• Ubiratan Iorio
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NÓS SOMOS OS ESTUPRADOS...

A polêmica dos últimos dias é a discussão em torno da pesquisa do IPEA sobre a "questão do estupro". Neste link, com o título "Ipea reconhece erro em pesquisa sobre tolerância com estupro" e o subtítulo "Instituto errou ao dizer que 65% dos entrevistados concordam que as mulheres com roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas; correto é 26", o Jornal Nacional da Globo noticia que  a pesquisa que chocou o país há exatamente uma semana estava errada e ontem o Ipea - que, como sabemos, é um órgão subordinado diretamente à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República - reconheceu o erro, sob a alegação de que teria havido uma "troca" de gráficos, levando assim ao clamoroso equívoco.
 Mas a Folha de hoje é bem mais clara em relação ao que aconteceu de fato, mostrando que os responsáveis pela pesquisa cometeram graves erros metodológicos, que podem ser lidos neste link. Os erros, de tão crassos, podem espantar os que não conhecem como funciona a maneira "lulo-dilmo-petista" de governar, mas não me causaram nenhuma surpresa.
Na verdade, remeteram-me imediatamente ao Artigo 69,  que postei em dezembro de 2007 - portanto, ainda no segundo mandato de Lula da Silva - em meu site antigo e que reproduzo abaixo na íntegra e em negrito:
 "A "PETETIZAÇÃO" DO ESTADO BRASILEIRO
Nunca, na história “dêfte paîf”, um governo promoveu um aparelhamento do Estado das proporções do que estamos presenciando. Levas de companheiros e hordas de aliados de ocasião invadiram empresas estatais, ministérios, autarquias e outros espaços que deveriam, por definição, ser reservados a profissionais concursados. Parece que o objetivo dos caciques da tribo petista é o de transformar todos os brasileiros – principalmente, é claro, os que se filiaram ao partido da estrela vermelha desbotada (de vergonha) – em funcionários públicos.
 
Não foi à toa que o presidente declarou, na semana passada, em alto e bom som, que não se pode governar sem aumentar os gastos públicos... Alguém precisa dizer ao homem que existe um negócio chamado “gestão”...
 
Após ocupar todos os espaços que pensávamos possíveis, eis que o governo resolveu agora petetizar uma das mais respeitadas instituições, o IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada -, ao promover mudanças que vêm gerando suspeitas de expurgos nos quadros técnicos da até agora respeitada instituição.  Seu presidente, Márcio Pochmann, ex-secretário e apadrinhado da relaxante ministra do Turismo, a senhora Suplicy – foi logo declarando, quando tomou posse no órgão da avenida Pres. Antonio Carlos, que o Estado brasileiro seria “raquítico” (afirmativa absurda e denotativa de que ou é movido por ideologia, ou ruim da cabeça, ou doente do pé) -, nega com veemência a acusação, mas o fato é que, no último dia 17, afastou quatro respeitados economistas: Fabio Giambiagi e Octavio Tourinho (que retornaram à sua origem, o BNDES) e Gervásio Rezende e Regis Bonelli (aposentados e sem vínculo empregatício com o instituto, onde estavam alocados por conta da Lei 9608, de 18/2/98, que dispõe sobre serviços voluntários não remunerados). Três entidades representativas dos economistas, a Federação Nacional dos Economistas (Fenecom), o Conselho Regional de Economia de São Paulo (Corecon-SP) e a Ordem dos Economistas do Brasil (OEB), viram no episódio uma ameaça à independência do órgão que, como se sabe, era ligado ao Ministério do Planejamento até abril deste ano, quando passou para o Núcleo de Assuntos Estratégicos – o “Ministério da Bola de Cristal”, comandado pelo ininteligível “mago” Mangabeira Unger. Em nota conjunta, alertaram que "nem nos piores momentos políticos vivenciados no país, inclusive no período da ditadura, tentaram calar o IPEA”. Isto é muito grave!
 
A polêmica parece transcender diferenças teóricas e ideológicas, pois envolve também aspectos financeiros, já que os convênios do Instituto vêm transferindo, segundo os jornais, cerca de R$ 1 milhão por ano a entidades privadas sem fins lucrativos, sem contar os repasses de empresas estatais, como Petrobras e Caixa Econômica Federal, também usados para patrocínios e consultorias, em sua maioria sem licitação, dado o “notório saber” (sic) dos contratados. Isto significa, na prática, que a direção do IPEA pode escolher os pesquisadores que obterão fontes adicionais de renda.
 
 O clima entre os técnicos do IPEA está tenso, pois seria o primeiro caso de caça a bruxas da história do Instituto que, desde que foi criado por Roberto Campos, no governo Castello Branco, sempre contou em seus quadros com economistas de diversas tendências. Durante anos esteve subordinado ao ministro João Paulo dos Reis Velloso que, com equilíbrio e ecletismo, sempre respeitou as divergências existentes, prática mantida pelos governos seguintes. Mas, agora, parece que a heterodoxia econômica mascarada de “desenvolvimentismo” que, transitoriamente, comanda o IPEA, aliada à busca de cargos para apadrinhados, resolveu moldá-lo à sua feição, ação que, por si só, já ameaça pôr abaixo sua credibilidade e que, se não for rapidamente extirpada, certamente o desmoralizará rapidamente, além de expor uma inaceitável cisão dentro do governo, entre o pragmatismo do Banco Central e os devaneios estatizantes dos que se julgam “desenvolvimentistas”.
 
Serão meras coincidências? Giambiagi vinha afirmando (com toda a razão) que os crescentes gastos públicos representam um perigo para a estabilidade econômica do país; Tourinho, extremamente técnico, cuidava da respeitada revista do IPEA, mantendo-a imune a ingerências políticas e partidárias; Rezende, especialista em Economia Agrícola, desenvolvia pesquisas em que, entre outros “pecados” contra o credo petista e o dos companheiros baderneiros do MST, criticava a tese do “trabalho escravo” no campo. Além disso, foi extinto o grupo de análise conjuntural –, que também vinha alertando para a orgia orçamentária do governo Lula -, sob a alegação de que a função do IPEA é “pensar o longo prazo”. Longo prazo? Um governo – e um país – incapazes de pensar meia hora na frente?...
 
Preferiria, sinceramente, acreditar que as mudanças tenham sido meramente administrativas, mas considerando, primeiro, o inegável processo de inchaço do Estado com exércitos de petistas e aliados e, segundo, que coincidências até acontecem, mas muito dificilmente em doses múltiplas e simultâneas, deixo a conclusão – óbvia - a cargo do leitor.
 
Madonna mia, será que até o IPEA está sendo "petetizado"? Se for isso, até onde irão? O primeiro governo decente que tivermos pela frente já terá, de saída, uma tarefa gigantesca pela frente, que será a de promover uma completa despetetização da máquina pública e, no caso do IPEA, de resgatar a sua credibilidade. Haja inseticida..."
Sete anos depois, ou seja, um mandato de Lula da Silva e outro de Dilma transcorridos, só posso finalizar afirmando, com tristeza, que estava absolutamente certo. Lamento pelos muitos colegas e amigos extremamente competentes em suas especialidades e que são economistas do Instituto. O PT conseguiu desmoralizar completamente um órgão que sempre foi essencialmente técnico, independente e imune às conjunturas da política. Eles têm o dom de estragarem tudo em que põem a mão. Pobre Brasil, pobres cidadãos que vêm sendo estuprados pela violência da mentira, da incompetência, do projeto de poder, das negociatas e da ideologia senil e caquética desses que se locupletam há doze anos nos palácios de Brasília! 
 
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