdadeiros eunucos morais. Por isso, os SINISTROS BANDIDOS TOGADOS DO STF deitam e rolam... Até quando esse descalabro? Fraternal abraço, Ignácio Mahfuz

Luiz R. Vilela -   03/04/2024 05:06:49

Infelizmente a nossa representatividade política, com raríssimas exceções, sofre de uma doença chamada "síndrome do rabo preso", pela qual torna inoperante qualquer desejo de contrariar certos interesses poderosos, por medo de sofrer retaliações. A patologia tem acometido as representações tanto na esfera federal, estadual e municipal, fazendo com que os detentores do "rabo" alheio, se encham de razões e poder. se tornando senhores de todas as vontades. O medo se espalha, quem tem culpa no cartório, não peita quem pode julga-lo, e assim entrega qualquer poder que tenha, torna-se uma nulidade, é o que se vê atualmente. O que fazer para mudar? É difícil responder, talvez quem sabe, apelando ao todo poderoso, porque os poderosos daqui, estão batendo cabeças.

Paulo Dias -   02/04/2024 20:53:57

Enquanto não resolverem os limites dos ministros do esseteefe, do presidente do Senado é da Câmara.......

D. L. GODOY -   02/04/2024 17:28:32

Plenamente de acordo.