• Percival Puggina
  • 17/05/2023
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A culpa dos inocentes, ou Sobre o abuso do poder.

 

Percival Puggina

         Fiquei na dúvida sobre qual o melhor título. Por isso, vão os dois.

Sei e dou de barato que o poder seja sedutor e, nem sempre, bom conselheiro. A lógica determina, então, que lhe sejam impostos arreios e freios, como se faz com cavalos chucros. O pior erro que uma sociedade pode cometer é facilitar, pela tolerância, a vida do poder chucro. A uma força assim, voluntariosa, empenhada em impor supremacia, jamais faltarão razões ou criação de fantasmas para, por conta própria, impor arreios e freios à sociedade e a seus representantes. Sem freios nem contrapesos, tem-se o poste rebelado, se me faço entender.

Aprendi de pequeno que os poderes devem ser limitados. Acompanhei, primeiro em preto e branco e, depois, a cores e ao vivo, a história da segunda metade do século XX. Vi nascerem como criaturas de canteiro ditaduras e totalitarismos. Nossa! Há entre elas um traço de união: a imposição, que logo se converte em impostura, de um reitor de fatos, normas e limites que se aplicam a todos, exceto a si mesmo e aos seus. Não há ideologia nisso. A ideologia, quando se manifesta, funciona de modo instrumental, como meio. Raramente como causa ou fim.

Indivíduos assim (tomo Stalin por referência) impuseram medo à sociedade, submeteram o Estado, usaram o poder para proteger sua imagem, exibiram como trunfo a própria arrogância, perseguiram opositores e os submeteram a penas infamantes. Ser opositor era um ato doloso por definição. A nenhum faltou apoio de indivíduos cuja covardia, fraqueza ou ganância era inversamente proporcional à temeridade e ausência de compaixão do líder.

Nem todas as tiranias são iguais, claro, porque dependem de circunstâncias históricas, ou seja, de fatores causais e casuais. O que descrevi, porém, é recorrente, permitindo identificar a realidade pela conduta dos agentes. Apelarei ao depoimento de um stalinista convicto e reconhecido – Bertolt Brecht.

Quando estavam em curso os Processos de Moscou, nos quais eram julgados supostos inimigos de Stalin, os comunistas mundo afora discutiam os casos. Numa dessas conversas em que o teatrólogo alemão estava presente, alguém comentou que muitas daquelas pessoas seriam inocentes, ao que Brecht contestou com uma frase terrível: “Quanto mais inocentes são, mais merecem ser fuzilados”. O autor desse relato é o filósofo esloveno Slavoj Zizek num texto com o título: Brecht: a verdadeira grandeza do stalinismo. Para Brecht, na interpretação de Zizek, a inocência dos acusados era reflexo do seu fascismo.

Pense nisso.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


MARCO ANTONIO GEIB -   18/05/2023 11:59:36

"A culpa dos inocentes, ou Sobre o abuso do poder". Mestre, a cada dia somos surpreendidos por fatos dignos dos tempos da Roma antiga, onde os "Césares Imperadores" jogavam, no Coliseu, seres humanos para serem mortos pelas feras, com a intenção de divertir o povo. A matéria publicada nos trás uma metáfora singular sobre o que ocorre no Brasil sobre tornar um país livre em comunista a exemplos da Rússia, China, Cuba, etc, etc. Claro, na nossa opinião, no local onde é citado o nome de STALIN seria um outro nome da política brasileira, que todos o conhecem sob o apelido de "XERXES" que sabiamente trocado pelo autor. Nós estamos passando um momento de extrema responsabilidade política, social e econômica onde onde já perdemos a "forças dos argumentos, as tentativas de persuasão ou dissuasão" também já cabularam. O horizonte só nos deixa uma solução muito cara o "enfrentamento", que se assim for feito, custará o sangue muitos brasileiros já dizia o Ex-Presidente João Figueiredo. Com certeza uma grande maioria do povo não está se divertindo como que ocorre. Fiquemos fazendo o "L" para ver onde iremos parar. abs....

Ivaldo de Holanda Cunha -   18/05/2023 09:41:12

Volto, mais uma vez, para elogiar porque merece, o nosso jornalista e muito mais coisas(brincadeira), que se chama Percival Puggina. Esse gaúcho de fibra, que me acostumei a ler e a admirar, tem esse dom de fazer-se entender por todos. Com uma linguagem simples, mas muito bem elaborada, nos faz deleitar. Sou admirador dos gaúchos. Tenho um netinho gaúcho, que agora está com 14 anos e promete muito. Torcedor do Grêmio. Por fim, parabéns.

Armando Micelli -   18/05/2023 08:16:03

Bom dia Percival. Muito oportuna esta sua mensagem. Na Alemanha, em 1935, tínhamos um presidente fraco. Chamava-se Hindenburg. Para manter-se na presidência nomeou Hitler primeiro ministro. Hindenburg caiu rapidamente e Hitler assumiu o governo. O exército alemão ficou calado. O resto desta terrível história todos nós conhecemos. Você faz um paralelo, sutil e brilhante, entre aquilo que vivemos hoje no Brasil com aquilo que já vimos passar. Abraços.

João Carlos Lopes -   18/05/2023 08:10:27

Versados em absolutismo, soberba, completamente a margem da Carta Magna, os togados atuais, exageram unilateralmente em decisões de pura vingança pessoal e partidarismos.

Eustaquio antunes ferreira das graças -   18/05/2023 07:41:32

Os Ditadores não tem limites..... e Psicopatas não tem sentimentos.....