DILMA NOS STATES, CLEÓPATRA EM ROMA
Percival Puggina
No verão do ano 46 dC, Cleópatra viajou a Roma por convite de César. Não sei até que ponto essa viagem e a chegada da rainha do Egito estão bem representadas no filme que leva seu nome. Especialmente na cena do encontro entre ambos, que se tornou uma das mais conhecidas da cinematografia mundial. Sem dúvida, é impossível para quem assistiu o filme, lançado em 1963 pela Twentieth Century-Fox, esquecer a refulgência que tomou conta da tela quando Elizabeth Taylor foi introduzida no Fórum Romano, antecedida por esplêndida representação da cultura egípcia, riqueza e poder. A cena de 9 minutos, com milhares de figurantes, fez subir o orçamento do filme a incríveis US$ 330 milhões, o triplo da produção mais cara até então encenada por Hollywood. E quase quebrou a Fox. Quem não viu e quiser assistir esses esplêndidos minutos, procure no YouTube por "Cleopatra enters Rome".
Pois o filme e a cena referida acima me vieram à mente ao ler sobre os luxos que cercam as viagens da presidente Dilma pelo mundo. Para que instalar-se em hotéis suntuosos com diárias extravagantes? Para que, acompanhar-se de comitivas compatíveis com as exibições de poder que caracterizavam remotas teocracias, como a egípcia? Tome-se por exemplo a recente viagem presidencial à Califórnia. Foram cinco pernoites nos 138 metros quadrados da suite Tiffany do Hotel St. Regis, e uma conta de mais de cem mil dólares. Conforme veiculado pela imprensa nacional, entre as muitas outras despesas de uma viagem cuja necessidade e utilidade não está em discussão, incluíram-se dois ônibus, um caminhão, três vans e 19 limusines (que o Itamaraty afirmou não serem limusines mas automóveis sedan) e 25 motoristas.
Não bastasse a desnecessária ostentação, contraditória com a real escassez de recursos e com a depressão instalada no país, sobreveio ao fato uma reclamação de contas não pagas! Pedalaram a conta das viaturas... Constrangimento nacional, certo? Assim como os luxos para Elizabeth Taylor quase quebraram a Twentieth Century-Fox, também a demasiada gastança do governo federal e a ruptura com os princípios da responsabilidade fiscal jogaram o Brasil na presente crise. Muda a escala, mas a causa é a mesma. Nas cenas de Cleópatra em Roma pode haver dourados que não fossem ouro. Nas contas nacionais, não.
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+.