O presidente do STF, ministro Dias Toffoli, proferiu decisão nesta quinta-feira (9/1), revogando a liminar do desembargador do TJ/RJ, Dr. Benedicto Abicair, que, acertadamente, havia determinado a suspensão da exibição do filme "Especial de Natal Porta dos Fundos: A Primeira Tentação de Cristo".
Na decisão, o ministro Toffoli afirmou: “Não é de se supor, contudo, que uma sátira humorística tenha o condão de abalar valores da fé cristã, cuja existência retrocede há mais de 2 (dois) mil anos, estando insculpida na crença da maioria dos cidadãos brasileiros”. Assim, o STF, embora não tolere críticas populares, validou agressões contra a comunidade cristã no Brasil. Ora, quem pode o mais (agredir), deveria poder o menos (criticar). Ubi eadem ratio, ibi eadem jus.
Pois bem, o ministro cometeu um erro monumental ao isolar o presente caso (filme do “Porta dos Fundos”) para decidir em favor da suposta liberdade de expressão, vendando os olhos da Justiça às outras centenas de perseguições contra a comunidade cristã, praticadas há décadas neste país esquecido à margem da História. Seria, portanto, necessário um exame acurado dos fatos, buscando enxergá-los num espelho temporal mais amplo para compreender toda a maléfica unidade de intenção contra o Cristianismo.
Ora, notoriamente, o "Especial de Natal Porta dos Fundos: A Primeira Tentação de Cristo” é mais uma gota num oceano de perseguições e afrontas ao sentimento religioso brasileiro, fortalecidas cada vez mais frente à vil impunidade.
O trabalho desenvolvido pelo canal “Porta dos Fundos” sempre foi medíocre e de péssima estirpe. Composto por pseudo-s humoristas e produtores, que, na ausência de maiores qualidades, preferem hostilizar, aberta e deliberadamente, o núcleo central da fé cristã, expondo-a ao escárnio, ao vilipêndio e ao desprezo público, torna-se um ato de manifesta intolerância religiosa. O resultado da sua incompetência “humorística” foi à disseminação de juízos de hostilidade, desprezo e intolerância para com os religiosos.
A elite brasileira, cansada e arrogante, costuma divertir-se às custas do aviltamento e do desprezo das crenças mais sagradas a milhões de pessoas, apenas porque delas não compartilham. Enquanto milhões de cristãos lutam diariamente para se orientar num mundo difícil e confuso, buscando ensinar a seus filhos valores que os possam edificar e enobrecer, os atores Fábio Porchat e Gregórios Duvivier contam, rindo, os milhões a mais que faturam com a exposição dos valores religiosos, agredindo profundamente, em pleno Natal, o núcleo da fé cristã e expondo os cristãos à irrisão pública, antecâmara de agressões e males ainda maiores, incluindo o extermínio físico.
Mais do que se debruçar sobre o passado, estudar a História é permitir imaginar um futuro sem cometer os mesmos erros. Antes da hedionda “solução final” nazista, os judeus foram vilipendiados em suas crenças e valores, numa Europa que aprendera a desprezá-los, o mesmo tendo ocorrido na União Soviética, com os alvos do regime bolchevique, qualificados como "insetos" antes de serem esmagados nas prisões do Gulag. Movimentos totalitários nascem, sempre e necessariamente, de minorias, que, pouco a pouco, vão manipulando a opinião pública, a cultura, os sentimentos de uma nação, até a aliciar e subordinar a seus intentos inconfessáveis.
A igreja católica que, durante o terror revolucionário foi perseguida, cujos templos foram queimados e postos abaixo, cujos sacerdotes foram decapitados, era a mãe e mestra da França, a primeira entre as nações católicas; a religião que foi proibida na Rússia bolchevique era a comum do povo russo; acrescendo que ainda agora assistimos ao incêndio e à destruição de igrejas no Chile.
Sempre, antes das ações físicas, como tudo o que é humano, vem a preparação do espírito, a predisposição da vontade, que se alcançam precisamente através do discurso público, esteja ele, ou não, travestido de arte. É que está acontecendo no Brasil há décadas!
O nível de desrespeito, agressividade e desprezo pela fé e os valores dos cristãos revelados no filme é indizível, sendo especialmente agravado pelo fato de ter sido lançado às vésperas do Natal, data sagrada para os cristãos de todo o mundo.
No caso, não apenas a ofensa e o vilipêndio a valores e símbolos que integram o cerne da fé católica e cristã são explícitos, evidentes e confessados, com promessas de breve aumento em grau, intensidade e malícia: "da próxima vez, acho que vale pegar mais pesado"; "Netflix e Porta dos Fundos confirmam Especial de Natal para 2020".
É por isso que a lei põe limites ao discurso público, proibindo o discurso de ódio. Pela mesma razão, o Supremo Tribunal Federal teve ocasião de assentar que o limite da liberdade de expressão é ultrapassado quando o intento primário, aberto, da manifestação, é o menoscabo e a depreciação da fé alheia (RHC 146.303, Relator Ministro Edson Fachin, Segunda Turma, julgado em 06/03/2018).
Ademais, a suspensão da exibição do “Especial de Natal” não constituiu censura prévia, na medida em que o conteúdo já foi ao ar. Ou seja, a retirada de circulação, posteriormente, por ser essencial à salvaguarda do sentimento religioso brasileiro, mediante cessação da conduta ilícita e abusiva do “Porta dos Fundos”, de maneira alguma caracterizou censura.
A tolerância, a liberdade religiosa e o respeito ao sagrado urgem por proteção jurídica. Aliás, a palavra sagrado vem do latim sacro, que significa separado para veneração ou adoração. É objeto de contemplação e culto, um ideal a ser perseguido e que não pode ser instrumentalizado, pois não é um meio e sim um fim, em si mesmo.
O que é sagrado para um, pode não ser sagrado para o outro, e o respeito deve, portanto, imperar. Fazer troça aos fundamentos da fé cristã, tão cara a maioria da população brasileira, às vésperas de uma das principais datas do Cristianismo é um flagrante desrespeito, o que não é tolerável, eis que viola todos os limites da liberdade de expressão.
Precisamos nos dar conta de que, no mundo, o grupo mais discriminado é o dos cristãos, sendo esta a comunidade que mais ofereceu vítimas à sanha assassina dos totalitários. Não é possível um cálculo global exato, mas, entre as revoluções francesa, russa, mexicana, espanhola, chinesa e cubana, o número de cristãos que pereceram nas mãos do regime que professou, nas palavras de Lênin, “extirpar o cristianismo da face da Terra”, não foi inferior a dezenas de milhões. E, pior, as perseguições, prisões e assassinatos continuam, em pleno século XXI, na China, Correia do Norte, Irã, Índia, Iraque, Sudão, Afeganistão, Paquistão, Líbia, Iêmen, Egito, Argélia e tutti quanti.
Se isso não for o mais vasto genocídio da história, a aritmética elementar foi revogada.
* O autor é advogado e jornalista.