• Gustavo Lopes
  • 31/12/2023
  • Compartilhe:

Um clube chamado Brasil

 

Gustavo Lopes 

        O ano que termina trouxe de volta velhas práticas ao cenário nacional. No entanto, diferentefmente de outras épocas, quando havia uma tentativa de esconder esse modus operandi, agora a certeza da impunidade permite que os sócios do clube falem abertamente sobre as vantagens de ser associado.

É claro que há diferentes níveis de associados neste clube, e isso depende de algumas questões como cargo que exerce, poder decisório e, claro, a amizade com a diretoria. Há o associado premium, que tem um programa de milhagens infinitas e pode viajar pelo mundo hospedando-se nos hotéis mais luxuosos, comendo nos restaurantes mais badalados, mobiliando a sede campestre do clube com os móveis mais sofisticados. Essa categoria é reservada ao presidente honorário do clube e sua digníssima esposa.

Há os associados VIPs, que exercem cargos no clube, porém sem a vantagem de morar na sede. É formado por uma catrefa deslumbrada, que também tem um programa de milhagens quase infinito, além de outras vantagens, como fazer parte de conselhos em estatais, que lhes permitem multiplicar enormemente seus salários, aos quais sequer fazem jus, uma vez que muitos dos cargos que ocupam sequer precisariam existir. Mas estão ali para alegria de um outro grupo: o trans-sócio, que se identifica como sócio, mas não é. Porém, é preciso mantê-lo com a ilusão de que o clube é para todos.

Há, claro, os membros da diretoria. Esses são os que mandam, de fato. A eles, além das demais vantagens, é facultado decidir as regras do clube. Sobretudo silenciar e perseguir os que acham que o clube é um abuso. Gente chata, cobrando coerência e vergonha na cara. Uns estraga prazeres. Melhor silenciá-los ou prendê-los. Mas, claro, em nome da “defesa da democracia”. Além disso, à diretoria é permitido, por exemplo, cancelar multas de sócios antigos e trazê-los de volta, garantindo com isso algumas mega senas da virada aos seus familiares, já que não há mais problema que estes trabalhem em causas julgadas por aqueles. Uma decisão muito inteligente da diretoria para manter tudo dentro da lei.

Tem um grupo de sócios que garantem que tudo pareça estar dentro da normalidade. São os legitimadores, formados por veículos de comunicação sedentos por verbas publicitárias, jornalistas militantes e/ou simples puxa sacos. A função deles é afirmar diariamente que tudo está perfeitamente correto. E acusar de radical, antidemocrático e coisa pior quem ousa apontar o dedo para essa suruba institucional.

Mas quem paga toda essa farra? Os mensalistas, pobres mensalistas. Eles sustentam o clube e todas as suas vantagens. Alguns até pagam alegremente a diversão dos sócios, na ilusão de que fazem parte dela. Mas não fazem. Ninguém faz. A maioria dos mensalistas sabe que está, mais do que sustentando, enriquecendo uma corja desavergonhada. Mas só pode olhar pela cerca do clube e torcer para que a farra tenha fim.

A boa notícia? A cada dia o fim se aproxima. Porque toda soberba precede a ruína. Os mensalistas, que sempre foram a maioria, estão cada vez mais despertos e conscientes de que o clube precisa acabar. Ainda que leve tempo, suas atividades serão encerradas e serão apenas uma triste lembrança de nossa história.

*       O autor, Gustavo Lopes, é escritor, documentarista e ex-Secretário Nacional do Audiovisual. @gustavochlopes