• Percival Puggina
  • 07/02/2021
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A PARTEIRA DO ATRASO

 

Percival Puggina

 

 

         Aprendi de guri que os alunos mais dedicados aos estudos eram aqueles que disputavam – disputavam mesmo – os primeiros lugares da turma. Eu não estava em nenhuma competitiva e estressada metrópole capitalista.  Ninguém na turma sonhava com ser um figurão entre os tigres asiáticos ou em Wall Street. Éramos apenas meninos e meninas dos anos 50, em Santana do Livramento, no extremo sul do Brasil. Mas estudávamos muito e disputávamos notas. Nota ruim forçava a busca de nota melhor na prova seguinte, chamada “sabatina” (embora fosse mensal).

         Aquela experiência escolar, vivida no antigo curso primário – hoje ensino fundamental –, em escola pública, valeu-me para a vida. Compreendi então, desde criança, que o progresso e o sucesso têm tudo a ver com esforço e quanto maior ele for, maior tende a ser o resultado. Foi o que me tornou adepto da valorização do mérito. A União Soviética, a extinta URSS, exigiu muito empenho dos Estados Unidos para acompanhar seus avanços tecnológicos na corrida armamentista e espacial. Por quê? Porque havia muita coisa em jogo. O resto do país era um retrato do fracasso comunista, mas havia na URSS um nível de excelência em torno dessas atividades.

         Cuba, não deixava por menos. Seus atletas costumam ser feras em competições internacionais. Por quê? Porque na sociedade cubana, na Cuba da libreta “provisória” de racionamento, que já conta 60 anos de existência, os atletas de ponta têm acesso a alimentos que o restante da população não consegue comprar. Nos países comunistas, o mérito esportivo alivia os penares da existência. Ademais, a vitória é instrumento de propaganda de regimes que sobrevivem à custa da propaganda. Resumindo: em países sob regime totalitário de viés marxista podem surgir áreas de excelência, mas isso só ocorre se há algo sendo disputado.

***

         Dirigente de um sindicato de servidores, em nota sobre o projeto de Reforma Administrativa enviada pelo governo ao Congresso, declarou: “Precisamos nos mobilizar contra essa proposta vergonhosa, que retira direitos dos futuros servidores públicos, com avaliações duvidosas para obtenção de estabilidade e aposta na meritocracia, prática antidemocrática e perigosa para a administração pública”.

       Ou seja, que tudo fique como está ainda que a sociedade permaneça superonerada e mal atendida. A avaliação de desempenho, tão comum nas empresas privadas, é habitualmente recusada no serviço público sob a alegação de que grupos diferentes e indivíduos diferentes são incomparáveis em suas circunstâncias, limitações e possibilidades. Todos deveriam receber um bom salário e ponto final. Confunde-se avaliação de desempenho com comparação entre pessoas.

         Não preciso dizer em que ponta do time joga a autora da declaração. Sua tese tem tudo a ver com o pensamento que subtrai quanto pode de quem produz muito e transfere para quem produz pouco até que ninguém produza mais (não estou negando a necessidade de políticas sociais). As consequências teoricamente previsíveis são bem verificáveis na vida real. Mas a tese tem penetração e acolhimento porque, apesar da profunda perversão que produz, se reveste com o manto de suposta justiça, bordado nas cores da benevolência.  No fundo, é a tal absorção da ideia de justiça pela de igualdade.

         Portanto, quando se automatizam as promoções funcionais, desvinculando-as do merecimento, quem resulta automatizada é a mediocridade. No mundo de qualquer época, a mediocridade é parteira do atraso. Queira Deus que o Congresso Nacional perceba que suas responsabilidades têm prioridade sobre seus interesses eleitorais!

* Publicado originalmente em Conservadores e Liberais, site de Puggina.org

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.


Odilon Rocha -   10/02/2021 01:44:00

Caro Professor Deus já fez tudo! Até a inteligência nos deu. O resto é por nossa conta. Aproveitando um acontecimento atual, enquanto os dois piores vírus da humanidade, o orgulho e o egoísmo, continuarem sem uma vacina que amenize, ao menos, os seus nefastos efeitos, nossos esperados anseios e angústias por dias melhores vão sendo postergados. Repito; a missão - e responsabilidade - é inteiramente dos homens.

Jose Luiz -   09/02/2021 17:59:14

O brasileiro é paradoxal, por um lado odeia os políticos e por outro lado adora as benesses do Estado. Acredita que o Estado pode prover tudo a todos, sem atentar que os recursos são provenientes dos bolsos dos contribuintes. O Estado inchado é o maior causador das desigualdades sociais, porque para manter é necessário mais e mais recursos. E onde vão busca? Arrecadando mais impostos. O governo não gera riqueza e sim subtrai na sociedade. Tremenda idiotice. Infelizmente no Brasil as coisas caminham assim: as mudanças na política virá pelo caos e não pelo consenso.

Paulo -   08/02/2021 16:22:15

Irreparável!

Jose Ricardo -   08/02/2021 15:55:45

O novo presidente da Câmara falou que amanhã (09/02) envia à CCJ o projeto da reforma administrativa, certamente nas sessões de discussões veremos novas cenas grotescas por parte daqueles que sempre apostaram no atraso e corporativismo. Mas não vamos nos animar muito, a reforma será muito menor que o necessário, mas será uma sinalização de como se comportará o governo Bolsonaro, pra se reeleger ele não poderá ser um Macri e nem Trump, deve entregar algo palpável pra sociedade e seu público e ao mesmo tempo atender o fisiológico centrão.

Raul José Ferreira Dias -   08/02/2021 15:33:18

Meu estimando Professor Puggina, Como sempre, os arautos do retrocesso e da mentalidade comunosocialista apenas querem manter os seus privilégios. Ao longo dos meus 42 anos de serviço à Força Aérea Brasileira, sofri avaliações anuais do meu desempenho, o que me levou a chegar ao posto de Major-Brigadeio-do-Ar. Para conhecimento, minha turma de Aspirantes-Aviadores de 1974 tinha o efetivo de 106 militares. Dez chegaram a Brigadeiro, seis a Major-Brigadeiro e apenas dois a Tenente-Brigadeiro. Assim o é nas Forças Armadas: somente dedicação, competência e mérito.

Sérgio Ilha Moreira -   08/02/2021 14:59:55

Sou teu leitor assíduo! Teus artigos são excelentes!

Lúcia Natal -   08/02/2021 14:08:46

Fantástico artigo. Claro e objetivo. Abraços.

Roberto Oliveira Flores -   08/02/2021 11:55:15

Fui funcionário público por 2 anos, após concurso. Essa avaliação de desempenho não vai dar em nada. Todos ganharão nota máxima.

ademir bisotto -   08/02/2021 11:54:26

O MESTRE SEMPRE PERFEITO. EXCELENTE TEXTO.

Nara Rosangela Rodrigues -   08/02/2021 01:53:00

Como sempre, excelente!

Osmair Roberto Neves -   07/02/2021 22:54:27

Presado senhor puggina ,seus artigos , palavras , pensamento São muito gostoso de se ler parabéns sou funcionário da USP Piracicaba um grande abraço