• Percival Puggina
  • 26/10/2008
  • Compartilhe:

A GOLPES DE ORTOGRAFIA

Ufa! Demorou quase duas d?das! O acordo ortogr?co entre os pa?s de l?ua portuguesa foi assinado em 1990, referendado pelo Congresso Nacional em 1995 e tivemos que esperar sentados, at?gora, para que finalmente entrasse em vigor. N?houve clamor popular nem marcha at?ras?a que acelerasse processo t?urgente e t?indispens?l ?oes?universal do nosso idioma. Cheguei a tentar uma greve de fome que se desmoralizou perante uma bomba de chocolate. Mas n?h?al que sempre dure. J?niciamos a contagem regressiva para janeiro de 2009, quando o acordo entrar?m vigor. E ent? conclu? a sutura no nosso corpo idiom?co, a “?ma flor do L?o, inculta e bela” resplandecer?erante o mundo seu uniforme encanto. E nossos beb? como os pequeninos de Portugal, passar?a ser beb?.. Preparemo-nos, ent? para a penosa tarefa de reaprender a escrever. Queriam o qu?N?se fazem past? de santa clara sem quebrar ovos, ora pois. ?um sacrif?o m?mo para solucionar problemas m?mos do nosso cotidiano. Toda santa vez que a gente folheava o jornal de Cabo Verde, o Jornal das Ilhas, ou o Not?as de Mo?bique, era aquele problem? A maldita falta de unidade ortogr?ca nos fazia indagar sobre o que seria uma jiboia, dado que da cobra jib?n?podia se tratar. Todos os textos de Guin?issau que nos ca? nas m? eram incompreens?is devido ?ania de escrever ac? em vez de a?. Contam-me que quem est?estejando a novidade ? Microsoft, cujo programa Word, dispensando certas varia?s idiom?cas, dar?ma boa simplificada no seu corretor ortogr?co. Nada se comparar?no entanto, ao conforto que me trar? amputa? do trema na palavra seq?ia. Na minha idade n?era mole subir quatro andares no teclado para pressionar aqueles dois pontinhos, saltar em seguida para o acento grave, e voltar ?pressas aos andares das letrinhas. Agora acabou. Escreveremos como todo cabo-verdiano. Fim das ironias. A quem interessar possa: considero esse acordo ortogr?co o c?o da falta do que fazer. Coisa de desocupados. Um amigo meu, sujeito desconfiado, desses que v?aldade em tudo, est?onvencido de que se trata de uma sinecura. “De algumas editoras? N? imagina...”, comento eu. O fato ?ue nunca t?poucos atrapalharam tanto, sem qualquer motivo s?o, a vida de tantos! Trata-se de uma agress?pessoal a dezenas e dezenas de milh?de pessoas que, em anos de estudo e com muito sacrif?o, automatizaram h?tos de escrita e escrevem o idioma conforme lhes foi ensinado. Ali? duzentos e trinta milh?de pessoas ser?afetadas pelo acordo e cento e oitenta milh?(quase 80%) s?brasileiras. A perversidade, levada ao grau m?mo, deu nisto: enche-se a paci?ia dos 100%. Com que direito? Para quem trabalha escrevendo ser? mesmo que, para os m?os, mudar a ordem das notas na escala. Em poucos dias haver?penas alguns indiv?os no planeta que saber?escrever corretamente no idioma portugu?– aqueles que criaram essa droga de acordo. Tudo que tenho redigido e arquivado ao longo de d?das, gigabytes de texto, ficar?rrado, inadequado ao consumo, validade vencida. Com que intuito se produz esse desperd?o de bilh?de exemplares de livros que de um dia para outro restar?anacr?os? J?maginou, leitor, quantas ?ores ter?que ser abatidas a golpes de ortografia para refazer todo o material did?co nacional? Ser?ue ainda n?d?ara abortar esse absurdo? Especial para ZERO HORA 26 de outubro de 2008.