Percival Puggina, com conteúdo MediaTalks
Leio em MEDIATALKS
A jornalista russa Zhanna Agalakova trabalhou por mais de 20 anos na emissora estatal Channel One — a mesma em que uma editora protestou ao vivo contra a guerra na Ucrânia neste mês e foi acusada de ser espiã britânica.
A invasão da nação vizinha motivou Agalakova a pedir demissão do meio de comunicação número 1 do Kremlin, deixando o cobiçado posto de correspondente em Paris.
Com a experiência de quem viu a engrenagem da propaganda política do Kremlin por meio das mídias estatais funcionar por dentro, ela fez um relato sobre como funciona o processo e o quanto é nocivo para a população da Rússia.
“Não foi possível para mim trabalhar chamando o que está acontecendo na Ucrânia de ‘operação pacífica’”, disse ela a jornalistas de vários países na sede da organização Repórteres sem Fronteiras (RSF), em Paris, onde fez seu relato.
“É uma guerra e isso deve ser dito claramente.”
Zhanna Agalakova ingressou no Pervi Kanal (Channel One, em inglês) em outubro de 1999. Ela foi âncora de programas diurnos e noturnos, incluindo o principal telejornal de notícias da emissora, o Vremya.
No dia 14 de março, imagens da editora Marina Ovsyannikova protestando contra a guerra com um cartaz ao vivo no telejornal viralizaram nas redes sociais.
Após ser detida por algumas horas e receber uma multa, Marina foi acusada de ser espiã do Reino Unido pelo chefe da divisão de notícias da emissora estatal, Kirill Kleimyonov, e deve enfrentar um processo legal para provar sua inocência.
Assim como a editora que protestou no ar, Zhanna Agalakova estava frustrada com a cobertura da guerra na Ucrânia feita pelo Channel One.
(...)
Na sede da RSF, Agalakova relatou conhecer bem o funcionamento da propaganda do Kremlin na televisão.
Ela disse que já havia pensado em deixar o emprego várias vezes devido à forma como as notícias são manipuladas no Channel One, assim como em todos os meios de comunicação estatais na Rússia, mas que até agora “não tinha tido coragem de sair. ”
* Leia a íntegra da matéria aqui: https://mediatalks.uol.com.br/2022/03/26/jornalista-russa-que-deixou-tv-estatal-relata-como-funciona-a-maquina-de-propaganda-do-kremlin/
Comento
O relato sobre como o Estado, dirigido por uma pessoa com o perfil de Putin, que acabou com a democracia em seu país (a perenização no poder é incompatível com o regime democrático), faz lembrar as técnicas do autoritarismo em suas relações com a imprensa. Putin aprovou já durante a guerra, uma legislação penal especial para quem divulgar conteúdos divergentes dos interesses russos na guerra contra a Ucrânia. A jornalista Marina Ovsyannikova (que se atravessou na programação ao vivo com um cartaz de protesto) foi condenada a multa por um vídeo que gravou e pode ser condenada a longa pena de prisão pelo episódio que proporcionou na TV estatal.
Na leitura da matéria divulgada por MediaTalks, percebi descrito com grande aproximação, o que acontece no Brasil graças ao comportamento uníssono dos maiores grupos de comunicação. A ele se soma o tipo de controle que TSE e STF exercem sobre as redes sociais, e a pressão sobre o jornalismo independente através dessas plataformas.