Percival Puggina
Meu amigo e guru do jornalismo destemido, Políbio Braga, em vídeo de ontem, que pode (e deve) ser assistido aqui, desqualificou a decisão do juiz Eugênio Terra que sustou as principais medidas de retorno às atividades econômicas no estado gaúcho. É a receita do diabo, conforme descrita por C.S. Lewis no livro “Cartas de um diabo a seu aprendiz”.
A liminar concedida pelo magistrado atendeu a um pedido da CUT que, por essas coisas da vida, caiu nas mãos certas. Como lembrou o Políbio, o doutor, anteriormente, havia escrito artigo para jornal defendendo o lockdown.
Esses são, em essência, os fatos, e os fatos são de ontem. Vamos tratar aqui de algo mais antigo. Refiro-me ao ativismo judicial e à insegurança jurídica que dele decorre. O mau exemplo do STF, que “constitucionaliza” seu querer e se não querer, exprime uma tendência anterior a essa desastrosa composição do STF. Há muito tempo vem sendo assim em juízos singulares de todo o país e se expande aos órgãos auxiliares como o Ministério Público. Isso é muito ruim; é mais um problema institucional. Ele se agrava por que os cursos de Direito costumam conduzir os alunos nessa direção que, não por acaso, é comum ao pensamento de esquerda.
Tudo se passa como se o Judiciário fosse o poder dos mais sábios, da mais virtuosa ação de Estado e dos que melhor conhecem e frequentam o endereço do bem.
Por outro lado, não podemos esquecer que a CUT, autora da ação, é uma organização sindical que se declara “de nível máximo” na representação dos trabalhadores e tem sido o braço sindical do PT. Entre defender o emprego de seus filiados e cumprir a agenda do PT, a escolha da CUT será sempre político-partidária porque ela mesma diz de si “ter atuação fundamental na disputa da hegemonia”. E nós sabemos o que isso significou e continua a significar.
Ah, se os desempregados tivessem uma central sindical!
Quem comanda a CUT está naquela única condição necessária e suficiente para apoiar o lockdown: vida ganha, salário garantido. Situação, aliás, análoga à do juiz que concedeu a liminar, também ele em condição de absoluta estabilidade. O desemprego de milhões, a fome proclamada em cartazes de pedintes nas sinaleiras da cidade, a quebradeira de empresas, a multiplicação das placas anunciando a venda ou o aluguel dos pontos comerciais nada significam para eles. O número crescente de moradores de rua, tampouco. Aliás, logo ali adiante, estarão estes últimos a suscitar pedidos de providência urgentes do Ministério Público aos depauperados poderes locais...
Estamos assistindo ao flagrante fracionamento da sociedade, dividida entre os que precisam trabalhar para viver e uma parcela significativa daqueles que, estando com a vida ganha, lixam-se em relação à subsistência dos demais.